Leilão da Telemig Celular obriga Citi a se posicionar

Tudo indica que a decisão do Opportunity de colocar as operadoras de telefonia móvel Telemig Celular e Amazônia Celular à venda em leilão aberto, anunciada na última sexta, dia 4, é mais um episódio inflamável da conturbada relação entre o grupo de Daniel Dantas e seus sócios. A novidade é que desta vez o Citibank é colocado, pela primeira vez desde o início dos conflitos societários pós-privatização, em uma posição em que precisará escolher entre não fazer nada, como sempre fez (e assim ajudar o Opportunity em sua estratégia), ou ficar ao lado de fundos de pensão e Telecom Italia, com quem já vem negociando há alguns meses e, ao que tudo indica, já havia chegado a um acordo de entendimento.
O anúncio da venda da Telemig Celular e da Amazônia Celular veio a público na última sexta, dia 4, em fato relevante cheio de polêmicas e pontos ainda pouco claros. Pontos que vão desde a convocatória para um leilão aberto para o qual não há data nem previsão de uma seqüência de eventos, até erros na forma de denominar as empresas envolvidas. Tudo é confuso e nebuloso nesta última ação do Opportunity.
O primeiro problema evidente do fato relevante foi o horário e as circunstâncias de sua publicação. Pela expressiva valorização das ações de controle (ONs) das duas empresas (resultando em uma valorização no dia 4 de mais de 16% só no caso da empresa mineira), é possível que tenha havido algum tipo de vazamento de informação.

Notícias relacionadas
Além disso, sabe-se que os fundos de pensão (acionistas das duas teles celulares) não foram avisados pelo Opportunity de que seria publicado o fato relevante convocando para o leilão aberto das ações da Futuretel (controladora da Newtel). Por outro lado, o próprio Opportunity, como administrador das companhias, avisou a si mesmo sobre a intenção de venda, já que a acionista Highlake International Business (controlada em 95% pelo Opportunity Fund) aparece no informe ao mercado como vendedora. A Futuretel é controladora do Opportunity Mem, que por sua vez tem 53,06% da Newtel, que tem 51,07% da Telpart, holding controladora da Telemig Celular Participações. Já a Highlake International Business tem 48,9% da Telpart.

Pode vender?

A venda da Futuretel, por si só, também é algo polêmico. Isso porque o Opportunity tem apenas 6,53% da Futuretel, por meio de um pequeno fundo chamado TELE FIA. Outros 46,38% das ações estão nas mãos do fundo Investidores Institucionais FIA, que se chamava CVC Opportunity Equity Partners FIA enquanto tinha o Opportunity como gestor mas passou a ter novo nome em outubro de 2003, quando os fundos de pensão destituíram Dantas da administração de seus recursos. O restante das ações (47,06%) está na mão do CVC Opportunity Equity Partners LP (CVC Internacional), fundo com recursos do Citibank que por enquanto ainda é gerido pelo grupo de Daniel Dantas. Acontece que Dantas está para ser destituído da gestão do CVC Internacional, cujo contrato de administração encerra-se no meio do ano e não será renovado. Esse processo já está acordado com os fundos de pensão brasileiros, uma vez que as condições de desinvestimento do CVC Internacional e do Investidores Institucionais deverão ser as mesmas. Não se tem notícia se o Citi foi ou não informado sobre a decisão do Opportunity de vender as ações da Futuretel nas teles celulares. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, o Citi não sabia. E essa é a leitura também de fontes próximas ao banco norte-americano nas recentes negociações envolvendo suas participações, e também é o que se subentende do fato de o CVC Opportunity Equity Partners LP não assinar o fato relevante e ser "convidado" a participar do leilão de vendas.
O fato é que o CVC Internacional, segundo fontes bem informadas, não poderia vender seus ativos sem antes comunicar o fato à justiça de Cayman, onde há liminares e ações judiciais que amarram a movimentação dos ativos. Também é fato que se o Citi aceitar a decisão do Opportunity de vender seus ativos em leilão aberto, pode comprometer seriamente suas relações com a Telecom Italia, com quem negocia sua saída da Brasil Telecom.

