A Winity optou por exercer o direito de renúncia do espectro dos 700 MHz. A manifestação foi apresentada à Anatel no final da tarde desta sexta, 22.
Segundo Sergio Bekeierman, CEO da operadora de infraestrutura, a razão que levou à desistência foi um descompasso entre as necessidades de investimento para o tamanho do projeto desenhado pela empresa, a necessidade de um cliente âncora que viabilizasse o projeto (que seria a Vivo) e as condições que foram colocadas pela Anatel para a conclusão do acordo com a tele.
"Sempre deixamos claro que tínhamos um modelo de operador móvel de atacado, em que o investimento na infraestrutura precisava ser viabilizado. O modelo de atacado pressupõe o compromisso de 625 localidades e 35 mil km, e as imposições inviabilizaram essa premissa. Esse é o fato concreto. A decisão de exercer o nosso direito de renúncia decorre do fato de não conseguirmos exercer a nossa visão de longo prazo. Respeitamos a decisão da Anatel, [mas] não estamos nos insurgindo. Estamos exercendo o nosso direito".
Em fato relevante também nesta sexta, a Vivo anunciou ao mercado e acionistas que o conjunto de contratos celebrado com a Winity em agosto de 2022 foi terminado.
Futuro
Bekeierman não antevê nenhuma dificuldade de relacionamento com a agência, já que existe a opção de renúncia unilateral e que isso não é novo na história da Anatel. "Já houve renúncias anteriores, sem consequências para o futuro das empresas que renunciaram, e acreditamos que será assim", diz ele, ressaltando que a Winity não pensa em entrar na Justiça contra a decisão da Anatel. Ele diz que no momento seguinte à renúncia se abrirá uma conversa entre as duas partes (Anatel e Winity) sobre as garantias que possam vir a ser executadas, mas está confiante no diálogo. "Esse é um passo posterior".
Sobre os remédios impostos pela Anatel para a anuência prévia do acordo com a Vivo, ele diz que a empresa tentou seguir as determinações, mas ressalta que no chamamento público não houve ofertas vinculantes – ou seja, nenhuma empresa entrante se manifestou de maneira firme, ainda que tenha havido empresas habilitadas no processo de comunicação entre as partes. "Infelizmente, não houve interessados", diz. Já o outro remédio aplicado pela Anatel, que Bekeierman considera como inviabilizador do acordo com a Vivo (e com qualquer outro grande proponente ao uso da rede) foi a limitação de RAN Sharing nas cidades com menos de 100 mil habitantes na faixa de 3,5 GHz e 2,3 GHz.
Winity segue ativa
Sergio Bekeierman, CEO da Winity, diz que apesar da renúncia à faixa de 700 MHz, a empresa segue ativa e disputando o mercado de infraestrutura, e vai explorar outros modelos de negócio. Ele destaca, por exemplo, a oferta de rede 5G e WiFi nas linhas 1, 2 e 3 do Metrô de São Paulo pelos próximos 30 anos, licitação recém vencida pela empresa.
"Reafirmamos o nosso compromisso de continuar investindo no setor, somos parceiros de infraestrutura e queremos desenvolver milhares de sites nos próximos anos. Temos relacionamento com toda a indústria e nosso viés de infraestrutura continua de forma bastante forte", diz.
Segundo ele, a empresa continua capitalizada, com o apetite e disponibilidade para investir. "A gente prevê demanda de infraestrutura bastante grande, com as obrigações do leilão e necessidades de investimentos do 5G no Brasil. Vemos como positivo o cenário de demanda para novas parcerias", diz.
A Winity não diz se pretende ou não participar de futuros leilões de espectro ou operar com espectro em caráter secundário. Tudo depende das parcerias, diz. "Nossa visão é que o espectro é um dos elementos de infraestrutura que compõem a rede, e a nossa participação em futuros leilões depende de compromissos e nossa capacidade de contratar infraestrutura. Nós não somos aqui uma empresa de apenas um produto. Fazemos soluções de infraestrutura que dependem muito dos projetos dos clientes. Então tudo está aberto a negócios e somos muito agnósticos em relação".
Em relação ao acordo com a Vivo, Bekeierman prefere não comentar. "Não tenho delegação para falar pela Vivo, mas temos um relacionamento com a Telefônica e é um cliente importante, e pretendemos continuar desenvolvendo projetos. A decisão da renúncia (ao espectro) é nossa, não da Vivo", diz.
