Direito ao esquecimento precisa de contexto no Brasil

O direito ao esquecimento é tema de debate na Europa há algum tempo, mas a discussão volta a ganhar fôlego no Brasil em um momento em que está "intimamente ligado à liberdade de expressão", como explicou a representante da FGV-SP, Mônica Rosina, durante o segundo dia do Seminário de de Privacidade e Dados Pessoais do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), nesta quinta-feira, 25. Ela se refere ao período eleitoral, quando políticos costumam tentar remover conteúdo desfavorável na Internet, e cita um fato desta semana, quando o candidato à prefeitura de São Paulo, João Dória (PSDB), pediu a retirada de imagens e perfis satíricos em redes sociais. Mas além das eleições, há também discussões no legislativo. E, da mesma forma, é preciso considerar eventuais agendas de autores de propostas que podem ultrapassar uma fina linha entre direito de esquecimento e censura.

Segundo o diretor de políticas públicas do Google Brasil, Marcel Leonardi, a ideia de pedido de desindexação não é nova no País, e acontece "desde que o Google abriu escritório aqui". Ele cita precedentes no Superior Tribunal de Justiça (STJ), como a reclamação nº 5.072, de 2010 e publicado em 2014, e o Projeto de Lei nº 7881/2014, de autoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). "O projeto era sintético, com apenas dois artigos, e que dizia que era obrigatória a retirada de links 'irrelevantes ou defasados', mas que isso poderia ser feito por qualquer cidadão, sem menção à ponderação ou a necessidade de que o pedido venha da própria vítima", detalhou. "A boa notícia é que o relatório que a primeira comissão de mérito deliberou ontem e rejeitou o projeto, e a CDC (Comissão de Defesa do Consumidor) recomendou a rejeição", conta.

O diretor do Google também defende que a legislação tem de ser cuidadosamente construída, uma vez que precisa ser aplicável tanto para os grandes players quanto para os entrantes. "Se colocar regras tão elevadas que só os grandes vão poder cumprir, está praticamente garantindo que só eles fiquem lá."

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Leonardi pondera que a realidade brasileira é diferente da europeia, onde há uma diretiva já há 20 anos. "Não estou defendendo que a remoção nunca aconteça, em situações excepcionais a remoção pode sim ser acatada. A minha preocupação aqui é contrária, é de levar o que seria uma exceção a ser uma regra, e o histórico legislativo brasileiro caminha nessa área", declara. "Confiram os autores dos projetos de direito de esquecimento e pesquisem os nomes deles no próprio mecanismo de busca e vejam porque estão por trás disso", diz, sugerindo agendas próprias e políticas dos parlamentares.

Atualmente, na Europa, o Google conta com mais de 500 mil pedidos de direito de esquecimento. Os formulários são analisados manualmente por "não haver algoritmos que possam lidar com a complexidade dos casos". De acordo com Marcel Leonardi, entre 43% e 47% dos pedidos já foram atendidos.

Mais dados

O professor da UFMG e de Berkman Center/Havard, além de ex-secretário de informática (Sepin) do antigo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Virgílio Almeida, argumenta que a situação do Brasil não é única nas "variações mais e menos bem fundamentadas". Ele reclama, porém, da necessidade de haver mais dados fornecidos (ele cita o próprio Google) para fundamentar a discussão, que deverá ainda ser encaixada no contexto cultural específico brasileiro. Almeida justifica que é necessário uma abordagem analítica. "A partir de dados podemos construir modelos empíricos, analíticos e teóricos; e, a partir daí, formular modelos regulatórios, quantificar impacto e avaliar ideias e políticas", declara.

O pedido por mais dados também é feito por Julia Powes, representante britânica da Universidade de Cambridge. "No relatório de transparência, o Google publicou 23 casos, mas, apesar de muitos pedidos de 15 instituições acadêmicas, inclusive no Brasil (…) a empresa tinha categorizado e era menos de 5% do total", declara. "O processo com o Google é muito forte, mas não sabemos como é porque estamos no lado escuro da Lua."

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