A Coalizão Direitos na Rede, coletivo composto por 37 organizações da sociedade civil que defendem o acesso, a privacidade e a liberdade de expressão na Internet, lançou nesta terça-feira, 10, a cartilha "Liberdade de Expressão online e o papel do Marco Civil da Internet". O objetivo é de dialogar com parlamentares, comunicadores operadores do Direito, empresas e demais organizações da sociedade civil sobre como garantir em tempos de grandes plataformas na Internet, o que consideram ser direito fundamental.
A cartilha aponta para a reflexão sobre a liberdade de expressão no mundo online, em uma conjuntura de coleta e tratamento massivos de dados pessoais. "As redes sociais possibilitaram maior diversidade de ideias e opiniões em circulação, mas também apresentam novos desafios do ponto de vista da comunicação online e da liberdade de expressão, além do histórico enfrentamento à desinformação, aos discursos de ódio e às práticas violadoras de direitos humanos", diz trecho da cartilha.
"Pressionadas, as empresas de tecnologia têm tirado do ar ou reduzido o alcance de um volume cada vez maior de conteúdos. O uso de inteligência artificial e de mecanismos de machine learning nesses processos também disparou. No Parlamento brasileiro, diversos projetos de lei pretendem atacar este problema alterando o Marco Civil da Internet. Será que este é o melhor caminho?", questiona o documento elaborado pela Coalizão.
O Marco Civil da Internet
Em 2014, o Brasil aprovou o Marco Civil da Internet (MCI), uma lei construída de maneira colaborativa e que representou um marco mundial nos direitos civis digitais no mundo. Os pontos centrais da lei são a neutralidade de rede, direito à privacidade e a garantia de liberdade de expressão. Em seu artigo 19, o MCI determina que o provedor de aplicações de Internet somente será responsabilizado civilmente por conteúdos produzidos por terceiros caso não retire o conteúdo após decisão judicial específica para este fim. Ou seja: com a sanção do MCI, a responsabilidade das aplicações intermediárias vale a partir do momento em que estas recebem uma ordem judicial para remover um conteúdo analisado por um juiz. Antes, se alguma autoridade estivesse insatisfeita com as críticas de um blog, por exemplo, bastava uma notificação para que o provedor de hospedagem se sentisse obrigado a derrubar o conteúdo publicado, o chamado "notice take down".
"Com o MCI,buscou-se aliviar a pressão sobre as plataformas para que atuassem comointérprete da lei, vez que antes ficava totalmente nas mãos das empresasprivadas a decisão sobre que conteúdos poderiam circular ou não na Internet,numa lógica que ignorava o papel do Estado e podia resultar em casos de censuraprivada, desconsiderando, em muitos momentos, o direito de defesa de quemdivulgou inicialmente tais conteúdos questionados. Com o advento do MCI, passoua vigorar o princípio da inimputabilidade da rede, segundo o qual o combate ailícitos na Internet deve ter como alvo os responsáveis pelos mesmos, e não osmeios de acesso e transporte a eles", diz outro trecho da cartilha.
A responsabilização dos intermediários, por conteúdos produzidos por terceiros, está na pauta de julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação tem como objeto a constitucionalidade do artigo 19 do MCI. Com a cartilha, a Coalizão "resgata os esforços da sociedade brasileira na construção desse direito na última década, como também aproveita o momento histórico para municiar os mais diversos atores (magistrados, parlamentares, operadores do direito e 'policymakers') com o arcabouço que reafirma a inimputabilidade da rede como pilar constitutivo da arquitetura da rede e que sobre ela se constituiu um ambiente aberto ao debate público de maneira mais ampla", diz a rede de entidades em sua página de Internet.