Ministério Público, Procuradoria da República, Ministério da Justiça e sociedade civil defenderam em audiência pública nesta terça-feira, 29, um debate mais amplo do Projeto de Lei (PL) 215/2015, que está para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, e altera vários dispositivos do Marco Civil da Internet. O "PL espião", como já ficou conhecido, tem o repúdio dos movimentos sociais por entenderem que fere a liberdade de expressão e o direito à privacidade dos internautas.
Entre os artigos previstos na proposta, sofrem mais ataques o que permite o acesso de registros de logs e cadastrais sem autorização da Justiça, o aumento de pena para os crimes contra a honra materializados nas redes sociais, a punição para os provedores de acesso que não coletarem dados pessoais de identificação dos usuários, a inclusão de matéria penal no Marco Civil da Internet e que define o direito ao esquecimento. Para o procurador e professor de Direito Constitucional Marcelo Fernandes, não se pode resolver a morosidade da Justiça na investigação de crimes praticados na rede com leis que podem ferir dispositivos constitucionais. Ele ressalta que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) indica ampla defesa à liberdade de expressão. Também não concorda com a entrega de logs e dados cadastrais diretamente ao investigador, sem obediência à reserva de jurisdição.
O representante do Ministério Público Frederico Ceroy disse que já existem mecanismos para que se investiguem crimes na Internet, e que o que falta, em sua opinião, é mais qualificação para o pessoal que trabalha nesse campo. Ele é contra a inclusão de pena no Marco Civil da Internet por entender que não é a plataforma adequada, e é contra o artigo que inclui o direito ao esquecimento, acreditando ser esse dispositivo difícil de ser cumprido. "É preciso mais debate para se chegar a uma proposta factível", defendeu.
Ceroy afirmou que o direito ao esquecimento aprovado na Europa se restringe à exigência de desindexação pelo Google do conteúdo referente ao crime já considerado inexistente de outros posts sobre a pessoa, sem, contudo, exigir a retirada deste conteúdo. E a mesma exigência não vale para outros provedores de buscas. "Mesmo com essas limitações, a norma está sendo difícil de implantar", ressaltou.
O diretor do Instituto Beta para a Internet e a Democracia (Ibidem), Paulo Rená, disse que o projeto traz retrocesso ao debate democrático que marcou a construção do Marco Civil da Internet. Entre os muitos problemas que a proposta apresenta, ele destacou a obrigatoriedade dos provedores de acesso em cadastrar dados dos usuários, como CPF, endereço, e a retirar conteúdos pela mera alegação de crimes contra a honra, sob pena de restrição física e econômica às empresas e ferindo a inimputabilidade da rede. Para Rená, essa obrigação inviabilizará as redes abertas de acesso à Internet, tão necessárias à boa parte da população.
O representante do Ministério da Justiça, Marcelo Chilvarquer, por sua vez, mostrou preocupação com a possibilidade de que dados cadastrais do internauta sejam acessados pela autoridade policial, sem ordem judicial. "O sigilo dessas informações é equivalente ao sigilo telefônico, que é garantido na constituição", afirmou.
Já para o delegado da Polícia Civil Sílvio Cerqueira e o perito da Polícia Federal Rodrigo Albernaz se manifestaram favoráveis ao projeto de lei, por entenderem que facilitam a investigação de possíveis crimes na rede. Mas defendem que essas facilidades sejam estendidas para todos os tipos de crimes praticados na web e não apenas aos delitos contra a honra, calúnia e difamação.
Quem não deve não teme
Para o autor do projeto, deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), a ideia é acabar com a impunidade na Internet. "Estamos protegendo as pessoas de bem e quem não deve não teme", salientou. O relator da matéria, deputado Juscelino Filho (PRP-MA), também é enfático na defesa da proposta, afirmando que hoje o criminoso se beneficia do anonimato na web. Ele anunciou que, em novo substitutivo, reduziu a pena prevista para o crime contra a honra nas redes sociais para o dobro do que é estipulado em crimes semelhantes cometidos fora da rede. Na primeira versão do texto, a pena era quintuplicada. Ele disse que espera que a matéria seja votada já na próxima semana.
O deputado José Fogaça (PMDB-RS), autor do requerimento da audiência pública, defendeu a busca de um equilíbrio para que o projeto não ultrapasse a linha tênue que separa a liberdade de expressão, a defesa da honra e a privacidade.
Um absurdo! Nada mais!