Fusões entre operações relevantes de provedores regionais, a segregação de infraestrutura e clientes de ISPs e a busca por um crescimento sustentável de receitas – e não apenas de assinantes – são algumas das principais tendências no atual estágio de consolidação da banda larga brasileira, avaliam especialistas.
O diagnóstico é de participantes de encontro realizado em São Paulo nesta quarta-feira, 20, pelo escritório de advocacia Cescon Barrieu. Na ocasião, aspectos macroeconômicos e setoriais foram apontados como habilitadores de novas operações envolvendo empresas de fibra óptica no restante do ano e sobretudo em 2024.
Entre as possibilidades na mesa estão novas fusões de regionais. O arranjo – inaugurado pela combinação entre Vero e Americanet – tem motivado conversas entre outros ISPs relevantes, garantem agentes. Já as redes ópticas apartadas dos clientes – algo que empresas como a Desktop avaliam – têm atraído interesse de investidores internacionais, nota a sócia do Cescon Barrieu, Thays Gentil.
Os dois formatos de certa forma refletem o cenário de menor liquidez e mais restritivo para M&As do primeiro semestre de 2023, quando comparado com períodos recordes de negociações nos dois anos anteriores. Por outro lado, também há otimismo com a redução de incertezas macroeconômicas, o que deve ativar novos negócios em diferentes modelos.
Sócio do Cescon Barrieu, Darkson Galvão citou o ciclo de redução da taxa de juros e a reabertura do mercado de dívida após instabilidades do começo do ano como elementos positivos da agenda. Mesmo com a reativação de alternativas de financiamento (incluindo também equity e follow-ons), a avaliação é que negócios envolvendo provedores se tornem mais estratégicos do que "oportunísticos".
Neste sentido, o sócio fundador da Metis Advisors, Rafael Beran Bruno, coloca como necessária a busca por um "crescimento vertical" baseado em novas receitas, além do puro salto de acessos. Para a consultoria de M&As, ainda que o mercado de banda larga siga crescendo (ao contrário da cadeia de telecom, que estaria "andando de lado"), a receita média por usuário não acompanha a demanda por tráfego, exigindo a agregação de novos serviços como streaming, WiFi 6 e ofertas B2B.
Cenário e desafios
De forma geral, a Metis projeta um crescimento de 6,5% para a cadeia de banda larga brasileira em 2023. A consultoria também lista 59 empresas de Internet com mais de 40 mil acessos no mercado atualmente, e que poderiam ser atores ativos no jogo da consolidação (ainda que a subnotificação de assinantes possa ampliar esse universo).
Em termos de valuation, a boutique aponta negociações de ISPs no Brasil utilizando múltiplos menores do que os do mercado nos Estados Unidos (praticamente um terço), mas próximos aos das grandes operadoras nacionais. O número que tem permeado conversas é de valuation a cinco vezes o Ebitda das operações. Muitos vendedores, por sua vez, têm se mostrado resistentes a aceitar preços menores que os praticados nas fases anteriores da consolidação do mercado.
Os modelos mais recentes de M&A perseguidos também guardam desafios. No caso das fusões, o sócio fundador da Metis Advisors, Luis Enrique Devis, aponta a abordagem como ainda mais complexa do que as aquisições tradicionais, sobretudo pela questão política que pode surgir na integração das administrações.
Já a segregação de infraestruturas tem como obstáculo a necessidade de regularização de redes, algo considerado um dos maiores desafios para ISPs que buscam compradores. O cenário de uso de postes no Brasil, por exemplo, é fator que assusta sobremaneira investidores de fora, aponta Thays Gentil. POPs de provedores são outro elemento que tem exigido regularização.
Operações bem-vindas
Ainda assim, o Brasil segue como mercado atraente para investimentos em empresas de banda larga, seja pelo caráter extremamente pulverizado do mercado, pela penetração relativamente baixa da conectividade em relação a países desenvolvidos ou pela vantagem sobre outros emergentes. A abordagem de reguladores setorial e antitruste com a consolidação do segmento também tem sido encorajadora.
A Anatel, por exemplo, não tem fixado condicionantes de grande impacto para negócios envolvendo ISPs, nota Thays Gentil a partir dos últimos atos de anuência avaliados pela reguladora. Já no Cade, muitos dos movimentos recentes nem chegaram a ensejar ritos ordinários, recebendo aprovação sumária do órgão, observa o sócio do Cescon Barrieu, Ricardo Gaillard. O alinhamento regulatório buscado entre os dois órgãos seria outro bom indicativo, afirma ele.