Um balde de água fria. O discurso de Tom Wheeler, presidente da FCC, durante a Cable 2014, evento organizado pela associação dos operadores de TV a cabo dos EUA (NCTA) que acontece esta semana em Los Angeles, foi mais duro, mais enfático e mais preocupante do que esperavam as operadoras, que imaginavam ter em Wheeler um aliado na regulamentação da Internet. O presidente da FCC foi, no passado, presidente da própria NCTA, da CTIA (associação que representa as operadoras móveis dos EUA) e foi empresário e investidor de empresas de Internet. Mas mesmo com toda essa biografia, ao que tudo indica, seu discurso não vai pender para o lado das teles.
O presidente da FCC foi categórico: o órgão regulador dos EUA vai estabelecer regras que tenham como premissa básica a garantia de uma Internet aberta, sem distinção entre serviços, sem diferenças entre "os que têm e os que não têm". Wheeler foi claro ao dizer que não serão admitidos modelos em que o tráfego privilegiado de uns prejudique o tráfego dos demais, e que a FCC quer, antes de tudo, competição. Wheeler chegou até mesmo a classificar os operadores de TV a cabo dos EUA, pela sua posição dominante no mercado de Internet, de incumbents, o que certamente desagradou à plateia.
"Se vocês lerem as matérias que saíram na imprensa sobre o que vamos propor, aqueles que se opõem à neutralidade de rede podem celebrar. Mas relatos de que vamos sacrificar a Internet aberta estão incorretos. Estou aqui para dizer para vocês: 'tirem os chapéus de festa', porque as regras de Open Internet serão duras, deverão ser cumpridas e estarão em vigor rapidamente", disse Wheeler.
"O foco da nossa proposta é em manter uma Internet rápida, robusta e massificada como uma plataforma para a inovação, para a expressão de opiniões e para os investimentos em infraestrutura. Nosso objetivo são regras que estimulem os provedores de banda larga a continuamente melhorarem seus serviços para todos", declarou o presidente da FCC. Ele foi ainda mais específico: "Deixem-me ser claro: se alguém agir para dividir a Internet entre os que têm e os que não têm, nós usaremos todos os recursos à nossa disposição para impedir isso. Eu considero que isso inclui o Title 2 (parte do Telecommunications Act que permitiria à FCC regular a Internet como um serviço de telecomunicações essencial). Tenho convicção de que se seguirmos as orientações da Justiça vamos conseguir a proteção que queremos, mas isso não significa que eu hesitarei em usar o Title 2 se necessário", disse Wheeler. A grande preocupação dos operadores de telecomunicações é justamente que a FCC acione esse dispositivo, o que implicaria uma série de obrigações e compromissos muito mais rigorosos em relação à Internet, similares a outros serviços públicos, como telefonia fixa, transporte e energia.
Wheeler explicou com um exemplo o que as novas regras da FCC devem propor: "Vamos usar a metáfora das autoestradas: priorizar uma parte do tráfego forçando o restante a uma faixa congestionada não será permitido em nenhuma regra de Open Internet. Não permitiremos às empresas forçarem os usuários de Internet a tomarem uma faixa mais lenta, de modo que outros, com privilégios especiais, tenham um serviço superior".
Para o presidente da FCC, as operadoras de TV a cabo dos EUA "têm pouquíssima regulação em seu negócio principal, que se tornou e continuará a ser, broadband. Mas conforme discutimos as regras de Open Internet, isso não coloca a indústria em uma zona sem obrigações e supervisão", disse ele, deixando claro que haverá atuação regulatória da agência sobre o mercado.
"A AT&T anunciou planos de expandir seus serviços de 1 Gbps para mais de 100 cidades. Vejo isso como um desafio ao mercado de cabo similar à chegada do DTH. Espero que vocês respondam de maneira similar ao que fizeram lá atrás. Vocês estão onde estão porque tiveram que melhorar suas redes para enfrentar a competição que vinha dos céus. Espero que respondam de maneira competitiva novamente", refletiu Wheeler. A íntegra do discurso está disponível no dite da FCC.