A Anatel está iniciando um planejamento para uso de espectro no Brasil nos próximos dez anos após definições tomadas na Conferência Mundial de Radiocomunicações (WRC) de 2023. Uma tomada de subsídios em formatação pela agência deve abordar não apenas o uso do 6 GHz, mas também de outras frequências disponíveis.
As informações foram compartilhadas durante balanço da WRC 2023 feito pelo superintendente de outorga e recursos à prestação da Anatel, Vinicius Caram, e pelo chefe da delegação técnica do Brasil na WRC 23, Rodrigo Gebrim, durante nova edição do Teletime Live.
A dupla fez avaliação positiva da participação do Brasil no evento global sobre os rumos do uso de espectro, organizado pela União Internacional de Telecomunicações (UIT). O entendimento é que a delegação obteve sucesso em todas as agendas em que se propôs a atuar.
Entre os temas em destaque esteve o futuro da faixa de 6 GHz, objeto de uma nota de rodapé articulada pelo Brasil e que prevê a divisão do espectro entre serviços móveis (como 5G) e não licenciados (como WiFi). Antes da confirmação mudança no País (que tem toda a faixa destinada para uso não licenciado), a demanda de mercado e disponibilidade de ecossistema nesta e em outras faixas deve ser verificada.
"Vamos fazer uma tomada de subsídio sobre o espectro de 6 GHz e todo o espectro disponível. Queremos estudos para os próximos dez anos, onde possamos verificar e reorganizar o uso adequado. Temos a faixa de 400, 700, 800 e 900 MHz, o 1.800, 1.900, 2.100 MHz e o 2.500 MHz com muitas sobras, o 3,5 GHz em ampliação, as sobras do 26 GHz…", listou Caram, citando ainda o 1,5 GHz.
"Há um leque de opções e queremos saber o que o mercado acha que é importante usar", prosseguiu ele, notando que o Brasil também conseguiu "cravar definitivamente o 4,8 GHz e o 10,5 GHz" durante a WRC 23.
6 GHz
No caso do 6 GHz, Rodrigo Gebrim reforçou que a postura do Brasil na WRC 23 não representou uma mudança de posição do País – que tem hoje toda a faixa destinada para uso não licenciado -, mas sim uma "porta aberta" para que mudanças na destinação possam ser feitas no futuro, a partir da realização de novos estudos, sem correr o risco de colocar o Brasil em desalinhamento com o que está previsto pela UIT para a ocupação da faixa na região. Foi o mesmo caminho adotado pelo México, explicam.
A motivação para tal foi o fato de vários países adotarem a divisão do 6 GHz entre serviços móveis e não licenciados – abrindo espaço para ganhos de escala em equipamentos da faixa (algo considerado essencial para países em desenvolvimento). O Brasil chegou a defender na WRC 23 que a abordagem fosse adotada por toda a Região 2 (das Américas) como estudo ou item de pauta para a próxima conferência em 2027, mas enfrentou a oposição dos Estados Unidos, favorável ao WiFi na faixa.
A saída foi a nota de rodapé, apoiada por México, e em linha com o que fizeram países da Europa, África e Ásia (segundo a GSMA, nações com 60% da população global pretendem a divisão do 6 GHz). O início dos estudos não implica uma mudança imediata da destinação vigente no Brasil, onde todo o 1,2 GHz segue destinado para uso não licenciado – mas com demanda que ainda não atende a expectativa da Anatel.
Entretanto, Caram aponta que diversas medidas precisam ser tomadas no caso da alteração ser oficializada no País: inclusão na agenda regulatória, análise de impacto regulatório, consulta pública, pareceres jurídicos, aprovação pelo Conselho Diretor e edição de novos atos de radiação restrita, entre outros passos. O primeiro deles será justamente a tomada de subsídios sobre o espectro disponível no Brasil.
Outra identificação a partir de nota de rodapé na WRC 23 foi a do 10,5 GHz, que teve adoção para serviços móveis em 12 países das Américas após grande oposição de países da América do Norte (já que nações da Otan usam a faixa em iniciativas militares). Assim, as condições aprovadas para a faixa foram mais restritas, prevendo implementação via micro cells para complementação do sinal 5G. Como não houve harmonização regional completa na faixa, a Anatel estima de cinco a oito anos para o uso da faixa ganhar escala.
6G
Para o futuro, outras faixas também já estão sendo vislumbradas, inclusive para futuras redes 6G. Rodrigo Gebrim relata que as novas faixas estudadas para serviços móveis na região das Américas são o 7,125-8,5 GHz (o que inclui a banda X) e o 14,1-15,35 GHz. Nos dois casos, a convivência com serviços satelitais é considerada prioridade.
Já no caso do 4,4-4,8 GHz (a chamada banda C planejada), não há previsão da região das Américas identificar a faixa para redes móveis, dado o uso massivo pelo setor satelital. O mesmo vale para o 3,8-4,2 GHz no Brasil, apesar de neste existir destinação regional para o serviço móvel.
Satélites
A proteção dos serviços de satélites também foi considerada uma das tônicas da WRC 23, segundo Rodrigo Gebrim. O chefe da delegação técnica brasileira destacou a manutenção de proteção para sistemas geoestacionários (GEO).
A revisão das medidas era defendida pelos Estados Unidos tendo em vista novos sistemas não geoestacionários, como as constelações de baixa órbita. O tema deve seguir em estudos, mas segundo Gebrim uma revisão das regras só poderá ocorrer dentro de duas edições da WRC, realizada a cada quatro anos (o que deixaria a pauta para 2031).
Já na edição de 2023 foram aprovadas novas regras para estações satelitais em movimento (as chamadas ESIMs) na faixa de 12,75-13,25 GHz; a modernização de links intersatélite em 17,3-17,7 GHz; e novas regras para as HIBS, ou High Altitude Base Stations.
Outros temas que devem ser discutidos nos próximos ciclos são a sustentabilidade no espaço, com a elaboração de novas diretrizes e boas práticas para constelações de baixa órbita após defesa da abordagem pelo Brasil; e a possibilidade de espectro para conexões direct-to-device (D2D).