Concessionárias põem em dúvida legalidade da mudança no ônus da concessão

A sessão pública realizada nesta quarta-feira, 24, pela Anatel para deliberar sobre a revisão dos contratos de concessão das empresas de telefonia fixa contou com declarações, no mínimo, surpreendentes por parte das teles no período de manifestações da platéia. O diretor de Regulamentação da Oi, Paulo Matos, elegeu como um dos alvos de crítica a cláusula 3.3, justamente aquela que traz o maior benefício às teles dentre todas as alterações contratuais. Esta cláusula trata do "ônus da concessão", espécie de taxa paga a cada dois anos pelas concessionárias para manter suas licenças de operação no país.
A Anatel propõe duas alterações neste item. A primeira atende uma demanda pública das concessionárias, ao permitir que compromissos de universalização e outros condicionamentos impostos pela Anatel às empresas sejam abatidos do recolhimento dos 2% bienais. Obviamente, não é este o alvo das críticas de Matos, mas sim a segunda alteração.
A outra mudança consiste no esclarecimento de que as receitas operacionais geradas a partir da interconexão e outros serviços acessórios classificados como PUC (Prestação, Utilidade e Comodidade) também entrem na base de cálculo do ônus da concessão. Com a declaração explícita de que essas receitas entram na conta, somadas às obtidas pela prestação dos serviços públicos, a Anatel alinha o método de cálculo do ônus ao já utilizado como parâmetro para o recolhimento de encargos setoriais, como o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust).

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Mas, para as teles, essa alteração pode ser considerada uma "ampliação" da base de cálculos, gerando mais ônus para a concessionária. "Defendemos a não criação de ônus adicionais sobre um serviço que, como já exposto, vem enfrentando um quadro de grande adversidade, com perdas de usuários e receitas", declarou o engenheiro Antônio Torrecillas, representante do SindiTelebrasil, ao comentar a mudança proposta pelo relator do processo, João Rezende. Este cerne da crítica consta no parágrafo 4º da cláusula 3.3, embora o argumento jurídico usado pelas teles para declarar inválida a alteração comprometa toda a reforma da cláusula.
O alerta apareceu na apresentação do executivo da Oi. Paulo Matos argumentou que a mudança é inválida não só porque aumenta o custo das empresas sem necessidade, mas porque o momento de revisão dos contratos não permite alterações em cláusulas econômicas. "A cada cinco anos há revisão quinquenal, que não se confunde com a renovação contratual. Entendemos que não se pode mudar cláusula econômica em revisões contratuais", afirmou Matos criticando a reforma do parágrafo que trata da base de cálculo do ônus.
Se a Anatel entender que a interpretação de Matos está correta, a ponderação do executivo também poderá afetar a proposta de desconto das metas no processo de pagamento da taxa, prevista no parágrafo 1º da 3.3. Afinal, ambas as mudanças estão na mesma cláusula, considerada "econômica" pela Oi e, portanto, impossível de ser alterada em um processo de revisão. A estranheza está no fato de que Oi e SindiTelebrasil foram quem mais defenderam um recolhimento flexível dos 2% devidos a cada dois anos, permitindo que esses recursos sejam revertidos para o custeio de obrigações de universalização. A demanda faz parte do processo de negociação para encontrar fontes de financiamento do novo Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU III), tratado costumeiramente como um dos anexos do contrato de concessão.
Enigma
Ao argumentar contra a validade da alteração da cláusula 3.3, o diretor da Oi fez uma ponderação bastante enigmática considerando que, há pouco tempo, as empresas apoiavam claramente o uso da taxa como uma das fontes de financiamento do PGMU III. Paulo Matos disse que "os acionistas tinham uma expectativa de pagamento do ônus até 2025". Em outras palavras, o executivo indica que o conjunto de acionistas da Oi sequer conta com esses recursos, que estão projetados como um custo inerente da concessão. Resta saber se, com esta declaração, a Oi também indica que não está tão disposta a lutar pela compensação de custos do PGMU III na conta do ônus.
É evidente que qualquer desoneração é bem vinda nas empresas. Mas fontes da Anatel avaliam que o estranho posicionamento explicitado hoje na sessão pública indica que as concessionárias não acreditam que essa alternativa poderá, de fato, ser utilizada. O assunto é complicado e envolve outras áreas da União, em especial o Tesouro Nacional, que é quem arrecada na prática o ônus da concessão de todas as empresas que prestam serviços públicos no Brasil. E o Tesouro não estaria nada feliz com a iniciativa da agência.
Um dos conselheiros admitiu, no final da sessão, que o comando da Anatel concordou em fazer uma pequena mas relevante mudança no parágrafo 1º da cláusula na tentativa de minimizar a tensão com o Ministério da Fazenda. "O Tesouro ligou reclamando e por isso nós mudamos", afirmou. A alteração consiste em vincular a vigência do parágrafo à edição de um decreto presidencial definindo os critérios de compensação. Não se sabe, no entanto, se este decreto será o mesmo que oficializará o novo PGMU III.

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