Cada vez mais importante em um cenário de pressão no retorno sobre investimentos e risco de comoditização, a estratégia de diversificação de serviços e receitas entre operadoras de telecom está avançando – mas também precisa mirar os ativos e segmentos certos sob o risco de repetição de erros do passado, alerta a Oliver Wyman.
As alternativas para crescimento para além da conectividade foram tema de estudo recente realizado pela consultoria e discutido com a TELETIME. Sócio de comunicação, mídia e tecnologia da Oliver Wyman e um dos autores do material, Felipe Hildebrand destacou atributos como base de clientes, dados, presença nos domicílios, marca, engajamento e capacidade de faturamento como trunfos para as operadoras.
O cálculo para ingresso em uma nova vertical, contudo, não seria simples. "Muitas operadoras já têm esse movimento de explorar outros serviços para além da conectividade pura, mas quando você olha o passado, não dá para dizer que há um caminho claro. Muitas fizeram operações que não foram de sucesso. É preciso pensar onde efetivamente elas conseguem ganhar", apontou Hildebrand.
A favor do setor estaria a percepção, identificada pela Oliver Wyman, de que consumidores tendem a confiar nas teles como agregadoras de serviços. Segundo a consultoria, 23% dos clientes veem operadoras como player ideal para exercer tal função, em patamar maior que o conquistado por big techs (19%) ou pelos bancos (9%).
O cenário de agregação de serviços é familiar para as operadoras brasileiras, que têm apostado cada vez mais em parcerias com serviços de streaming de vídeo, música, games, saúde, educação e finanças (além de produtos mais próximos do core business, como IoT e segurança). Contribuem para a estratégia a grande capacidade de cobrança das operadoras e possibilidades de engajamento com as bases de usuários, entre outros atributos como valor de marca.
O cenário é particularmente animador para o trio de prestadoras móveis – visto que cada uma teria acesso a quase um terço do mercado consumidor brasileiro -, mas também é válido para empresas de Internet fixa. "Hoje dois terços da banda larga está com ISPs monoproduto", notou Hildebrand, da Oliver Wyman. Assim, a distribuição de outros serviços seria tanto uma oportunidade para eventuais novas receitas como uma estratégia de diferenciação comercial, servindo como parte da fortaleza contra a evasão de clientes (churn).
Energia e dados
Uma das próximas fronteiras vislumbradas pela consultoria envolve o mercado de distribuição de energia. "Esse é um mercado que está abrindo, em um movimento que já chegou aos grandes consumidores e que deve chegar nos próximos anos ao varejo. Nesse momento, telecom tem uma joia por já ter a fatura e estar dentro da casa do cliente", aponta Hildebrand.
Outra vertente destacada é a monetização de bases de dados, que também já começou a ser explorada pelas teles. Neste caso, haveria possibilidade de negócios em áreas como publicidade georreferenciada, fornecimento para serviços de score de crédito, mapas de calor e demais alternativas dentro das possibilidades da legislação de proteção de dados.
"Algumas teles [internacionais] já se colocam como data lockers, ou armazenadoras de dados", adicionou o especialista. Quando o assunto é qual player é o mais adequado para proteger dados pessoais, os bancos lideram, mas consumidores também confiam mais nas operadoras do que nas big techs, indica pesquisa da Oliver Wyman.
Cenário
Já um desafio para a diversificação de serviços seria manter uma abordagem disciplinada. Como alertas estariam experiências malfadadas da indústria no passado, como a torrente de serviços de valor adicionado (SVAs) proprietários depois descontinuados e mesmo investimentos bilionários de gigantes internacionais na aquisição de empresas de conteúdo e direitos esportivos. Por outro lado, uma série de experiências bem-sucedidas nos ramos de energia, serviços financeiros, entre outros, têm surgido nos últimos anos.
Por trás da necessidade das teles por diversificação de receitas está um cenário de grandes ondas de investimentos exigidos na implementação do 4G, do 5G e na atualização de redes fixas. A Oliver Wyman aponta que se antes o capex das operadoras era focado sobretudo em cobertura, hoje a necessidade constante de ampliação de capacidade é um fator contínuo de pressão.
Ao mesmo tempo, o crescimento das receitas não estaria avançando no mesmo ritmo, comprometendo o retorno dos investimentos. O retorno sobre o capital empregado (ROCE) das 50 maiores companhias de telecom de capital aberto do mundo reduziu de 15,3% para 10,8% nos últimos sete anos, calcula a consultoria, enquanto a participação do setor no PIB global passou de 2,6% para 1,8% entre 2012 e 2021.
No Brasil, o gap seria maior que o global tanto em níveis de retorno sobre o capital empregado quanto no avanço das receitas versus a inflação nos últimos dez anos, indicou Felipe Hildebrand. Entre as razões estão a pressão exercida por plataformas OTTs, a queda na remuneração dos serviços de voz e, no caso brasileiro, também a ameaça competitiva dos ISPs na banda larga. Por outro lado, os resultados recentes das companhias de capital aberto estariam indicando sinais positivos para as finanças das teles, inclusive como reflexo da consolidação no mercado móvel.