Highlake sobrevalorizada

Outro elemento estranho decorrente da decisão do Opportunity de vender as teles celulares é o fato de a Highlake International Business ser parte do bloco vendedor, ao que tudo indica recebendo o mesmo prêmio de controle que a Futuretel receberá. Como se sabe, a estrutura acionária da Telemig Celular e da Amazônia Celular foi montada pelo próprio Opportunity para que a Newtel fosse a controladora com poderes quase absolutos. Na época, esta blindagem foi montada para impedir que a TIW (ex-sócia) e os fundos de pensão tivessem voz ativa na empresa. Mas o Opportunity comprou, em março de 2003, a participação da TIW na Telpart, por meio da empresa Highlake, controlada pelo Opportunity Fund, pagando US$ 70 milhões. A Newtel deixou, então, de ser necessária. Tanto é que o próprio Opportunity tem tentado, junto à Anatel, tirar o poder da Newtel, alegando que a presença dos fundos de pensão nesta empresa resultaria em uma sobreposição irregular de licenças com a Oi (Telemar).
Em resumo, a Highlake não teria porque vender suas ações na Telpart nas mesmas condições (inclusive de preço e prêmio de controle) da Futuretel, pois não tem o mesmo poder de controle na companhia, que ainda é da Newtel. E esse cenário fica ainda mais dramático para o Opportunity se o Citibank destituí-lo do CVC Opportunity Equity Partners LP, como se cogita. Nesse caso, a Futuretel (e portanto a Newtel) serão quase integralmente controladas pelo Citi e pelos fundos de pensão. A Highlake (Opportunity) ficaria, ironicamente, na mesma sinuca que por vários anos ficaram a TIW e os fundos de pensão: uma participação relevante na Telemig e na Amazônia Celular que ninguém quer comprar porque não dá poder de mando na companhia.
Para complicar ainda mais a situação, ainda não está claro se a Highlake poderia, neste momento, vender sua participação na Telemig Celular e na Amazônia Celular. Isso porque o acordo de venda das ações da TIW para a Highlake prevê a possibilidade de recompra destas ações caso as autoridades brasileiras não aprovem a operação. Esse acordo foi ratificado pela Anatel mas o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) ainda não aprovou a venda. O processo ainda corre sob a relatoria do conselheiro Roberto Pfeiffer, apesar de ter parecer favorável da agência de telecomunicações. Portanto, se a Highlake vender suas ações na Telpart agora, em leilão aberto, a TIW perde um direito estabelecido em contrato aprovado pela Anatel.
E a lista de problemas com o fato relevante não pára por aí. Estranhamente o Opportunity resolveu chamar o fundo Investidores Institucionais FIA, onde estão os investimentos dos fundos de pensão, pelo nome de CVC Opportunity Equity Partners FIA (CVC Nacional), ou seja, seu nome antigo, antes da destituição, em outubro de 2003. Isso é feito pelo fato relevante ao convidar outras empresas acionistas da Telemig Celular e da Amazônia Celular a participarem como vendedoras do leilão aberto. Diz o fato relevante: "serão convidados a participar do processo, na qualidade de ofertantes-vendedores, entre outros, (…) CVC/Opportunity Equity Partners Fundo de Investimento em Ações, CVC/Opportunity Equity Partners L.P., Opportunity Fund, Tele Fundo de Investimento em Ações e demais pessoas naturais detentoras de ações das
diversas companhias integrantes da cadeia societária (…)".
O "erro" no nome é um fato no mínimo curioso, pois o próprio Opportunity providenciou a renomeação do fundo em diversas instâncias. Por exemplo, em todos os registros existentes na CVM de empresas onde estava o CVC Opportunity Equity Partners FIA na cadeia societária hoje aparece o nome Investidores Institucionais FIA. Inclusive no registro da Futuretel S/A e no registro geral da CVM e da Receita Federal. O único lugar onde a troca de nomes não foi feita é nos registros da própria Telemig Celular Participações e da Tele Norte Celular Participações (Amazônia Celular). Ou seja, foi proposital o Opportunity ter, em fato relevante, trocado o nome do veículo por onde investem os fundos de pensão, mas ainda não está clara a intenção do aparente equívoco.

