Um modelo de autorregulação e fiscalização responsiva para as operadoras de telecom não representaria um cenário de ausência do Estado e de desregulação para o setor, defendeu nesta terça-feira, 29, a superintendente de relações com os consumidores da Anatel, Elisa Leonel.
O tema foi alvo de debate realizado no Painel Telebrasil 2020. Na ocasião, Leonel afirmou que o modelo de autorregulação (iniciado pelas teles com o Sart) está em linha com o desejo da agência de "entregar benefícios ao consumidor de forma mais rápida" e de administrar problemas sem necessariamente "editar regulamentos".
Para tal, a superintendente destacou a primeira iniciativa de autorregulação do setor, voltada para o segmento de telemarketing. "Quando a Anatel chamou o setor para conversar e tentar soluções, qualquer tentativa de regular seria mais demorada que uma solução do setor", afirmou, citando etapas como inclusão na agenda regulatória, análise de impacto, vacatio legis, entre outras.
"Não tínhamos esse tempo, e a aposta foi que isso fosse autorregulado. [Mas] se a Anatel acreditar que não está funcionando, nós continuamos tendo os instrumentos tradicionais para subir na pirâmide", destacou. Dessa forma, o novo modelo não representaria ausência do Estado ou falta de função do regulador.
No entanto, Leonel alertou que a maturação das mudanças é lenta e exige confiança nos agentes de mercado. Sócio-diretor de prática regulatória da KPMG, Philipe Moura seguiu caminho semelhante e destacou que, para o sucesso do modelo, também serão necessários indicadores e inteligência para medir o impacto contínuo das medidas.
Fiscalização
Durante o debate, também foram destacadas expectativas com o novo Regulamento de Fiscalização Regulatória que vem sendo trabalhado pela Anatel. A proposta já subiu ao Conselho Diretor da agência, e o conselheiro substituto Raphael Garcia foi designado como relator.
Diretor de assuntos regulatórios da TIM Brasil, Carlos Eduardo Franco classificou o processo como uma "grande oportunidade" rumo à regulação responsiva, mas questionou o entendimento expresso pela Procuradoria Federal Especializada da Anatel sobre a impossibilidade da agência deixar de instaurar procedimentos administrativos (Pados) diante de infrações.
Segundo Franco, a posição seria fruto de um entendimento muito "rígido" da Lei Geral de Telecomunicações (LGT). De acordo com o executivo e ao contrário do que defendeu a PFE, o art. 173 da legislação abriria sim espaço para uma resposta "mais ampla" que não envolva necessariamente a abertura de um processo administrativo. "Dá para resolver de maneira responsiva, com diálogo ao invés do Pado".
Piloto
Diretora regulatória da Claro, Monique Barros também manifestou expectativa com a adoção de um modelo de regulação responsiva. Ela destacou que a própria operadora foi objetivo de um piloto no modelo conduzido ao lado da Anatel, e que teve foco na oferta de serviços de valor adicionado (SVA).
Segundo Barros, a intervenção por meio do diálogo com a área comercial e operacional da empresa reduziu de maneira relevante os problemas da Claro com a oferta dos serviços, até então bastante reclamados junto à agência. No momento, a operadora seria a empresa com menor nível de reclamação em SVAs entre as concorrentes de mercado.
Privacidade
Especialista do XVV Advogados, Ivo Correa ainda citou uma área onde o modelo de autorregulação poderia ser bem utilizado pelas teles: a privacidade. Segundo ele, em um cenário no qual a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) está vigente sem a criação de uma autoridade com competência sobre o tema, a judicialização da pauta será inevitável.
"Então discutir autorregulação pode ser bem interessante: como é possível se adiantar e estabelecer boas práticas", argumentou Correa. Por conta do trabalho já iniciado pelas teles, o setor estaria em vantagem na comparação com outros segmentos da economia, de acordo com a advogado.