Quando a Anatel trouxe para consulta pública as novas regras do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC) e do Regulamento Geral de Uso do Espectro (RUE) no final de 2023, estava claro que a agência pretendia provocar uma virada radical no ambiente normativo, a fim de provocar no mercado móvel um efeito competitivo parecido com o que aconteceu na banda larga fixa a partir de 2012, quando foram trazidas regras de regulação assimétrica para o mercado.
Entre as medidas trazidas pela Anatel estavam a introdução dos Mercado de Operadores Virtuais (MVNOs) e o de Exploração Industrial de Radiofrequências (EIR), além da proibição da prática de RAN Sharing entre as operadoras nacionais nas cidades até 100 mil habitantes nas faixas de 3,5 GHz e 2,3 GHz.
Mas, ao que tudo indica, a tarefa da agência será muito mais árdua agora, a julgar pela reação das três grandes operadoras móveis: Vivo, Claro e TIM.
O maior desafio da agência será o fato de que muitas das inovações regulatórias propostas confrontam situações que foram consolidadas a partir dos leilões de espectro, que foram disputados de maneira aberta e cujas regras constituem contratos praticamente inalteráveis. Além disso, a julgar pelos comentários das empresas, a Anatel está indo contra práticas e procedimentos de mercado que foram adotados por anos com o aval e autorização da agência. O tom dos comentários das empresas deixa claro que a Anatel avançou sobre pontos que as operadoras móveis consideram intransponíveis, o que obviamente sinaliza o cenário de um enfrentamento judicial caso a Anatel siga na toada pretendida.
Os comentários das três operadoras dissecaram a Análise de Impacto Regulatório (AIR) apresentada pela Anatel como fundamentação do PGMC e, a partir dos dados da própria AIR contestam de maneira veemente as mudanças propostas. Ou seja, usam contra as propostas da Anatel dados da própria AIR.
De certa forma, o tom das operadoras já havia aparecido no Seminário Políticas de (Tele)Comunicações organizado pela TELETIME em fevereiro, quando a Conexis passou a colocar, entre os primeiros itens de preocupação de sua agenda institucional, a preocupação com o respeito aos contratos. Também naquela ocasião, as operadoras questionaram a tese de que o mercado móvel estivesse demasiadamente concentrado e que, por isso, precisasse de mais remédios concorrenciais e assimetrias para estimular novos entrantes. A consulta pública do PGMC deixa isso ainda mais claro: as três operadoras nacionais não estão dispostas a aceitar uma mudança de regras de maneira passiva.