Princípio de neutralidade busca evitar abusos concorrenciais, diz ex-conselheiro do Cade

A garantia da neutralidade de rede é a condição necessária para que práticas discriminatórias de acesso não sejam adotadas pelas teles no campo da Internet, assim como aconteceu em outras áreas. A constatação é do ex-conselheiro do Cade, Olavo Chinaglia, que participou de seminário promovido pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e pela FGV sobre o Marco Civil da Internet em Brasília.

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Conforme entendimento do Cade à época, ficou provado que as concessionárias de telecomunicações praticavam preços maiores para as concorrentes do que os preços cobrados das empresas do grupo no acesso à rede local – mercado conhecido como Exploração Industrial de Linha Dedicada (EILD). As provas foram colhidas das informações que as concessionárias forneciam para participar de licitações, em que era exigido que elas informassem os seus custos.

Chinaglia menciona também um caso, mais antigo, de suspeita de práticas de condições não-isonômicas, mas que dessa vez o Cade não se convenceu de que havia provas suficientes para a condenação. Trata-se da interconexão da Embratel com as concessionárias locais para que a empresa pudesse originar e entregar chamadas de longa distância. A suspeita era de que as concessionárias locais dificultassem a vida da Embratel, já que também ofereciam serviços de longa distância.

Outro caso, esse ainda não julgado, em que pode ser constatada a existência de preços discriminatórios, é na interconexão móvel, a VU-M. Segundo Chinaglia, sem citar os envolvidos, já há um parecer da Secretaria de Direito Econômico (SDE) pela condenação. Para o ex-conselheiro do Cade, "a discussão da questão de neutralidade pode ser comparada de forma plena com esses casos", já que há a possibilidade da empresa se beneficiar indevidamente da sua posição dominante em mercados verticalmente integrados.

Olavo Chinaglia pondera, entretanto, que a neutralidade não garante que as donas das redes se abstenham de adotar esse tipo de prática. "A consagração da neutralidade é condição necessária, mas não suficiente. Será necessário um 'enforcement' das autoridades, mas sem esse princípio não há o que se exigir", diz ele.

Além da questão concorrencial e econômica, a neutralidade da rede é importante para que a inovação tenha condições de prosperar. Para o advogado Carlos Afonso, professor da FGV-Rio, sem a neutralidade a Internet será mais ou menos como a TV por assinatura, em que são oferecidos pacotes de conteúdos, cada um com um preço. "Será que a gente quer a Internet fracionada em pacotes de conteúdo tal qual a TV por assinatura?", pergunta ele. "Esse tipo de modelo de negócio parece restringir, você perde a diversidade da Internet", completa.

Afonso também mencionou casos de países não-democráticos como a China, os Emirados Árabes e a Arábia Saudita, que filtram resultados de buscas. Na China, quando se busca pelas imagens da Praça da Paz Celestial, por exemplo, não aparece a foto clássica do estudante que se postou na frente dos tanques do Exército chinês.

Outros países avançam na garantia da neutralidade, como a Holanda, que proibiu a prática do Deep Packet Inspection, usado pelas provedoras de conteúdo para identificar preferências do usuário e, assim, direcionar publicidade. No Chile, a lei proíbe o "bloqueio arbitrário" de pacotes, mas o uso da palavra "arbitrário", segundo ele, abre uma brecha para que bloqueios sejam realizados com uma justificativa qualquer.

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