Para o ministro da Economia, Paulo Guedes, um suposto ambiente de "suspeição geopolítica" à China agravado pela pandemia do novo coronavírus (covid-19) deve afetar a cadeia de fornecimento do 5G, trazendo impactos sobre a estratégia e a competição no Brasil. O diagnóstico opinativo foi realizado em entrevista à CNN Brasil concedida pelo ministro de Jair Bolsonaro neste final de semana.
"Em um momento que precisamos dar salto quantitativo e qualitativo em tecnologia, seria interessante deixar a competição funcionar: a Ericsson de um lado, a Huawei do outro, chinês brigando com americano, com nórdicos, para ver quem nos serve melhor. [Mas] nessa hora que devíamos dar esse mergulho, vem essa 'nuvem de suspeita' e cria problema geopolítico em algo que era estritamente econômico", afirmou Guedes.
Para o ministro, tais suspeitas teriam como fator importante a pandemia do coronavírus, que eclodiu primeiro na China. "Quando tem essa pandemia, o que está acontecendo no Ocidente? Na Inglaterra, tudo bem 5G [de fornecedor chinês] na 'franja' [redes de acesso]; já o que é core e segurança, não mais. Porque da mesma forma que tem problema de segurança quando escapa vírus de uma fronteira específica, sei lá se amanhã tem problema geopolítico qualquer. É inegável que o Ocidente está refletindo um pouco sobre algo que do ponto de vista prático comercial a gente sempre ignora".
Questionamentos
É importante ressaltar que ainda não se sabe a origem do novo coronavírus, apesar de uma epidemia ter eclodido, de fato, na China inicialmente. A (livre) associação de Guedes à cadeia de fornecimento de equipamentos de telecomunicações de 5G, contudo, baseia-se em uma suposta "crise de confiança" internacional que não tem ligação prática à crise sanitária global, da qual os Estados Unidos são, junto ao Brasil, um dos expoentes de contaminação.
Segundo Guedes, a suposta suspeição vem em um momento ruim, pois o 5G deve "ser a fronteira da nova revolução digital e precisamos estar atuais". Ainda assim, ela estaria crescendo em boa parte da Europa e nos EUA, ainda segundo o ministro da Economia. Ele diz que o momento levanta questionamentos sobre se a China seria capaz de, por razões geopolíticas, "desligar os botões" e interromper serviços de comunicações e de segurança. A Huawei nega haver backdoors ou qualquer tipo de ingerência às redes que utilizam equipamentos chineses, até porque as redes (incluindo as de 3G e 4G já implantadas) são totalmente geridas pelas operadoras de telecomunicações.
Na ocasião, Guedes não mencionou que o boicote às chinesas empreendido pelos EUA tem sido uma bandeira do atual governo norte-americano desde muito antes da pandemia, mas pontuou que "no ponto de vista da geopolítica, nós estamos do lado de cá, com Trump". De sua parte, a Huawei diz que a motivação do governo norte-americano tem motivações comerciais, e não de segurança. Vale notar que a decisão (citada por Guedes) do Reino Unido apenas limitar, e não banir, a participação da Huawei no 5G está sendo revista após intensa pressão do governo dos EUA.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro e a Casa Civil já deram sinalizações de um possível alinhamento com os norte-americanos no tema, despertando preocupação entre algumas das principais operadoras do País. O leilão de frequências que devem suportar o 5G (do qual participam operadoras, e não fornecedoras de equipamentos como a Huawei) está previsto para 2021, como confirmado nesta última segunda-feira pelo Ministro das Comunicações, Fábio Faria. Na ocasião, Faria pontuou que Bolsonaro está sendo assessorado para tomar uma decisão sobre o assunto. (Contribuiu Bruno do Amaral)