Decreto de transição tem sérios problemas, dizem especialistas

De acordo com diversas pessoas ouvidas por este noticiário no decorrer desta quarta, 28, o principal problema do decreto de transição para a TV digital é o fato de misturar no mesmo instrumento jurídico assuntos que seriam melhor tratados por resoluções da Anatel ou do Ministério das Comunicações. Por exemplo, a própria definição tecnológica pelo ISDB-T como padrão base para o SBTVD, as definições relativas aos prazos para implantação do sistema brasileiro (que ficariam melhor em uma regulamentação do Ministério das Comunicações) e a criação de canais a serem explorados diretamente pela União, o que deveria fazer parte de um outro instrumento jurídico.
As consultas aos especialistas foram feitas com base em minutas de versões preliminares do decreto, que poderão ser alteradas até a assinatura definitiva, nesta quinta, 29.

Pode consignar, mas tem que cobrar

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Para um consultor de serviços de radiodifusão, a consignação de canais de radiofreqüência em caráter provisório para que seja feita a transição, como está no decreto de transição, não é um problema. De certa forma, isso está previsto no artigo 23 do Regulamento dos Serviços de Radiodifusão, que estabelece as regras para o caso de necessidade de alteração nas consignações de radiofreqüências para operação do serviço.
Esse mesmo consultor, porém, considera que o problema é o pagamento pelo uso, mesmo que provisório, desse novo canal: a Lei Geral de Telecomunicações é explícita em exigir o pagamento pelo uso de radiofreqüências nos artigos 163 a 169. O consultor relembra que as novas geradoras criadas a partir das recentes licitações de outorgas de radiodifusão têm pago à Anatel pelo uso das radiofreqüências. Mas aí existe uma inconsistência: se a União cobra pela freqüência outorgada aos concessionários de TV, o mesmo não acontece em relação às radiofreqüências utilizadas pelas retransmissoras.

Conceito de regularidade

A minuta do decreto de transição estabelece que os canais digitais somente serão consignados a empresas que estiverem com a outorga em situação regular. O que significa esta regularidade? Trata-se apenas da regularidade jurídica ou inclui também a regularidade técnica? No primeiro caso há pouquíssimas geradoras e retransmissoras com suas situações jurídicas regulares: há centenas de outorgas com prazo vencido, com encaminhamento de pedido de renovação intempestivo, em processo de renovação de outorga, com pedido de transferência ainda não aceito, entre outras.
Sob o ponto de vista da regularidade técnica, há uma imensa lista delas, desde transmissão em freqüência ou potência alterada, passando pela localização do estúdio comunicada mas ainda não aprovada, entre dezenas de outras: ?Arrisco a dizer que não há quem não tenha uma 'irregularidadezinha' qualquer, o que pode transformar a concessão do canal consignado em uma atitude altamente discricionária por parte do Minicom".
Ou seja, segundo especialistas no setor de radiodifusão, é nulo o controle do governo sobre a regularidade ou não das outorgas existentes. Se apenas as regulares terão direito ao canal de transição, abre-se espaço para uma guerra entre as próprias empresas, entre empresas e o Ministério Público e sociedade civil e com o próprio governo para ver quem está e quem não está regular.

Interatividade não é radiodifusão

Um dos artigos da minuta do decreto estabelece a possibilidade de interatividade como característica do SBTVD-T. Há quem considere, contudo, que sem definir o que seja interatividade, isso possa caracterizar algo além do serviço de radiodifusão, que é a transmissão ponto-multiponto de forma livre e gratuita. A interatividade como se conhece é a característica dos serviços de telecomunicações numa configuração ponto-a-ponto, e não necessariamente de forma gratuita. A inclusão da interatividade no decreto de TV digital criaria a necessidade de uma outorga, por exemplo, de Serviço de Comunicação Multimídia, o SCM, por parte das TVs. Além disso, a possibilidade da interatividade deveria indicar o canal de retorno a ser utilizado, o que poderá exigir a presença das operadoras de telecomunicações e televisão por assinatura no possível Fórum do SBTVD previsto no decreto.
Aliás, um dos pontos considerados pouco consistentes no decreto é a criação do Fórum, que poderia ser deixado por conta dos interessados.

As competências da Anatel

Na visão de um outro consultor de serviços de radiodifusão ouvido por este noticiário, o decreto confunde as competências da Anatel com as competências do Ministério das Comunicações ao determinar que o cronograma para as consignações de canais seja elaborado pelo Minicom. De acordo com a LGT, apesar de não ser responsável pelas outorgas de radiodifusão, a Anatel é responsável pela administração do espectro radioelétrico e pela destinações dos canais de radiodifusão. Caberia, então, a ela a elaboração de cronogramas e regras de ocupação do espectro.

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