Decreto de Bolsonaro que extingue colegiados afeta CGI, Comitê da Lei de Informática e Anatel

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O Decreto 9.759/2019, que "extingue colegiados" e que foi editado nesta quinta, 11, em edição extraordinária do Diário Oficial como parte das medidas de 100 dias do governo Bolsonaro, pode provocar pesadas baixas em órgãos vinculados ao Ministério de Ciência, Tecnologia, Comunicações e Inovações, como o Comitê Gestor da Internet, e afetar uma série de estruturas vinculadas à Anatel, como o Gired (que cuida da TV digital), os Conselhos de Usuários das operadoras e os comitês de trabalho da agência.

No caso do MCTIC, uma consequência direta do decreto é a possível extinção, pelo menos temporariamente, do Comitê Gestor da Internet. Isso porque o decreto extingue, automaticamente, todos os comitês, conselhos, comissões, grupos e tudo o que possa ser entendido por colegiado e que tenha sido criado por decreto, sem previsão em lei. É exatamente o caso do Comitê Gestor de Internet, criado pelo Decreto Nº 4.829, de 3 de setembro de 2003, e sem previsão legal específica.

Também pode estar sendo afetado o Comitê da Área de Tecnologia da Informação (CATI), que exerce uma série de tarefas importantes referentes aos trâmites da Lei de Informática mas que, apesar de referenciado em lei, não teve nem as suas atribuições diretamente definidas nem seus representantes apontados em lei. Ou seja, a base normativa do CATI é praticamente apenas o Decreto 5.906, de 26 de setembro de 2006.

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Outro órgão ligado ao MCTIC e possivelmente afetado é a Câmara Técnica de IoT, prevista no Decreto 8.234/2014 mas instituído apenas por Portaria Ministerial. Comitês como o do Funttel, criados claramente com função e composição definida em lei, não são afetados.

Anatel

Levado ao pé da letra (e o Decreto 9.759 é bastante confuso), a medida de extinção de colegiados imposta por Bolsonaro pode ter grande impacto na Anatel e outras agências, por exemplo. Isso porque o decreto se estende a autarquias. Não está claro se a natureza administrativa das agências, que são autarquias especiais, seria uma exceção, pois o Decreto não se refere a estes casos. As agências são órgãos da administração indireta e gozam de autonomia administrativa. O texto diz apenas:

"Art. 1º  Este Decreto extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

Parágrafo único.  A aplicação deste Decreto abrange os colegiados instituídos por:

I – decreto, incluídos aqueles mencionados em leis nas quais não conste a indicação de suas competências ou dos membros que o compõem;

II –  ato normativo inferior a decreto; e

III – ato de outro colegiado

Estão salvaguardados apenas as diretorias colegiadas de autarquias e fundações; as comissões de sindicância e de processo disciplinar; e as comissões de licitação. Ainda segundo o decreto:

Art. 5º  A partir de 28 de junho de 2019, ficam extintos os colegiados de que trata este Decreto.

Parágrafo único.  O disposto no caput não se aplica aos colegiados:

I – previstos no regimento interno ou no estatuto de instituição federal de ensino; e

II – criados ou alterados por ato publicado a partir de 1º de janeiro de 2019.

Caso a interpretação seja a de que a Anatel e demais agências são afetadas, existem casos de colegiados com funções críticas dentro da Anatel e que seriam extintos. É o caso do Grupo de Implantação do Processo de Redistribuição e Digitalização de Canais de TV e RTV (Gired) que acompanha a implantação da TV digital.

A Anatel também tem diferentes comitês , como o Comitê de Espectro e Órbita (CEO), o Comitê de Defesa dos Usuários (CDUST), os Conselhos de Usuários das prestadoras, instituídos por regulamentação da agência. E há ainda grupos, como as CBCs (Comissões Brasileiras de Comunicação), que dão suporte à agência nas coordenações com organismos Internacionais.

Existe a chance de que os colegiados sejam recriados, mas com limitações. Segundo o decreto de Bolsonaro, as propostas de criação de novos colegiados, de recriação de colegiados extintos em decorrência do Decreto ou de ampliação dos colegiados existentes deverão:

I – observar o disposto nos art. 36 a art. 38 do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro de 2017, ainda que o ato não seja de competência do Presidente da República;

II – estabelecer que as reuniões cujos membros estejam em entes federativos diversos serão realizadas por videoconferência;

III – estimar os gastos com diárias e passagens dos membros do colegiado e comprovar a disponibilidade orçamentária e financeira para o exercício em curso, na hipótese de ser demonstrada, de modo fundamentado, a inviabilidade ou a inconveniência de se realizar a reunião por videoconferência;

IV – incluir breve resumo das reuniões de eventual colegiado antecessor ocorridas nos anos de 2018 e 2019, com as medidas decorrentes das reuniões;

V – justificar a necessidade, a conveniência, a oportunidade e a racionalidade de o colegiado possuir número superior a sete membros; e

VI – vedar a possibilidade de criação de subcolegiados por ato do colegiado, exceto se a norma de criação do colegiado principal houver:

a) limitado o número máximo de seus membros;

b) estabelecido caráter temporário e duração não superior a um ano; ou

c) fixado o número máximo de subcolegiados que poderão operar simultaneamente.

