Rede privativa "anti-China", defendida por Bolsonaro, pode ter recursos usados em outros projetos

O Ministério das Comunicações está analisando alternativas para tentar realocar pelo menos parte dos recursos que haviam sido previstos no edital de 5G para o projeto da rede privativa governamental para outros usos ou políticas. Segundo apurou este noticiário, a avaliação preliminar é que dos R$ 1,5 bilhão previstos para uma rede nacional segura de uso exclusivo do governo mais uma rede móvel 4G em Brasília, uma parte significativa poderia ser destinada a outros programas caso se constate, como tem aparecido até aqui, que não há de fato uma demanda por parte dos diferentes órgãos governamentais.

Na semana passada, em entrevista a este noticiário, o conselheiro Moisés Moreira, presidente do Gaispi (grupo que tem como responsabilidade o acompanhamento dos compromissos impostos aos vencedores do leilão de 5G na faixa de 3,5 GHz, entre eles a rede privativa), já havia sinalizado que de uma estimativa inicial de 6 mil pontos de conexão da rede privativa, uma segunda chamada do governo indicou a necessidade em cerca de 800 estabelecimentos públicos. Mas o próprio conselheiro deixou claro na entrevista que, por ser um compromisso do edital, celebrado com o aval do TCU, não é simples mexer na destinação dos recursos e que os compromissos inicialmente previstos precisarão ser cumpridos. Moreira chamou a atenção, contudo, para a falta de detalhamento por parte do governo do que será essa rede privativa, o que faz desta a única obrigação acompanhada pelo Gaispi em estágio preliminar de implementação.

A sugestão de uma rede privativa do governo foi, na verdade, um caminho encontrado por técnicos do governo e da Anatel para demover   Bolsonaro da ideia de banir completamente os fornecedores chineses do leilão de 5G, o que teria impacto negativo para as operadoras que vencessem a licitação. Surgiu a ideia de criar uma "rede paralela", sem equipamentos chineses, que seria acessada pelo governo, e a partir dessa ideia veio o compromisso do edital. Nunca foi trazida, por parte das autoridades do governo Bolsonaro, nenhuma evidência de riscos ou vulnerabilidades que pudessem ser agravadas pelo uso de equipamentos chineses. Tampouco foi editada nenhuma medida objetiva que excluísse fabricantes chineses, especialmente a Huawei, da composição desta rede. A limitação viria apenas pela exigência de níveis de transparência de governança corporativa, nunca detalhados.

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De qualquer maneira, no final de 2022, a Telebrás ganhou a prerrogativa exclusiva de operar esta rede privativa governamental. Na semana passada, a estatal foi excluída da lista de empresas privatizáveis, mas o governo Lula ainda não indicou qual seu plano para a Telebrás. 

Os projetos alternativos que poderiam receber recursos do edital de 5G, e qual o montante, ainda não estão definidos, mas poderiam incluir políticas de educação conectada, saúde digital ou cidades inteligentes.

Conversa provocadora

A possibilidade de que o governo venha a utilizar os recursos do edital de 5G originalmente previstos para uma rede privativa em outros projetos teria ganho impulso a partir de uma conversa entre o ex-presidente da Anatel, Leonardo Euler, e o ministro Juscelino Filho, logo após a mudança de governo, na primeira semana de janeiro. Euler confirmou a este noticiário  que o assunto foi tratado na conversa com o ministro. Sem dar detalhes, o ex-presidente da Anatel disse que foi uma conversa de cortesia a pedido do ministro, que ouvia especialistas nos temas do setor para trocar impressões e ideias iniciais sobre a pasta. A ideia, contudo, havia sido previamente conversada com o presidente da Anatel, Carlos Baigorri, e posteriormente colocada ao então indicado para a secretaria de telecomunicações, Maximiliano Martinhão.

Segundo um especialista ouvido por este noticiário, o caminho para uma mudança na destinação dos recursos, por segurança jurídica, precisaria passar pelo TCU, mas pode surgir a partir de uma política pública que traga maior interesse público. A fonte lembra que o TCU nunca gostou da ideia da rede privativa e avaliou, inclusive, ainda na fase de discussão entre os técnicos da agência e do tribunal de contas, que a imposição dessa obrigação seria uma forma de terceirizar uma necessidade de investimento do próprio Executivo. Também houve questionamentos sobre a falta de detalhamento do projeto e mesmo sobre a falta de critério na definição dos valores. E, por fim, esta é a meta menos objetiva do edital, já que nunca chegou a ser apresentada como um projeto completo, como é o caso dos demais compromissos.

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