A Anatel rechaçou os argumentos da Claro, TIM e Vivo e decidiu manter as condições para oferta de referência de produto de atacado (ORPA) de roaming como remédio para a autorização da venda da Oi Móvel. A decisão unânime do Conselho Diretor da agência na reunião desta quinta-feira, 4, considerou especialmente que o estabelecimento da metodologia para o cálculo do preço de referência não é uma medida regulatória para o mercado em geral, mas algo específico levando em consideração o contexto pós-concentração do setor e mesmo o lançamento do 5G.
As empresa conseguiram na Justiça Federal cautelar suspendendo os efeitos da decisão do regulador, mas no processo da Claro e da Vivo, a liminar condicionava o pedido de reconsideração por parte da Anatel. Como isso foi julgado na reunião do Conselho, perde então a eficácia da suspensão, segundo o conselheiro relator da matéria, Artur Coimbra, em conversa com jornalistas. "Em conclusão, a liminar perde o objeto, não se fala mais em suspensão."
No caso da TIM, o teor era "um pouco diferente" porque o pedido de suspensão não condicionava a decisão ao pedido de reconsideração. "O juiz iria reavaliar se fosse o caso de manter ou revogar a suspensão", afirma. Desta forma, de acordo com Coimbra, a TIM ainda precisa de uma nova manifestação da Justiça Federal para que a suspensão seja retirada ou confirmada.
De todo modo, a nova proposta de ORPA encaminhada pela TIM na semana passada, trazendo inclusive valores ainda acima dos determinados pela Anatel, não será acolhida. "Já houve prazo no mês passado", reitera o conselheiro, citando as propostas das teles que já haviam sido rechaçadas e substituídas pela determinação do Acórdão nº 213 da agência. "Algumas operadoras apresentaram ofertas nesse ínterim, pouco antes da reunião. Mas não têm valor como ofertas, porque o prazo foi superado. Foram consideradas como elementos recursivos", explicou.
A matéria ganhou apenas uma alteração: a adição de um esclarecimento sobre o marco temporal para reiterar que a ORPA tem caráter transitório e será submetida a reavaliação em 18 meses e/ou até o novo Plano Geral de Metas de Competição (PGMC). Isso se refere a um questionamento das operadoras de que poderia haver utilização da oferta como roaming permanente.
Argumentações
No processo, Claro, TIM e Vivo pediam a reconsideração do Acórdão nº 213 e o Ato nº 8.822, ambos de 23 de junho deste ano, inclusive requisitando a total nulidade da decisão do Conselho Diretor da época. As empresas falavam em vícios formais ou de mérito, e destacavam que a metodologia adotada pela agência, a bottom-up, não estava condizente com o que vinha sendo praticado no âmbito do PGMC.
Em manifestação oral, a advogada Elenor Cotait, representando a TIM, chegou a dizer que a exigência da oferta nos moldes do remédio não remuneraria o custo, sendo "desencorajador para uma estratégia de capital intensivo", reclamando ainda da impossibilidade de acesso aos autos para estudar a metodologia adotada. Criticou ainda o argumento de alinhamento às recomendações da OCDE ao ressaltar que o Brasil não faz parte do grupo.
Rebate
Artur Coimbra trouxe vários fundamentos da análise do conselheiro Moisés Moreira, relator do processo originário do Ato e Acórdão, inclusive para sustentar que o processo não era um litígio e, portanto, não havia obrigação de disponibilização de acesso a documentos preparatórios que subsidiaram a decisão. Também colocou que "não cabe ao regulado" a prerrogativa de deliberar nova interpretação da Lei diferente da agência. "Uma vez que inexistem novos fatos que se apliquem à Anatel, não se pode requerer revisão do processo de anuência da venda da Oi Móvel e dos remédios", reiterou.
Coimbra justificou que o modelo top-down seria incongruente com o remédio para a operação, uma vez que estaria baseado em um cenário de 2019, ainda com quatro grandes operadoras com poder de mercado significativo e sem a tecnologia 5G. A adoção da metodologia bottom-up viria justamente com a intenção de considerar a nova realidade, incluindo os ganhos com sinergia que as próprias teles vislumbravam na justificativa para a aquisição da Oi Móvel e que restaram comprovados nos balanços financeiros recentemente divulgados, conforme análise do conselheiro. E também baseado em previsões com avanço do 5G.
Ele destacou que as condições de obrigação de roaming nacional conforme o PGMC já existem de fato. Ou seja, não faria sentido a imposição de remédios se essa modelagem anterior bastasse. O condicionante era justamente de buscar com a nova ORPA a possibilidade de novos entrantes, de forma temporária, conseguissem iniciar o modelo de investimentos para eventualmente prestar serviços sem a necessidade desses acordos. Especialmente porque, conforme determinado no ajuste da agência, as ofertas serão sujeitas a reavaliação em 18 meses e durante a revisão do PGMC, período no qual as prestadoras regionais estariam se estabelecendo, na avaliação de Coimbra.
O conselheiro lembra também que o modelo bottom-up já foi adotado antes pela Anatel, citando a Resolução nº 639/2014, a norma de fixação de custos para serviços de telecomunicações. Portanto, nega ser uma "inovação", como argumentaram as teles.
Pesquisa
A título de ilustração, Artur Coimbra disse ter feito uma revisão comparada entre os valores de ofertas de serviços móveis e os valores de referência definidos à luz dos remédios propostos nos termos do acórdão e no ato recorridos. O conselheiro avaliou 86 planos de serviços disponíveis no sistema de comparativo de preços mantidos pela Anatel para o mês de março de 2022.
Desta amostra, Coimbra selecionou os planos que apresentavam ofertas de menor custo unitário por Gigabyte correspondentes aos serviços de maior volume e valor agregado oferecido pelas empresas. O relator assumiu como premissa o valor por GBs nessas circunstâncias seria o que mais se aproxima do custo marginal. "O resultado da avaliação identificou que todas as reguladas possuem ofertas de serviços com valores abaixo do custo proposto pela Anatel", observou. (Colaborou Isabel Butcher, do Mobile Time)