Porquê a destinação da faixa de 6 GHz deve ser mantida

Em fevereiro de 2021, por meio de deliberação unânime de seu Conselho Diretor, a Anatel decidiu destinar toda a faixa de 6 GHz – entre 5.925 MHz e 7.125 MHz – para uso não licenciado por equipamentos WiFi, nas tecnologias Wi-fi 6E e Wi-fi 7.  Por ter sido uma decisão unânime, respaldada pelo bem fundamentado informe que foi elaborado pela área técnica, não resta dúvida de que o órgão regulador reuniu boa motivação social, econômica, competitiva e tecnológica para tomá-la.  

Faço coro com as associações NEO, Telcomp, Abrint, DSA e outras entidades representativas para dizer que essa decisão foi acertada e merece todo o apoio daqueles que defendem a expansão da banda larga fixa e o direito à conectividade significativa para o maior número possível de brasileiros.

Quais foram as razões que fizeram a Anatel tomar essa decisão e por que ela é tão saudável e benéfica para o setor de telecomunicações brasileiro? Vou me utilizar de três argumentos de forma bem didática para defender minha opinião.

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É mais vantajoso para o setor de telecomunicações brasileiro que a faixa de 6 GHz permaneça como está, destinada ao uso não licenciado de equipamentos de rede Wi-Fi, tanto para fortalecer a competitividade, quanto para incentivar a indústria nacional e a necessidade de atualização tecnológica.

Fortalecer a competitividade da banda larga fixa

É necessário pontuar que as redes Wi-Fi são um complemento indissociável da banda larga fixa. É inconcebível para qualquer usuário de banda larga fixa, atualmente, manter seus dispositivos conectados apenas por cabos dentro da sua residência ou empresa. Pensando dessa forma, as redes Wi-Fi acabam possibilitando que a banda larga fixa possa escoar tráfego com uma pequena mobilidade e, assim, concorrer com a banda larga móvel em ambientes limitados.

Nesse sentido, a alocação de toda a faixa de 6 GHz para possibilitar a evolução das redes Wi-Fi torna mais simétrica a competição entre a banda larga fixa e a banda larga móvel. Isso tem ainda mais relevância no contexto brasileiro, onde o mercado de banda larga fixa tem mais de 20 mil prestadoras atuando e onde 52% dos acessos é garantido por prestadoras regionais ou PPPs – prestadoras de pequeno porte. Diferentemente da banda larga móvel, cuja concentração de mercado revela que 97% dos acessos são providos pelas gigantes Tim, Vivo e Claro. Mesmo os assinantes da banda larga móvel, como é o meu caso, quando estão em ambientes com acesso Wi-Fi, optam por economizar seu plano de dados móveis.

É importante pontuar que as assimetrias regulatórias que a Anatel vem promovendo nos últimos 10 anos – entre elas essa destinação da faixa de 6 GHz – possibilitaram uma competição sem precedentes na banda larga fixa no país, cujos resultados são evidentes:

  • O número de acessos subiu de 21,6 milhões para 46,9 milhões;
  • O número de acessos em fibra subiu de 950 mil para 34,3 milhões;
  • A velocidade média contratada subiu de 14,9 Mbps para 307,8 Mbps;
  • O número de municípios de menos de 30 mil habitantes com banda larga em fibra subiu de 3041 para 3963;
  • O preço médio de megabit por segundo caiu de R$ 13,20 para R$ 0,35.

A relevância da banda larga fixa no país está sendo reconhecida, inclusive, internacionalmente. Em recente publicação, o influente jornal Financial Times afirma que a rápida disseminação das conexões de banda larga de fibra no Brasil deverá impulsionar o crescimento de sua economia digital e possibilitar que, até 2026, o país ocupe a nona posição mundial em um ranking que mede a performance em disponibilidade de conexões de internet, uso de smartphones e dispositivos IoT, gastos em streaming e outras formas de entretenimento digital, intermediação de pagamentos eletrônicos e em consumo corporativo de dados.

Portanto, garantir que toda a faixa de 6 GHz seja usada para aprimorar as experiências e velocidades das redes Wi-Fi significa uma maior competição entre a banda larga fixa e a banda larga móvel. Isso é benéfico para o consumidor, que poderá escolher entre uma e outra, em maior igualdade de condições. Utilizar um dispositivo móvel conectado a uma rede Wi-Fi é uma experiência comum a todos que têm banda larga fixa em sua residência ou ambiente de trabalho.

