NetMundial reitera: monitoramento e neutralidade não serão o foco

Com a divulgação do documento final com o resumo das 188 propostas que pautaram o NetMundial nos dias 23 e 24 de abril em São Paulo, o Comitê Gestor de Internet do Brasil (CGI.br) reiterou a validade da redação com um conceito: colaboração multissetorial, inclusive no processo de elaboração do próprio documento base. Isso se tornou um mantra nesta terça-feira, 15, para justificar ausências de temas espinhosos como neutralidade de rede ou da falta de especificação na abordagem do monitoramento.

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"O documento foi construído pelo Comitê Executivo, que tem representantes de todos os setores, e se baseou nas 188 contribuições. Neutralidade de rede não foi um tópico considerado", afirmou o secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Virgílio Almeida, que também é presidente da secretaria executiva do NetMundial. Nada impede que o tema seja colocado em debate no evento, mas a diretiva parece ser deixar esse debate para níveis regionais. "Não significa que o tema não possa ser incluído, mas isso (a neutralidade) tem uma característica muito local, cada um vai ter isso. O Brasil tem no Marco Civil", diz.

Ele não confirmou se a retirada do tema, que estava presente no rascunho entregue ao Comitê Executivo de Alto Nível (HLEC, presidido pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo), aconteceu após as críticas da vice-presidente da Comissão Europeia, Neelie Kröes, que é membro do HLEC. "Houve modificações para dar concretude a algumas propostas, mas estamos falando em um documento que seja abrangente a documentos globais. Não é possível achar que vamos sair (do evento) com regras definidas."

A falta de uma visão mais contundente sobre monitoramento e espionagem, na visão do secretário Almeida, seria porque o documento aborda o assunto também quando fala em proteção à privacidade e aos direitos humanos. "Se verificar, em princípios de governança você vê a questão de transparência, modelo multistakeholder e, no roadmap, tem a questão específica do monitoramento", defende. Ele menciona ainda o trecho do item 2, parágrafo 35, que fala que "monitoramento massivo e arbitrário diminui a confiança na Internet e no ecossistema de governança de Internet".

Almeida reconhece, entretanto, que a ideia não é se ater a esse debate. Ao ser questionado sobre a possibilidade de o governo norte-americano tentar evitar discutir o confronto às práticas de vigilância e escutas eletrônicas, ele diz que a segurança é "um dos aspectos" da governança de Internet e lembra que foi um dos temas que motivou a criação do evento (após discurso da presidenta Dilma Rousseff na ONU). Mas ele lembrou também que o governo dos EUA participou da elaboração do documento final (como um dos participantes do Comitê de Alto Nível). "Surveillance (monitoramento) estará em um dos tópicos (a serem discutidos), mas não é o foco", declarou.

Tensão

Virgílio Almeida não acredita que falar em monitoramento vá causar algum tipo de atrito entre os participantes do evento, mas ele admite que poderá haver alguma tensão em outros temas, como a participação da administração pública na governança de Internet. "Isso pode se manifestar em discussões relativas ao papel de governos no modelo multissetorial, com alguns pleiteando que governos tenham uma participação específica, especial, um papel de destaque", declara.

Essa participação maior, diz o secretário, seria em funções como segurança cibernética, "embora a participação multissetorial seja desejada por vários grupos, mas segurança tem caráter mais específico de governo". Ele cita ainda impostos e taxação da Internet como questões na qual governos têm "papel específico e legítimo". "Essa reunião pretende mostrar que há um conjunto de entidades envolvidas na Internet como ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers) e IETF (Internet Engineering Task Force, comunidade internacional com técnicos, agências, fabricantes e fornecedores) e países com regras locais, mas precisamos criar um modelo, um ecossistema que seja capaz de tratar questões não apenas técnicas, mas políticas e sociais."

Evento

O documento final, diz Almeida, "pode e vai ser mudado nos dois dias de evento", incluindo a possibilidade de se especificar mais alguns dos temas. Mas ele não acredita que haverá mudanças drásticas no conteúdo, contando apenas com alguns ajustes para que se transforme na carta de princípios ao fim do evento. "O documento final não deverá ser muito diferente. Ele reflete várias discussões", declara. As ideias retiradas dos debates da próxima semana serão  reunidas em outro relatório final. "Será um sumário dos principais pontos e propostas para a evolução e que vai ser usado como elemento de subsídio em outras reuniões", diz. Ele compara a discussão com a "evolução" ocasionada com o debate da questão ambiental depois do evento Rio 92.

O NetMundial, que é encarado como uma reunião de nível ministerial, terá abertura com a presidenta Dilma Rousseff e contará com a participação de cerca de 750 pessoas de 85 países. Em paralelo ao evento, o governo brasileiro organiza o Arena Mundial no Centro Cultural em São Paulo, evento de participação popular no qual serão realizadas discussões sobre "qual Internet que as pessoas querem ver no futuro". Esse debate terá presença de representantes da sociedade civil como o ex-ministro da Cultura Gilberto Gil, e de figuras políticas como o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva.

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