Não é só no Brasil que as pessoas encarregadas de investigar ou julgar Daniel Dantas e o Opportunity são afastadas ou deixam o caso. Pode ser apenas uma curiosa coincidência de datas, mas o juiz Lewis Kaplan, que desde março de 2005 foi o responsável por algumas das mais significativas decisões judiciais contra o grupo Opportunity nos EUA, também se afastou, ou foi afastado, do caso. Kaplan era o responsável pelo processo que corria na Justiça de Nova York movido pelo Citibank, em que Dantas foi acusado de fraude, enriquecimento ilícito, gestão fraudulenta, quebra de dever fiduciário entre outros.
Na segunda, dia 6, o caso foi atribuído a um outro juiz: John G. Koeltl. Segundo o sistema de acompanhamento de processos, a razão para a nova distribuição foi "recusal". Em termos jurídicos, "recusal" é uma situação que se coloca quando há desqualificação ou saída voluntária de um juiz de um determinado caso em função de parcialidade ou conflito de interesse. O que ainda não está claro é se alguma das partes (Citibank ou Opportunity) é que pediu o "recusal", se houve uma decisão da Corte ou se foi uma decisão do próprio juiz. Este noticiário entrou em contato com a assessoria de Kaplan para fazer estas e outras perguntas e a única resposta que obteve foi: "Sobre este caso, o juiz Kapan não fará nenhum comentário". Como nenhuma das partes pediu o "recusal" de Kaplan, é provável que a decisão tenha sido de caráter pessoal.
Quase encerrado
O curioso é que a ação em Nova York está praticamente encerrada. Em abril deste ano, Citi e Dantas chegaram a um acordo e retiraram as acusações de parte a parte. Foi um acordo decorrente da resolução das pendências judiciais que aconteceu também no Brasil, celebrada entre fundos de pensão, Brasil Telecom e Opportunity como etapa para a posterior venda da Brasil Telecom para a Oi. Quem pagou a compensação para a Brasil Telecom e para o Opportunity pelo fim dos litígios foi, inclusive, a Telemar.
Em Nova York, contudo, ficou apenas uma pendência a ser resolvida na ação: trata-se de um pedido feito pelo empresário e ex-sócio de Daniel Dantas, Luis Roberto Demarco, para ter acesso a certos documentos que fazem parte do processo e estão sob sigilo, mas que foram citados pelo Opportunity em diferentes momentos da ação. A alegação de Demarco é que estes documentos são fruto da espionagem promovida pela Kroll no Brasil e que podem ser usados como prova no processo criminal que corre na Justiça brasileira contra Daniel Dantas e contra a Kroll. Tanto Citibank quanto o Opportunity, ao se manifestarem, pediram a Kaplan para que o pedido de Demarco fosse negado e para que os documentos permanecessem em sigilo. A decisão final está pendente.
Juiz duro
Kaplan foi um juiz extremamente duro com o Opportunity ao longo do tempo em que esteve no caso. Em diversas ocasiões ele desqualificou a argumentação do grupo de Daniel Dantas e apontou irregularidades nos atos. E praticamente todas as decisões importantes que proferiu no caso, liminares ou não, foram contra Dantas.
Em uma audiência realizada em 15 de março de 2005, por exemplo, Kaplan disse: "Isso cheira roubo. O que vejo é que seu cliente quer uma compensação para sair quieto do negócio. Não há defesa aqui", referindo-se ao advogado do Opportunity. Este foi o primeiro de muitos maus momentos vividos pelo grupo de Daniel Dantas nas mãos de Kaplan.
Não parou por aí: "Ele (Dantas) tem tirado vantagens de todas as maneiras possíveis imagináveis pela mente humana, sejam elas legais ou não. (…) Ele tem se engajado continuamente em um comportamento obstrutivo que, em minha visão, constitui manifestação bruta de abuso de seus deveres fiduciários. (…) Tenho poucas dúvidas de que ele tenha agido em um instinto de auto-preservação e com uma completa falta de boa fé ao longo desse processo", disse Kaplan em 30 de setembro de 2005, dia em que Dantas foi obrigado a entregar o controle da Brasil Telecom.
Jogo internacional
A saída do juiz Lewis Kaplan do processo em Nova York coincide com a investida dos advogados de Dantas, no Brasil e nos EUA, junto a autoridades dos dois países. Os fatos podem ou não ter relação, e isso não está claro.
Nos EUA, o advogado Philip Korologos, que defende Daniel Dantas, teria enviado carta ao Departamento de Estado daquele país alegando ter sido grampeado pelas autoridades brasileiras na Operação Satiagraha. Na verdade, quem foi grampeado com autorização judicial foi Daniel Dantas e seu grupo, e os diálogos com Korologos aparecem nesse contexto. Em alguns dos diálogos, aliás, os executivos do Opportunity mostram insatisfação com as decisões de Kaplan.
Korologos também pediu no Brasil que o Supremo Tribunal Federal concedesse acesso aos autos da Operação Satiagraha. Da mesma forma, o criminalista Nélio Machado, que defende Dantas, tem dado declarações a alguns veículos de imprensa em que se diz grampeado e seguido. Nos últimos dias, repetiu formalmente estas acusações ao Supremo, a quem pediu providências. Tanto o pedido de Korologos quanto o de Machado se dão no âmbito do processo em que foram concedidos habeas corpus pelo ministro Gilmar Mendes que tiraram Dantas (duas vezes) e os demais investigados pela Satiagraha da prisão. O relator do processo é o ministro Eros Grau, mas não há previsão de julgamento do caso.