A simbiose entre 5G e a transformação digital da economia

Porto de Tianjin, na China: exemplo de integração entre IA, 5G e automação

Uma das principais perguntas ainda não respondidas sobre o 5G é, afinal, de onde virá o dinheiro, e a viabilização, para os investimentos monumentais que precisarão ser feitos pelas operadoras de telecomunicações. Segundo dados apresentados por Alex Sinclaire, CTO da GSMA durante o MWC Shanghai, que aconteceu na semana passada, na China, nos próximos anos as operadoras investirão nada menos do que US$ 1,3 trilhão na infraestrutura, e 92% disso será consumido nas redes 5G.

Paul Scanlan, conselheiro especial da presidência da Huawei

A resposta para essa pergunta, aponta Paul Michael Scanlan, conselheiro para a presidência da Huawei, pode estar no exemplo da China. Em nenhum outro país do mundo o 5G evoluiu tanto. São mais de 660 milhões de usuários, o que representa mais da metade de todos os usuários de 5G no mundo. Em quantidade de estações rádio base, são 2,3 milhões de ERBs, mais do que qualquer país do mundo. Mas, segundo ele, não é a capacidade instalada em si que faz a diferença, e sim o fato de que o 5G tem sido parte de um processo de transformação da economia chinesa que passa por vários segmentos. "A resposta (para a viabilização do 5G) está na incorporação da tecnologia por outros setores", disse ele, em conversa com jornalistas durante o MWC Shanghai 2023.

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Para Jim Cathey, CCO da Qualcomm, que também participou do evento, a  transformação digital da economia vai consumir US$ 3,4 trilhões até 2026, ou parte, boa parte disso, em 5G. Parece muito, diz ele, mas o retorno desses investimentos é muito amplo, e afetará várias cadeias produtivas. "Se me perguntarem qual foi a geração móvel de maior impacto, com certeza direi, daqui a alguns anos que o 5G foi o melhor 'G' que já criamos, porque foi ele que viabilizou o casamento da conectividade com a inteligência artificial, que será a base do 6G daqui a alguns anos", prevê. Para ele, uma das maiores mudanças que veremos nos próximos anos é o desenvolvimento das redes privativas.

Abertura do MWC Shanghai 2023

É aí que o MWC Shanghai permite uma perspectiva inédita: em nenhum país do mundo tantos setores da economia estão tão conectados quanto na China.

Política top-down

"O que aconteceu aqui foi um projeto top-down", diz Scanlan, da Huawei. Segundo ele, a busca de eficiência em diferentes áreas como em setores como portos, aeroportos, mineração, saúde e cidades inteligentes fez com que o casamento dessas atividades com o 5G acontecesse. "O 5G é uma tecnologia (de banda larga móvel) pensada na eficiência. Ele pode parecer a mesma coisa que o 4G, mas quando você olha de perto ele tem uma capacidade 20 vezes maior, e isso se traduz em mais capacidade e menores custos para as operadoras e para os usuários", analisa. "É aí que está o real valor do 5G". 

Segundo Paul Scanlan, o modelo chinês de desenvolvimento está baseado na ideia de desenvolver provas de conceito e tentar dar a maior escala possível. "Aqui, desenvolvemos essas provas e escalamos. Se não dá certo, voltamos e fazemos de novo, diferente", diz ele. Para isso, é preciso uma cooperação intensa com outros setores, o que obviamente depende de um comprometimento com a busca de eficiência também por parte destes. "Não é fácil, todos precisam estar comprometidos", diz ele.

Questionado se as operadoras chinesas estão tendo mais sucesso do que as ocidentais em capturar o valor da economia digital, Scanlan diz que, de certa forma, sim. "É preciso colocar o que acontece nos EUA sob uma perspectiva diferente do resto do mundo porque lá as empresas e o mercado de consumo são muito maiores. Mas de um modo geral, diria que sim, as operadoras chinesas estão aproveitando melhor a economia digital. Digo isso em termos de resultados de negócio, olhando em contribuição para a economia, não necessariamente em lucro ou rentabilidade. As operadoras de telecom são tradicionalmente viabilizadores, e aqui eles fazem isso. Eles encontram soluções e pegam uma parte da receita. É muito difícil fazer isso em outros lugares", diz ele.

Não por acaso, as mensagens dos principais executivos das principais operadoras chinesas durante o MWC Shanghai foram justamente nesse sentido.

Parcerias

Para Ke Ruiwen, chairman e CEO da China Telecom, 5G é a palavra chave da empresa. "Devemos atuar em parceria, não atuando apenas nos modelos passados, mas encarando novos paradigmas", diz o executivo. "Sem o compartilhamento de (nossa rede) 5G SA e sem co-working e cooperação não estaríamos onde estamos hoje. O valor da rede está aí (nas parcerias). Tem muita oportunidade e espaço de colaboração e integração" , diz ele.

Segundo Yang Lie, executive director e chairman da China Mobile, integração e cooperação em padrões, pesquisa e desenvolvimento, vendas e gestão de negócios são essenciais. "Operamos para que todas as empresas superem os seus desafios. Todos devemos trabalhar em três esforços: 1) expansão conjunta de aplicações; 2) Promover a evolução e upgrade da tecnologia e das práticas e; 3) Promover a interconectividade e compartilhamento de capacidades", diz ele, que concluiu: "todas as grandes causas são resultados de esforços em conjunto".

Yang Jie, diretor executivo da China Mobile, durante o MWC Shanghai 2023

Para Paul Scanlan, a América Latina pode tirar proveito dessas lições, ainda que não existam fórmulas prontas. "Eu diria (aos operadores e governos) que olhem para a China. Cada país tem as suas necessidades e sua realidade, mas existem casos de uso que podem ser observados aqui. Mas nós não vendemos casos de uso, vendemos tecnologia, que deve ser utilizada conforme a necessidade de cada operadora e cada país", diz ele.

Um dos pontos que a Huawei destaca em suas apresentações é o volume de investimentos feitos, que nos últimos dois anos foi de 15% para mais de 25% das receitas da empresa, e hoje supera os US$ 22 bilhões anuais. "Fazemos não apenas pesquisas de base, mas também pesquisa para desenvolver soluções para os outros setores", diz Scanlan.

Mas ele também destaca os efeitos das sanções impostas pelo governo norte-americano contra a empresa como um impulsionador do trabalho de pesquisa e desenvolvimento. "Quando nos negam insumos, precisamos buscar soluções. Precisamos pesquisar semicondutores, baterias, software, novos materiais, e uma vez que encontramos soluções, essas soluções podem ser 'exportadas' para outros setores. É isso que estamos fazendo quando entramos no mercado de energia, ou no mercado de carros elétricos", diz, mostrando um efeito colateral que acabou sendo positivo para a empresa após as sanções que restringiram o mercado para a Huawei. (O jornalista viajou à China à convite da Huawei)

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