Diversos setores que utilizam serviços via satélite manifestaram preocupações na proposta de resolução para regulamentar o uso das faixas de 4.800-4.990 MHz, permitindo que elas sejam utilizadas também para a telefonia móvel, conforme proposta pela Anatel na Consulta Pública 23/2022. As principais preocupações giram em torno das possíveis interferências que podem ocorrer no uso da tecnologia 5G nessas faixas.
Para a empresa de aviação Azul, é importante que a resolução final da Anatel traga a previsão de que a agência reguladora adotará requisitos técnicos e operacionais para mitigar riscos de interferências das faixas adotadas sobre aquelas empregadas nos sistemas de aeronaves e outros relacionados ao transporte aéreo, de acordo com estudos técnicos e harmonizados com as disposições da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
A Azul lembra que radioaltímetros operam sob o serviço de radionavegação aeronáutico, que é classificado como Serviço de Segurança (Safety Service), conforme Regulamento de Rádio da UIT. Dessa forma, quaisquer mudanças nas regras que pretendam extinguir a banda de guarda que permite a convivência entre o Serviço Fixo por Satélite (FSS) e os serviços celulares, como o IMT/5G, deve ter uma participação colaborativa e harmonizada entre Anac e Anatel, o que permitirá a adoção da estrutura de rede 5G com segurança no Brasil.
Para a Eutelsat, a proposta contida na resolução coloca em consulta pública, na qual as redes de telefonia móvel seriam implantadas a partir de 4.800 MHz, em vez de iniciarem em 4.840 MHz, aumenta ainda mais a preocupação da convivência daqueles serviços com sistemas satélites operando na faixa adjacente de 4.500-4.800 MHz. A empresa diz que um dos motivos desta preocupação reside nas emissões fora da faixa de estações IMT abaixo de 4.800 MHz, que podem, de fato, causar interferências aos sinais FSS insanáveis pela simples utilização de um filtro.
A empresa lembra ainda que há um continuado aumento do número de estações de recepção de sinais de geradoras de TV sendo implantadas como parte da digitalização, incluindo o programa Digitaliza Brasil nos mais diversos municípios do Brasil. "Já são aproximadamente 5.000 estações de recepção de televisão profissional que utilizam LNBFs desenvolvidos conjuntamente pela Eutelsat e Brasilsat", diz. A operadora satelital alega que a nova proposta de assignação de frequências/serviços apresentada na consulta pública pela Anatel carece de estudos adequados e condições técnicas a serem definidas antes da tomada de decisão pela agência.
Dessa forma, diz a Eutelsat, a faixa de frequências de 4.500-4.800 MHz está beneficiando milhões de telespectadores brasileiros. "Ressaltamos e enfatizamos que o documento SEI 8196453 – Análise N°27/2022/MM, parte de uma premissa equivocada quando trata da convivência entre IMT e o FSS ao afirmar que o satélite E65WA utiliza no país como último canal a frequência de 4.733 MHz", diz a empresa na manifestação citando o Eutelsat 65WA, lançado em 2016 e com operação na banda C.
"Uma banda de guarda adequada separando as operações dos serviços IMT/5G e FSS garantirá que na faixa atribuída ao FSS, as emissões de estações IMT atinjam níveis mais baixos de emissões indesejadas. O dimensionamento da banda de guarda deve então corresponder às características do perfil de emissão das estações IMT na faixa adjacente. Uma banda de guarda maior que 40 MHz seria necessária para garantir que as emissões de interferência do IMT nos serviços FSS atinjam o nível de espúrios não prejudiciais. Outras técnicas, como limitação da potência a ser aplicada na estação base e a separação geográfica entre estações IMT e estações terrestres FSS, assumindo que a localização for conhecida, podem ajudar a reduzir o impacto da interferência proveniente de estações do IMT no FSS", defende a empresa na sua consulta.
Mais espectro para Telecom
A Eutelsat diz também que o setor de telefonia móvel tende a superestimar as necessidades de espectro para fornecer serviços de banda larga móvel. "Por exemplo, enquanto as Operadoras de Rede Móvel (MNO) geralmente estimam que 80 a 100 MHz são necessários nas faixas médias, em vários países, 40 a 60 MHz foram considerados suficientes por operadora", diz a empresa.
Ela cita o caso da Ofcom, agência reguladora do Reino Unido, que em resposta a alegações de alguns MNOs de que eles precisavam de acesso a pelo menos 80 MHz de espectro contíguo, analisou a capacidade das operadoras móveis de lançar serviços 5G com 40 MHz de espectro. Os resultados teriam demonstrado que esta capacidade seria suficiente. Nesse cenário, a empresa julga desnecessária a proposta da agência de retirar a salvaguarda de segurança, destacando que pode trazer prejuízos para diversos consumidores.
O Sindicato Nacional das Empresas de Telecomunicações por Satélite (Sindsat) diz que a proposta que extingue a banda de guarda que permite a convivência entre o FSS e os serviços celulares pode significar, de forma objetiva, que o setor satelital passará a enfrentar, na faixa em questão, o mesmo problema vivenciado na banda C com a implementação do 5G na faixa de 3,5 GHz. Dessa forma, coloca, a possibilidade de interferência prejudicial nesta faixa deve ser abordada com total parcimônia e cuidado.
Além disso, o Sindsat diz que sequer se tem definida ou concluída a convivência do FSS e do 5G na banda C estendida, que está em implantação pelas operadoras. "Cumpre mencionar que em todas as ativações do sinal 5G realizadas nas 12 capitais até o presente momento, só foram utilizadas as frequências entre 3.300 MHz e 3.600 MHz. Não se tem claro qual será o grau de perturbação proveniente da implantação das redes 5G nos serviços FSS quando houver a utilização das frequências assignadas aos lotes regionais, ou seja, quando a transmissão dos sinais 5G operar entre 3,300 MHz e 3.680 MHz", diz o sindicato das empresas de satélites.
Adicionalmente, prossegue o Sindsat na sua contribuição à CP 23, o grau de perturbação tende a incrementar, quando houver um adensamento das estações 5G, o que ocorrerá gradativamente com a crescente demanda dos clientes por serviços apoiados na tecnologia 5G. "O setor carece, portanto, de mais tempo de estudo, testes e experiência de campo para cogitar, com segurança, a supressão da faixa de guarda de que trata a CP 23/2022", finaliza a entidade.