O Ministério da Justiça e Segurança Pública está editando uma portaria emergencial para nortear as ações de combate aos ataques terroristas em escolas, incluindo regulação específica para as plataformas digitais, como redes sociais. A medida, que não tem prazo para encerramento, deverá ser publicada ainda nesta quarta-feira, 12, passando a valer a partir da quinta-feira, 13.
Em coletiva de imprensa em Brasília, o ministro Flávio Dino assegurou que a portaria tem embasamento jurídico, citando tanto o Código Civil, por incidir sobre contratos, quanto o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que as plataformas prestam serviços. "Não temos dúvida nenhuma de que a portaria, juridicamente, é plenamente compatível com essas leis e que não há qualquer violação ao Marco Civil da Internet", declarou, afirmando ser um "falso debate" o eventual conflito com a Lei 12.965/2014.
A atuação no meio digital ficará a cargo das Secretarias Nacionais do Consumidor (Senacon) e da Segurança Pública (Senasp), do MJSP, e a sanção por descumprimento pode variar de multa de R$ 12 milhões até a suspensão da plataforma até que a medida seja cumprida. No limite, caso a empresa não coopere, existe a opção de banimento. Dino disse, contudo, que essa é só uma "hipótese" remota.
"As empresas disseram durante anos que eram neutras. O que a portaria diz que é são responsáveis. São prestadoras de serviço, e elas selecionam o que visualizamos, elas impulsionam e influenciam, portanto, o conteúdo. Não são meros recipientes", subiu o tom o ministro durante a coletiva.
A portaria não terá prazo determinado e, segundo o ministro, é específica para o tema de violência nas escolas. A intenção é que a medida tenha validade até o momento em que o Congresso passe a legislar sobre o tema de forma mais geral sobre conteúdos nocivos. Até o momento da publicação desta reportagem, a portaria não havia sido publicada no Diário Oficial da União e nem no site do Ministério da Justiça.
Medidas
- Instauração de processo administrativo na Senacon para a apuração de responsabilidade de cada empresa "em face do dever de segurança e de cuidado contra conteúdos violadores, danosos e perigosos aos estudantes". Essa medida começará já na quinta-feira. A secretaria vai também solicitar às plataformas relatórios nos quais devem apresentar medidas proativas. "Não basta dizer que está aberto a receber solicitações da polícia ou do judiciário".
- A Senacon também vai requisitar a cada rede social a avaliação de "riscos sistêmicos" como no caso dos algoritmos de recomendação (impulsionamento) e de moderação. As companhias deverão informar quais medidas estão sendo tomadas para evitar os conteúdos ilegais.
- Já a Senasp deverá emitir determinação para que as plataformas sejam obrigadas a compartilhar com delegados de polícia a "identificação do usuário ou terminal de conexão com a Internet imediatamente para facilitar as investigações". A secretaria deverá coordenar, com a requisição partindo dos delegados que presidem os inquéritos.
- A mesma Senasp deverá fixar a obrigatoriedade para que as plataformas impeçam a criação de novos perfis a partir dos endereços de IP que já foram identificados nas investigações.
- A Secretaria de Segurança Pública vai ainda criar um banco de dados relativos aos conteúdos de violência nas escolas para o compartilhamento do "hash" (identificação digital), para que as plataformas possam utilizar na moderação automática de conteúdos. Mas ainda haverá notificação tradicional quando o Ministério da Justiça encontrar conteúdos danosos.
A pasta deverá fazer uma atuação semelhante ao que ocorreu durante as eleições com o Tribunal Superior Eleitoral. "Provavelmente será no mesmo parâmetro do TSE, de duas horas", declarou Dino. Segundo o ministro, será dessa forma porque "tecnicamente foi provado que é possível" no ano passado. A partir daí, serão dois caminhos concomitantes: as sanções administrativas e o acionamento do Ministério Público. "Pode haver medida cautelar administrativa: liminarmente, é possível suspender [a plataforma], independente da conclusão do processo. E isso será feito se for necessário, quero deixar claro", alertou.
Twitter cooperando
Dino também procurou evitar criticar nominalmente as empresas. Durante a semana, o Ministério se reuniu com representantes de plataformas como Facebook, YouTube e TikTok, mas foi com o Twitter que houve maior atrito, uma vez que advogados da empresa citaram termos de uso do site como garantia de liberdade de expressão incondicional. O ministro afirmou na ocasião que nenhum contrato ou termo de uso poderia se sobrepor à lei ou à vida de crianças e adolescentes.
Coordenadora da secretaria de Direitos Digitais do MJSP, Estela Aranha disse que agora, o Twitter passou a colaborar com a pasta. "Tivemos reunião sim com a plataforma, e eles demonstraram disposição de fazer a moderação de conteúdo que faça apologia a perfis criminosos e perpetradores de massacre, inclusive na criação de fotos e nomes. Eles mostraram as medidas que passaram a tomar, em protocolo de crise, e abertura maior para essa comunicação", afirmou.
Ainda assim, o MJSP identificou aproximadamente 500 perfis no Twitter que estariam fazendo apologia ou incitando a violência nas escolas. Segundo Flávio Dino, a rede social será notificada imediatamente.