Está evidente que a compra do controle da Telecom Italia pela Telefónica e por bancos italianos, realizada nesta final de semana, tem uma grande importância para a estratégia da tele espanhola no Brasil. Segundo interlocutor muito familiarizado com a operação, ela foi feita para evitar a "concentração do mercado". Entenda-se, evitar a expansão do grupo Telmex/América Móvil.
Segundo duas fontes familiarizadas com o acordo, há uma cláusula pela qual a Telecom Italia está proibida de vender a TIM Brasil até que toda a operação esteja finalizada. Se isso acontecer, a Telefónica está fora do negócio. A cláusula é até mais ampla, e impede que a Telecom Italia ou suas subsidiárias sejam vendidas para outros operadores industriais sem a aprovação da tele espanhola.
O temor da Telefónica era que a Telmex/America Móvil adquirisse a Telecom Italia e ampliasse seus domínios na América Latina, especificamente no Brasil, onde poderia fundir Claro e TIM. "Hoje a Telefónica já tem uma situação complicada no Brasil porque sua operação móvel não está em sete Estados e porque há um outro acionista com 50% da joint venture. Se a Claro e a TIM se unissem, a situação passaria de complicada a impossível", diz uma fonte qualificada.
Mas isso significa que a Telefónica vai, desde já, ter ingerência sobre a TIM e a Vivo no Brasil? Segundo Miguel Ángel Garzón, diretor de comunicação internacional e financeira da Telefónica de España, a tele espanhola se absterá de votar em decisões de conselho que envolvam a estratégia da Telecom Italia nos mercados em que a Telefónica seja concorrente da tele italiana. Segundo ele, a operação ainda passa por um longo processo de aprovação junto às autoridades italianas e européias, o que deve fazer com que os eventuais impactos para o Brasil estejam distantes. Por esta razão, a empresa não espera encontrar problemas regulatórios no Brasil ou em outros países da América Latina.
Anatel e Cade
Segundo fontes no Brasil que estão cuidando dos procedimentos regulatórios junto às autoridades locais, ainda não está claro se o ato de concentração precisa ser levado ao Cade agora ou só depois da aprovação na Europa. O mesmo vale para a Anatel, já que ainda não está claro se é necessária uma anuência prévia ou se não existe transferência de controle. Uma decisão sobre isso pode ser tomada nos próximos dias, mas é certo que um fato relevante detalhando a operação será também publicado no Brasil, para manter as autoridades informadas.
No fato relevante publicado pela Telefónica na Espanha, está dito que "ambas as companhias (Telefónica e Telecom Italia) serão geridas de forma autônoma e independente, de forma que tanto a Telefónica como os conselheiros por ela designados se abstenham de participar e votar nas reuniões e órgãos societários em que se examinem decisões empresariais que afetem países em que ambas as empresas tenham presença".
Pela formatação final do acordo, a Telefónica terá direito a indicar dois dos 15 conselheiros da Telecom Italia e quatro dos 10 conselheiros da Telco (empresa que comprou a Olimpia, controladora da Telecom Italia).
Precedentes no Brasil
Ainda que a Telefónica tenha montado a operação de modo a não ter ingerência sobre as decisões da Telecom Italia onde as duas são concorrentes diretas, isso pode não ser suficiente. Vale lembrar alguns casos recentes no Brasil.
Um deles envolve a própria Telecom Italia, que retornou ao controle da Brasil Telecom em 2004 colocando conselheiros independentes e abstendo-se de votar e participar de decisões que envolvessem a operação de celular e longa distância da tele (pois havia sobreposição de licenças com a TIM). Ainda que essas precauções tenham sido tomadas, a Anatel só considerou que não havia mais conflito regulatório quando a Telecom Italia transferiu para um fundo fiduciário suas ações da Brasil Telecom, situação que permanece até hoje. Ou seja, naquela ocasião, não bastou para a Anatel o compromisso de não-envolvimento dos conselheiros em situações de conflito de interesses.
Isso pode indicar que, no futuro, a Telefônica terá que optar por se desfazer de sua participação na Vivo ou que a TIM deixe de ser uma empresa controlada pela Telecom Italia. Mas fontes próximas à Telefónica lembram quem a tele só terá 10% da Telecom Italia, sem poder de ingerência sobre as operações italianas no Brasil.
Prioridade é a Vivo
Segundo fontes próximas à Telefónica, a prioridade no Brasil, na área de telefonia móvel, segue sendo a compra da participação da Portugal Telecom na Vivo, mas fonte ouvida por este noticiário reconhece que a TIM é, agora, um caminho alternativo a ser considerado. Seria um investimento muito maior, considerando que o total de recursos disponíveis pelos espanhóis é o mesmo (cerca de US$ 7 bilhões, somando as vendas da TPI, Airwave e Endemol mais o limite de investimentos, menos os US$ 2,8 bilhões pagos pela compra da Olimpia). No caso da Vivo, já existe alguma integração entre a operação fixa e móvel e familiaridade com o negócio, além do fato de as negociações estarem avançadas. Também não está claro se interessaria para a Portugal Telecom ficar sozinha com uma operadora que não tem um pé na telefonia fixa.