TCU já suspeitou de crime cometido pelo presidente da CVM

Luiz Leonardo Cantidiano, atual presidente da CVM e que é investigado pela Controladoria Geral da União pela suspeita de que suas ligações com o Opportunity possam interferir nas investigações da autarquia sobre o Opportunity Fund, já foi suspeito de crime cometido em 1990, em caso muito semelhante ao atual.
A suspeita foi apontada em 1995 por auditores do Tribunal de Contas da União (TCU) que investigaram a Comissão de Valores Mobiliários entre os anos de 1990 e 1994 a pedido da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.
"Os elementos (…) configuram indícios da ocorrência do crime de advocacia administrativa, art. 321 do Código Penal, sendo seu provável autor o servidor Luiz Leonardo Cantidiano que, agindo na qualidade de diretor da CVM, teria patrocinado interesse de amigo particular, em nome de quem ficara incumbido informalmente de atuar perante a CVM", diz o relatório do TCU.

Notícias relacionadas
Cantidiano foi o único servidor público suspeito de crime pela auditoria do TCU ao longo do período analisado. Detectou-se que, no período em que serviu à CVM como diretor, em 1990, o atual presidente do órgão teria agido de forma a beneficiar pelo menos um investigado pela autarquia, com o qual Cantidiano e/ou seu escritório de advocacia mantinham relações diretas. O relatório técnico dos auditores do TCU foi aprovado na reunião plenária do tribunal do dia 30 de setembro de 1995 e publicado no Diário Oficial da União de 19 de outubro de 1995. Pedro Malan, então ministro da Fazenda e também responsável pela indicação de Cantidiano à presidência da CVM em 2002, tinha cópia do relatório do TCU. O resumo do processo e as deliberações sobre o caso estão disponíveis no site do Tribunal de Contas da União, na sessão de consultas sobre jurisprudências, no endereço www.tcu.gov.br/consultas/juris/ . O número do processo em que estão as acusações é 010.450/95-5.
A análise feita pelo TCU e concluída em 1995 sobre a CVM investigou uma série de irregularidades na forma de atuar da Comissão de Valores Mobiliários. O motivador da investigação foi um pedido da Câmara dos Deputados. Um dos questionamentos da Câmara era bastante claro: "se constatada a ocorrência de priorizações ou retardamentos na tramitação de processos (da CVM), examinar a eventual existência de casos de advocacia administrativa e/ou a conexão de funcionários ou autoridades administrativas com os interessados no feito, incluindo a possível ligação com pessoas de cônjuges ou parentes", conforme o documento do TCU TC 011.496/94-0. A resposta do TCU, dada no processo 010.450/95-5, foi direta: "não foram identificados os indícios mencionados, exceto quanto ao ocorrido no IA 04/90, cujo relator era o diretor Luiz Leonardo Cantidiano, o qual se manifestou pelo arquivamento do processo antes mesmo de a Comissão de Inquérito ultimar suas investigações". O que o TCU detectou foi que Cantidiano, como diretor da CVM, mandou arquivar um inquérito administrativo referente a um dos envolvidos no chamado "Caso Nahas" antes que o inquérito fosse concluído. Segundo o TCU, Cantidiano alegou ser amigo pessoal do indiciado, disse que conhecia o caso antes de se tornar diretor da CVM, que este amigo havia pedido sua intervenção junto à CVM no caso e que tinha certeza de que não havia irregularidade. Como queria poupar a equipe técnica da CVM de trabalhos desnecessários, Cantidiano engavetou o caso.
O Tribunal de Contas da União, sobre as atitudes de Cantidiano, fez as seguintes constatações: " 1) os autos do inquérito foram 'retirados' da comissão que fazia as investigações, para arquivamento sumário; 2) o diretor (Cantidiano), que é advogado e costumava atuar contra a CVM nos inquéritos, conhecia o caso antes de assumir a diretoria; 3) o indiciado era, senão cliente, amigo particular do diretor (Cantidiano); 4) o indiciado havia solicitado ao diretor (Cantidiano), alegadamente antes de este assumir o cargo, que procurasse a CVM para tratar do caso; 5) o diretor (Cantidiano) pré-julgou o mérito do inquérito administrativo; 6) o diretor-relator (Cantidiano) não se julgou impedido de atuar no caso; 7) evitou-se a revisão da decisão pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional".
Além disso, o TCU descobriu que Cantidiano passou casos que defendia junto à CVM antes de se tornar diretor para colegas de seu próprio escritório de advocacia o que, segundo os auditores do TCU, suscita dúvidas "quanto à efetividade do afastamento do ex-diretor da atuação como advogado".
Este caso foi submetido a diferentes instâncias do governo federal, com diferentes recomendações e determinações. Banco Central, Ministério da Fazenda (que deveria, segundo o TCU, levar o caso à Presidência da República), Secretaria da Receita Federal, Conselho Monetário Nacional entre outros foram informados sobre a auditoria do TCU e suas conclusões. Entre as determinações estava também o encaminhamento ao Ministério Público Federal "para verificação da ocorrência de crime contra a administração pública".
O TCU, com base na auditoria sobre a CVM, também recomendou ao Executivo "o estudo da oportunidade e da conveniência de se propor ao Poder Legislativo a edição de lei que institua critérios para escolha dos membros do Colegiado da CVM, visando evitar que o aparelho estatal regulador/fiscalizador deste mercado seja dirigido por pessoas cujos interesses se confundam com os do setor privado fiscalizado, por vezes antagônicos ao interesse público". Procurado por esta reportagem, o TCU pediu prazo de alguns dias para levantar se as suas determinações foram cumpridas, já que o caso é antigo e está em arquivo.

Reincidência

Como o TCU não abriu novo processo para apurar as irregularidades na CVM, é possível que os fatos constatados, inclusive a questão envolvendo Cantidiano, tenham sido respondidos satisfatoriamente pelas partes. O caso mostra, contudo, que Luiz Leonardo Cantidiano já foi acusado de ter beneficiado um ex-cliente. Atualmente, a Controladoria Geral da União e o Ministério Público investigam se suas ligações com o grupo Opportunity como advogado estão interferindo nas investigações conduzidas pela CVM sobre irregularidades no Opportunity Fund.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!