Ele diz que já houve investimentos importantes em infraestrutura para atender as obrigações que deveriam ser entregues esse ano e a Winity pretende aproveitar esses investimentos atendendo, por exemplo, rodovias, desde que com parcerias viáveis. "A gente é um player de infraestrutura, mas o modelo de uma operadora móvel de atacado continua fazendo sentido e achamos que pode ser viabilizado. A única razão por entregar a frequência hoje não é pelo modelo, mas pela inviabilidade dos compromissos e investimentos".
Sobre as parcerias com futuros operadores de 5G regionais, que foram os grandes opositores ao acordo entre Winity e Telefônica, o CEO da empresa diz que acredita na possibilidade de projetos conjuntos, mas isso passa muito mais pelo desenvolvimento do mercado do que da vontade da Winity. "Precisa ter demanda para ter oferta, e não sei dizer se existe demanda. Mas queremos atuar com toda a indústria", diz Bekeierman .
Histórico
A novela (e as incertezas) sobre os planos da Winity começaram há pouco mais de um ano, quando a empresa anunciou um acordo até então de exploração industrial de radiofrequências com a Vivo. Pelo plano, a Winity compartilharia infraestrutura com a Vivo em 3,5 mil cidades, e em 1,1 mil cidades a Vivo teria o direito de uso de metade do espectro da Winity, além de um acordo de roaming e cobertura de estradas. Na época, o acordo foi defendido pela Winity como forma de assegurar um grande cliente âncora para sua infraestrutura de rede neutra móvel, também inédita no país.
Em entrevista a este noticiário na ocasião, Bekeierman posicionou a Winity como uma operadora entrante que, se bem sucedida, teria condição de viabilizar infraestrutura a outros players, além de projetar investimentos robustos em rede para atender às suas obrigações: uma cobertura em quase 35 mil km de estradas não cobertas (a um custo estimado de R$ 3 bilhões) e outros 20 mil km de rodovias em que já existem redes, além de poder capturar a demanda de novos sites que se abriu com as obrigações das outras faixas. Ao todo, a empresa projetou cerca de 5 mil sites e investimentos de R$ 12 bilhões. O acordo com a Vivo asseguraria economia de escala ao projeto, recursos para os investimentos e também para cobrir as operações que viabilizariam a cobertura nas demais cidades não contempladas no acordo.
A operação foi aprovada sem restrições pelo Cade, mas teve forte oposição dos outros PPPs, com movimentações intensas da Telcomp, Brisanet e da Associação NEO junto ao processo, com alegações que iam dos potenciais impactos concorrenciais até alegações de fraude licitatória, considerando que o edital de 5G impedia, em uma primeira rodada, que as operadoras com Poder de Mercado Significativo (entre elas a Vivo) acessassem a faixa de 700 MHz.
Ao final, depois de uma análise de 12 meses, a agência deliberou por permitir o acordo, mas com condicionantes que foram consideradas, tanto pela Winity quanto pela própria Vivo, como inviabilizadoras da parceria. Entre elas, a exigência de um chamamento público para que os pequenos prestadores pudessem exercer algo como um direito de preferência na contratação da rede da Winity e a proibição de que a Vivo entrasse nas cidades com menos de 100 mil habitantes com acordos de RAN Sharing na faixa de 3,5 GHz.
Esta semana, a Winity ainda teve negado o seu pedido de ateste ao cumprimento da obrigação de realizar o chamamento: a Anatel considerou que ele não seguiu as exigências necessárias. Foi o último movimento, mas nos bastidores sabe-se que o grande problema foi na própria viabilização do acordo entre Vivo e Winity com as condicionantes colocadas. A Vivo entendeu que o acordo não era viável com a restrição de RAN Sharing colocada pela Anatel.
Incertezas
Entre os pontos que ficam abertos agora estão não apenas as garantias que a Anatel vai executar, mas também o futuro da própria faixa de 700 MHz. Em relação às garantias, especialistas ouvidos por este noticiário consideram mais ou menos pacífico que os compromissos vencidos podem ter as garantias executadas. O problema é que a renúncia se dá uma semana antes do prazo final para a execução dos compromissos, cujo deadline era 31 de dezembro.
Também há uma dúvida sobre os compromissos futuros, já que eles entraram como parte do preço do leilão. E, obviamente, a maior dúvida passa a ser sobre a faixa de 10 MHz + 10 MHz que a Winity vai devolver na faixa de 700 MHz. Há quem entenda que será possível à Anatel chamar o segundo colocado no leilão (nesse caso, a Highline) e há quem diga que não. Essas dúvidas estão dentro da própria agência. Também há quem interprete que a Anatel deva relicitar essa faixa, ou ainda deixar ela livre para uso secundário.