Atual cenário regulatório desequilibra atuação de operadoras de telecom e plataformas digitais

Marcos Ferrari, presidente-executivo da Conexis Brasil Digital

O ano de 2022 está se encerrando e pode-se dizer que foi histórico para o setor de telecomunicações. A conectividade, que ano a ano vem conquistando cada vez mais protagonismo nas relações econômicas e sociais, teve na chegada do 5G um símbolo de um processo de transformação do mundo. A transmissão de dados hoje é imperativa. 

As operadoras brasileiras do setor estão investindo cada vez mais – somente esse ano estão previstos cerca de R$ 35 bilhões – para continuar permitindo o avanço da tecnologia e assim continuar impactando a forma com que as pessoas trabalham, estudam e se divertem. Esse cenário – em que telecom está em todos os lugares – pode ensejar uma conclusão de que as empresas responsáveis por prover a conectividade estão cada vez mais lucrativas e prósperas. Para espanto de muitos, essa não é a realidade. 

Um dos fatores que tem pressionado muito o setor é o crescimento exponencial das plataformas de streaming, redes sociais e outras empresas consideradas Over The Top, as OTTs. Todos esses dispositivos exercem atividades similares às das operadoras de telecom, que envolve basicamente transmissão de dados, voz e vídeos. O problema é que disputam a competição sob outras regras e não investem para manutenção e expansão da capacidade da rede. Sobre o primeiro ponto, vale destacar que essas plataformas digitais não possuem metas de qualidade mínima, obrigações consumeristas, ou deveres de continuidade e manutenção de serviços. O tratamento regulatório e tributário também é mais favorável a elas no Brasil. 

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Em linha com esse cenário, dados da Juniper Research estimam que as receitas de voz das operadoras móveis cairão 45% entre 2019 e 2024, diante de um aumento de 88% de usuários de plataformas digitais de voz. Levantamento da GWI (Janeiro/2021) apontou que mais de 90% dos usuários de internet brasileiros acessaram YouTube e WhatsApp nos trinta dias anteriores à pesquisa, em um consumo de mais de 25 horas/mês em cada um dos dispositivos. 

Google, Facebook , Netflix, Apple , Amazon e Microsoft respondem por mais da metade do tráfego mundial de Internet, de acordo com a European Telecommunications Network Operators Association (ETNO). A proporção sobe para até 80% quando gigantes dos games como a fabricante de Call of Duty, Activision Blizzard, são incluídos. Esse cenário contribuiu para Margarethe Vestager, comissária europeia para concorrência, afirmar que "há provedores que geram grande tráfego para habilitar seus próprios negócios, mas não tem contribuído para habilitar investimentos. A Comissão Europeia está analisando se é justo exigir desses players que também contribuam para o investimento em redes". 

Ela não está sozinha, pelo contrário.  Recentemente, a primeira vice-presidente e ministra de assuntos econômicos da Espanha, Nadia Calviño, participou de um fórum organizado pelas principais empresas de telecomunicações da Europa. Na ocasião, ela se posicionou do lado das empresas de telecom e afirmou que "condições iguais" devem ser garantidas e que as Big Tech "também devem pagar ou contribuir com sua parte justa". Há vários anos, uma das grandes reivindicações das empresas de telecomunicações é que os gigantes tecnológicos paguem uma fatia proporcional no que diz respeito à custos de infraestrutura. Ou seja: operadoras como Telefónica, Vodafone e Orange exigem que multinacionais de tecnologia financiem a implantação e manutenção de redes fixas e móveis que estão sendo utilizadas em alta porcentagem para seus serviços.

Como é possível perceber, o assunto é de primeira importância em diversos mercados mundo afora. A tecnologia evolui de maneira muito rápida e transformam definitivamente os hábitos das pessoas. É preciso haver uma adequação legislativa que seja condizente com a nova realidade. A busca pelo o equilíbrio e a equidade das regras é o caminho para estimular investimentos e garantir a expansão da conectividade.

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