Parágrafo único.  A mera necessidade de reuniões eventuais para debate, articulação ou trabalho que envolva agentes públicos da administração pública federal não será admitida como fundamento para as propostas de que trata o caput.

No caso daqueles colegiados que precisem de Decreto para serem recriados, como seria o caso do CGI, "as propostas de recriação de colegiados, sem quebra de continuidade dos seus trabalhos, serão encaminhados à Casa Civil da Presidência da República até 28 de maio de 2019". Não fica claro se a referência a continuidade dos trabalhos significa que os colegiados seguem funcionando.

Além disso, "os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional encaminharão a relação dos colegiados que presidam, coordenem ou de que participem à Casa Civil da Presidência da República até 28 de maio de 2019", com os respectivos atos normativos.

O Decreto 9.759/2019 não passou por outros órgãos do governo e é assinado apenas pelo presidente e pelo ministro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.

7 COMENTÁRIOS

  1. Minha opinião é que esse decreto não se aplica ao CGI.
    Veja o artigo primeiro, caput.
    Refere-se somente aos entes da administração pública federal.
    O CGI não é administração pública. Não onera os cofres públicos, pelo contrário, sequer tem dotação no orçamento público.
    Não são ente da administração pública federal.
    O CGI é importante e desempenha muito bem seu papel de forma multissetorial e paritário
    Cabe a nós tentar ajudar a esclarecer e defender a verdadeira natureza do CGI.
    Grande abraço.

  2. Concordo com o Lacier o CGI foi criado por Decreto porque incluía a participação de representantes dos Ministérios mas o Nic.br e todos as estruturas relacionados são privadas e não dependem de dotação de governo . O comitê gestor tem o objetivo de seguir um modelo multistakeholder -onde todos os interessados têm voz ativa. Mas se o governo não quiser participar, este conselho pode ser criado pela iniciativa privada e convidar o governo a participar, quiçá com a presença do representante do GAC – ICANN neste Conselho

      • Há um porém. Como o ccTLD ".br" está delegado ao CGI.BR, com a extinção do comitê, o ".br" passa para as mãos do governo Bolsonaro.

        Nós sabemos muito bem que códigos de países na Internet que são administrados por governos com democracias frágeis, acabam se tornando uma ferramenta de controle da mídia.

        É o que ocorre com ".ve" da Venezuela, ".kp" da Coreia do Norte, ".cu" de Cuba, ".sa" da Arábia Saudita e etc…

        Outro porém é o risco que esta extinção pode trazer. A categoria de domínio de primeiro nível ".gls.slg.br" destinada aos sites GLS e sites Legalmente gays no Brasil (SLG.BR), a primeira categoria do ".br", operada por uma organização privada, poderá receber fortes ataques do governo ou até ser cancelada.

        O governo Bolsonaro anunciou a unificação de todos os sites da categoria gov.br ligada ao governo federal,mas não informou se isto ocorrerá com o mil.br de instituições militares do governo.

        Estas práticas adotadas por Bolsonaro, são um retrocesso na governança da Internet no Brasil.

  3. Há um porém. Como o ccTLD ".br" está delegado ao CGI.BR, com a extinção do comitê, o ".br" passa para as mãos do governo Bolsonaro.

    Nós sabemos muito bem que códigos de países na Internet que são administrados por governos com democracias frágeis, acabam se tornando uma ferramenta de controle da mídia.

    É o que ocorre com ".ve" da Venezuela, ".kp" da Coreia do Norte, ".cu" de Cuba, ".sa" da Arábia Saudita e etc…

    Outro porém é o risco que esta extinção pode trazer. A categoria de domínio de primeiro nível ".gls.slg.br" destinada aos sites GLS e sites Legalmente gays no Brasil (SLG.BR), a primeira categoria do ".br", operada por uma organização privada, poderá receber fortes ataques do governo ou até ser cancelada.

    O governo Bolsonaro anunciou a unificação de todos os sites da categoria gov.br ligada ao governo federal,mas não informou se isto ocorrerá com o mil.br de instituições militares do governo.

    Estas práticas adotadas por Bolsonaro, são um retrocesso na governança da Internet no Brasil.

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