A partir da próxima semana a EACE (Entidade Administradora da Conectividade de Escolas) terá novo comando: será presidida por Flávio Santos, atual diretor de TI do BRB (Banco de Brasília), nome indicado pelo ministro das Comunicações Juscelino Filho.
A movimentação do ministro para a indicação de um nome de sua confiança para a EACE, que administra cerca de R$ 3,2 bilhões em recursos pagos pelas operadoras de telecomunicações vencedoras do leilão de 5G na faixa de 26 GHz, vem desde o final do primeiro semestre de 2023, mas havia resistência por parte das operadoras em acatar mais uma indicação política. A primeira indicação de cunho político já havia sido a escolha de Maxwell Vieira em 2022, primeiro presidente da entidade e que saiu no começo de 2023 após bater de frente com o presidente do GAPE (grupo gestor que acompanha a implementação das obrigações), conselheiro Vicente Aquino.
Apesar de terem cedido a uma pressão política, a avaliação das operadoras de telecomunicações é que havia, por outro lado, o desconforto com a falta de ação da EACE, apesar do volume de recursos. A empresa patina há dois anos na implementação dos projetos e acabou sendo atropelada pelos projetos de educação conectada liderados pelo Ministério da Educação (o que se intensificou com a edição da Estratégia Nacional de Escolas Conectadas em setembro), sem falar nas próprias ações do Ministério das Comunicações na área de educação, como o Internet Brasil, GESAC e as iniciativas custeadas pelo Fust – além das iniciativas estaduais decorrentes da Lei 14.172/2021. São todos projetos que as teles poderiam estar envolvidas ou, pelo menos, rivalizando com modelos alternativos, se a EACE tivesse sido mais ativa desde que foi criada com seu orçamento bilionário.
A leitura das operadoras, segundo apurou este noticiário, é que apesar dos riscos de governança de ter um executivo operacional indicado politicamente, a perspectiva é de que isso, por outro lado, destrave os projetos e a interlocução política fique mais facilitada. Com isso, no final de dezembro as operadoras de telecomunicações, em assembleia da EACE, aprovaram a indicação de Flávio Santos. Mas para terem algum controle, aprovaram também a colocação de um novo diretor financeiro com trajetória mais conhecida: trata-se de Carlos Saldanha, que ocupava a diretoria financeira de outra entidade, a EAD, uma entidade que é avaliada pelas próprias operadoras como exitosa na entrega das metas e obrigações estabelecidas no leilão de 700 MHz (de 2013) – onde também havia um orçamento bilionário, de R$ 3,5 bilhões, e que até aqui conseguiu passar sem grandes turbulências ou arranhões pelas inevitáveis demandas políticas que surgem quando existe muito dinheiro em jogo.
Existe ainda a perspectiva de outras mudanças e indicações políticas a serem acomodadas pela EACE, como um nome que havia sido sugerido pelo PT para a presidência: Jhon Ribeiro, hoje assessor na Secretaria de Relações Institucionais da Presidência e ligado ao ministro Alexandre Padilha. Mas tudo indica que ainda haverá alguma discussão sobre essa indicação, já que Flávio Santos assume com a expectativa de que poderá fazer uma avaliação sobre a atual estrutura da EACE.
Análise
Quando a Anatel adotou o modelo de criar entidades independentes, mas custeadas com recursos dos leilões de espectro, para implementar o cumprimento de obrigações editalícias, parecia que estava encontrando uma forma de unir políticas públicas com uma gestão empresarial ágil e eficiente. A primeira experiência foi com a Empresa Administradora da Digitalização da faixa de 700 MHz, a EAD (que adotou a marca Seja Digital), criada a partir do leilão de 4G em 2013. Foi um caso bem sucedido do ponto de vista de cumprimento das obrigações (entrega dos kits de recepção de TV digital e limpeza dos canais analógicos), concluindo a primeira leva de compromissos em 2018 com sucesso e R$ 1,5 bilhão em caixa. O sucesso foi tamanho que a empresa recebeu novas obrigações a cumprir (a digitalização dos transmissores de 1,6 mil prefeituras) e está prestes de terminar a segunda leva de compromissos com ainda outros R$ 500 milhões em caixa. Em fevereiro a Anatel decidirá novos compromissos para a empresa implementar com esse dinheiro e a EAD deve seguir ativa.
O modelo da EAD foi então preproduzido no leilão de 5G, de 2021, com a criação, desta vez, de duas entidades: a Entidade Administradora das Obrigações da Faixa de 3,5 GHz (EAF), com um orçamento de R$ 6,2 bilhões; e a EACE, responsável pelos compromissos de educação conectada, com orçamento de R$ 3,1 bilhões. A ironia é que a EACE só surgiu porque o Tribunal de Contas da União demandou que o leilão de 5G trouxesse recursos para conectar escolas.
No caso da EAF existe, naturalmente, pressão política para a ocupação de cargos, segundo apurou este noticiário, mas até aqui a entidade está passando mais ou menos imune, ainda que tenha pela frente projetos importantes a implementar, como as infovias subfluviais na região amazônica e o projeto da rede privativa governamental que será administrada pela Telebrás. O comando da empresa é ocupado por executivos do setor de telecomunicações.
No caso da EACE, desde o primeiro momento, as indicações de comando da entidade foram políticas, passando por um período de interinidade com uma executiva do seu quadro de funcionários que acabou efetivada, mas sempre sob a expectaiva de que logo seria substituída por uma indicação política, como está acontecendo agora.
O risco com essas entidades supostamente autônomas criadas para gerir os recursos decorrentes dos editais, e isso é manifestado reservadamente como um temor pelas próprias empresas de telecomunicações, é que essa permissividade possa gerar problemas maiores no futuro. Lembrando que as teles é que são, em última instância, responsáveis pela governança das entidades.