Incentivo à indústria nacional

Outro motivo importante para manter toda a faixa de 6 GHz para as redes Wi-Fi é o incentivo à indústria nacional de equipamentos. Enquanto a indústria de equipamentos para a telefonia móvel é quase que inteiramente de tecnologia estrangeira, os equipamentos para as redes Wi-Fi têm parcela significativa produzida no Brasil e o incentivo às redes Wi-Fi pode ter um efeito multiplicador significativo em toda a cadeia de suprimentos de telecomunicações.

Ainda sobre esse tema, é importante mencionar que a decisão da Anatel segue padrão semelhante à escolha tomada nos EUA, que também tem uma indústria forte de equipamentos e deve influenciar outros países das Américas, elevando assim as economias de escala e reduzindo os preços dos insumos para as redes Wi-Fi no Brasil.

É também uma questão de segurança jurídica para os investidores, tomando emprestado um argumento do engenheiro Giuseppe Marrara, da Cisco. Houve indústria que ampliou sua planta no Brasil após a destinação da faixa de 6 GHz para as redes Wi-Fi. Se a destinação for revista, gera insegurança, afugenta investidores e impede que muitos empregos de alta qualificação sejam gerados.

Nesse sentido, as redes Wi-Fi associadas à banda larga fixa incentivam e fortalecem a indústria e a geração de empregos no Brasil, ao passo que as redes móveis se utilizam de antenas (estações rádio base – ERBs) cujos fabricantes estão na China, na Finlândia ou na Suécia.

Atualização tecnológica

A terceira motivação para defendermos a decisão da Anatel é de ordem tecnológica. A alocação de toda a faixa de 6 GHz para as redes Wi-Fi preenche um gap de quase 15 anos sem evoluções nas redes Wi-Fi e abre o caminho para a evolução do Wi-Fi 7 no Brasil.

O Wi-Fi 7 é a geração mais recente de conexões wireless, que deve proporcionar redes sem fio ainda mais rápidas e estáveis. Enquanto as redes Wi-Fi 6 operam em duas frequências, de 2,4 GHz e 5 GHz, canais com até 160MHz de largura de banda, o Wi-Fi 7 traz uma terceira frequência de 6GHz, apresentada no padrão 6E, que oferece canais com largura de banda mais elevada, de 320 MHz.

O Wi-Fi 7 tem como principal benefício a velocidade, permitindo a transferência de dados até 4,8 vezes mais rápido que com o Wi-Fi 6. Além disso, a latência é muito baixa, o que significa uma conexão com respostas muito mais rápidas. O Wi-Fi 7 é capaz de conectar mais dispositivos sem perder velocidade.

A tecnologia Wi-Fi 7 possibilitará que o Brasil se coloque em sintonia com a vanguarda tecnológica em sistemas de comunicação, com consequentes benefícios para os consumidores, ganhos de eficiência para as empresas e incentivos para a inovação.

Isso é muito relevante num cenário em que as pessoas e as empresas consomem cada vez mais dados no âmbito de suas casas e parques industriais. Essa tecnologia permitirá que as pequenas prestadoras possam oferecer serviços de tráfego de dados com potencial de qualidade semelhante ao proporcionado pela tecnologia 5G das grandes prestadoras móveis. Quanto mais qualidade ofertada nas redes Wi-Fi, maior o leque de escolha e liberdade para o consumidor brasileiro. Isso tudo é muito bom!  Por todas essas razões, fiquei feliz em representar a Associação NEO na audiência pública realizada pela Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados, conduzida pelo deputado e ex-ministro das Comunicações André Figueiredo, para debater sobre a faixa de 6GHz. Ainda que o tema venha a ser debatido na Conferência Mundial de Radiocomunicação, que acontecerá nos próximos dias em Dubai, nosso posicionamento permanecerá em defesa da destinação adotada pela Anatel, no sentido de que essa faixa continue sendo para uso não licenciado com equipamentos de redes Wi-Fi!

*Sobre o autor: Aníbal Diniz é consultor da Associação NEO pela AD Advisors desde junho de 2020. Graduado em História pela UFAC, atuou no jornalismo (1984 – 1992), foi assessor de comunicação da Prefeitura de Rio Branco (1993-1996), secretário de comunicação do Governo do Acre (1999-2010), senador da República PT-AC (Dez. 2010 – Jan. 2015) e conselheiro da Anatel (out. 2015 – nov. 2019). As opiniões expressas nesse artigo não necessariamente refletem o ponto de vista de TELETIME.

 

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