Combustível para conflitos

Somando-se a esta longa lista de problemas e pontos obscuros na intenção do fato relevante em si, ainda há uma relação de problemas decorrentes da estratégia de venda da Telemig Celular e da Amazônia Celular na forma como está sendo proposta, de um leilão aberto. A Vivo, por exemplo, negociou por muito tempo a compra da operação mineira, mas o Opportunity sempre resistiu em fechar o negócio, segundo fontes próximas às negociações. Isso ficou evidente quando o grupo de Daniel Dantas autorizou a Telemig Celular e a Amazônia Celular a migrarem a tecnologia para o GSM, o que em tese tiraria o interesse da Vivo (cuja opção ainda é o CDMA). A Claro também teria interesse teórico na Telemig e na Amazônia Celular, pois são áreas onde ainda não tem cobertura. Em Minas Gerais, a Claro já tem licença, mas ainda prepara a sua rede. Porém a melhor opção para o Opportunity seria, ao que tudo indica, que a Brasil Telecom comprasse as duas teles celulares, por duas razões: fazendo isso, o Opportunity teria condições de determinar o preço que pagará a si mesmo nas suas ações da Highlake e do fundo TELE FIA. E fazendo isso, aumenta imensamente o imbróglio já criado para a volta da Telecom Italia ao controle da BrT, fortalecendo-se no processo, que precisa se encerrar até julho, por ordem da Anatel. Caso adquira a Telemig e a Amazônia Celular, a Brasil Telecom Celular passaria a mais de 4,5 milhões de usuários, contra menos de 1 milhão atuais. Ou seja, ficaria muito mais complicado para os italianos, caso consigam voltar ao controle, resolver o problema concorrencial decorrente da sobreposição de licenças com a TIM.
Por outro lado, para a Brasil Telecom comprar a Telemig Celular e a Amazônia Celular terá que ficar claro que os investimentos dos fundos de pensão na BrT e na Telemar (Oi) também não configuram sobreposição de licenças, tese defendida hoje pelo próprio Opportunity.
Mas o fato mais sério, na hipótese de o Opportunity conseguir fazer com que a Brasil Telecom torne-se compradora das duas operadoras móveis que estão à venda, é o conflito que se cria entre Citibank, fundos de pensão e Telecom Italia. Sabe-se que os três já estão com um acordo praticamente definido de venda das participações do Citi e dos fundos na tele fixa, inclusive em relação ao preço. O Citi já teria dito à Telecom Italia que tem instrumentos para impedir que a Brasil Telecom compre Telemig Celular. A lógica, no papel, é simples: o Citibank tira o poder do Opportunity destituindo-o da gestão do CVC Internacional; dá sinal verde para que a Telecom Italia volte ao bloco de controle; e a Telecom Italia compra, por sua vez, as ações do Citi e dos fundos. Se sua volta para a BrT for inviabilizada com a compra da Telemig Celular e Amazônia Celular, a Telecom Italia provavelmente não iria adiante com a estratégia e o Citibank e os fundos de pensão teriam que negociar mais e por mais tempo até achar um comprador para a BrT. Ou a Brasil Telecom ficaria indefinidamente sendo gerida pelo Opportunity.
Vale lembrar que o Opportunity já tem uma amarra fortíssima à BrT, por meio da sua participação nas empresas que controlam a Timepart, uma companhia que detém, silenciosamente, 62% das ONs da Solpart, holding que controla a Brasil Telecom Participações.
Mas os fundos de pensão e a Telecom Italia, como acionistas da BrT, não teriam que aprovar a participação da empresa no leilão da Telemig e da Amazônia Celular? Atualmente, tanto fundos quanto italianos estão sem poder de voto e veto na Brasil Telecom. E como o Opportunity tem conflito de interesses (por ser comprador e vendedor) a decisão dveria ser tomada pela administração da companhia, ou seja, pela presidente Carla Cico. Em tese, a diretoria é neutra, decidindo pelo melhor interesse da companhia. Mas vale lembrar que Carla Cico está diretamente envolvida no caso de espionagem da Kroll contra a Telecom Italia. Investigação que, aliás, segundo fontes confiáveis, está praticamente concluída, já definiu alguns indiciados apesar das dificuldades encontradas por conta de uma liminar do Opportunity na Justiça de São Paulo, que impede a análise dos dados dos computadores apreendidos na sede do banco e na casa de Daniel Dantas, no Rio de Janeiro.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!