A Comissão Mista Especial que analisa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 17/2019, que altera a Constituição Federal incluindo dados pessoais entre os direitos e garantias fundamentais e colocando a competência da União para legislar sobre o assunto, realizou nesta terça-feira, 22, uma audiência pública que discutiu a importância dos dados pessoais como um direito humano. Em geral, a proposta gerou consenso entre todos os convidados. O ponto divergente foi a exclusividade da União em legislar sobre o tema.
Entre todos os convidados, houve uma posição comum: a PEC é bem-vinda porque eleva a proteção dos dados pessoais para um nível Constitucional, algo visto em muitos países avançados onde a proteção de dados do cidadão é respeitada. Mostra também um amadurecimento do Brasil no assunto, já que o país possui uma Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
Foram
convidados Sérgio Paulo Gallindo, Presidente da Associação Brasileira das Empresasde Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom); Laura Schertel,Professora adjunta da Universidade de Brasília – UnB; Arthur Rollo, Presidentedo Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Inadec) e Bruna Martins dosSantos, Analista de Políticas Públicas e Advocacy da organização Coding Rights.Um representante da Casa Civil foi convidado mas não compareceu.Sergio Gallindo, da Brasscom, disse que a proteção de dados é um direito a ser resguardado, e que isso deve ser feito dentro da Constituição. Mas fez uma sugestão à Comissão. "Nós entendemos que a proteção de dados é um direito autônomo, na forma que está escrito n a PEC, ela está acoplada ao direito do sigilo de informações. Por isso, nós propomos que ela seja colocada no final do rol de direitos e garantias fundamentais do art. 5º da Constituição", disse.
Laura Schertel, professora adjunta da UnB; disse que a a LGPD colocou o Brasil no nível dos países desenvolvidos no tema de proteção de dados pessoais. Mas reconheceu que a regulação na esfera infraconstitucional não é suficiente. "Por isso, a tutela constitucional é importante para colocar o dado pessoal como algo efetivamente protegido", afirmou. Para Arthur Rollo, do Inadec, a PEC coloca a proteção de dados no mesmo nível que a defesa do direito do consumidor. E também defendeu a proteção de dados como um direito autônomo.
Bruna Martins, da organização Coding Rights, entende que a PEC 17/2019 coloca a proteção de dados como um direito amplo, para além da Internet, corroborando o que a LGPD também aponta. A advogada também ressaltou que a proteção de dados está na agenda porque os últimos acontecimentos envolvendo a consultoria Cambridge Analytica, que usou dados pessoais em processos eleitorais, mostrou como o uso de dados pessoais pode afetar processos democráticos. "O reconhecimento da proteção de dados no nível da constituição, é um pacto público que será levado em consideração quando se pensar em políticas públicas", destacou Bruna.
Divergência sobre a exclusividade da União para legislar sobre o assunto
Oponto divergente foi sobre a o ponto da PEC 17/2019 que coloca a competênciaexclusiva da União legislar sobre o assunto. Arthur Rollo, Laura Schertel eSergio Gallindo, reconheceram que a proposta da PEC coloca uma condição quegarante uma unidade legislativa no assunto, porque a proteção de dados pessoaisexige tal unidade. Bruna Martins por outro lado, fez ponderações sobre essacapacidade exclusiva da União legislar sobre o tema.
Paraa representante da Coding Rights, boa parte das iniciativas legislativas nosEstados e Municípios tentaram ocupar um vácuo legal que sobre o tema. "Isso foiantes da LGPD. Acho que sobre a competência, é importante chegarmos a um textoque não descarte por completo a autonomia dos Estados e Municípios", ponderou aadvogada.
Para Gallindo, a proposta da exclusividade da União faz sentido porque a própria LGPD já aponta no seu parágrafo único do art. 1º que ela é uma lei de interesse nacional. "Isso coloca que a LGPD deve ser observada por todos os entes federados. Os municípios não podem regular acima da lei maior", disse. Sergio também pontuou que não cabe competência concorrente entre os entes federados, como está descrito no art. 23 da Constituição, porque a competência concorrente adquire um aspecto de colaboração. "No artigo 23 da Constituição, a competência concorrente adquire um aspecto de colaboração. No caso da proteção de dados não isso não é possível. Podemos ter, caso não seja exclusividade da União regular sobre o tema, legislações conflitantes com a própria LGPD e isso pode significar para o mercado e para o cidadão uma insegurança jurídica", defendeu.
Aprofessora da UnB Laura Schertel, apontou que quando se fala da competênciaprivativa da União, fala-se também da sistematicidade de uma legislação. "Afinal,estamos falando de um único direito, a proteção de dados. Como a natureza dodado é a circulação, é importante que a proteção de dados seja regulamentadapela União", ressaltou. Schertel também concordou com a avaliação dainsegurança jurídica, assim como Arthur Rollo, do Inadec.