Dignas do nosso tempo as recentes reflexões sobre os impactos do uso indiscriminado da Inteligência Artificial. Interessante compreender as preocupações de mentes louváveis em suas áreas, como Bill Gates e Yuval Harari. Brasileiros notáveis também entraram na discussão, com pontos de vista igualmente enriquecedores. O destino dessa jornada permanece indefinido, mas não restam dúvidas que a IA vai pautar de forma grandiosa a forma com que o mundo se relaciona.
Tamanho protagonismo da tecnologia, a ponto de se questionar com seriedade o futuro da humanidade, joga luz ao enorme atraso do Brasil em seu processo de inclusão e letramento digital. Segundo dados da última Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios – PNAD Contínua, divulgado pelo IBGE, são 28 milhões de pessoas sem conectividade no país. Isso quer dizer que uma população equivalente à do Uruguai, Paraguai e Chile somadas sequer possui acesso à internet. Obviamente, a grande maioria dos excluídos se encontra camada mais vulnerável, que não possui renda para arcar com os custos relacionados.
É certo que houve grandes avanços na digitalização. Pesquisa do Sebrae aponta que o uso do celular já alcançou praticamente 100% dos micro e pequenos negócios do país e a internet é considerada vital para 94% dos empreendedores entrevistados. O Pix se tornou o principal meio de pagamento do mercado, aceito por 84% das empresas. Tudo isso torna o gap entre os participantes e os marginalizados da economia digital ainda mais sério.
O simples acesso à internet já configura um salto enorme para aqueles que não possuem canais eficientes de informação e conhecimento. A educação à distância é hoje uma realidade. Segundo último levantamento do Inep, a modalidade abriga mais de 60% dos matriculados no Ensino Superior. Após muito patinar, inclusive por entraves regulatórios, a telemedicina decolou. A Associação Saúde Digital Brasil estimou mais de 30 milhões de teleconsultas em 2022.
Ao dar um passo adiante e prover, além do acesso, o letramento digital, abre-se um enorme leque de oportunidades. Para que isso aconteça de forma eficiente, no entanto, é preciso que o processo faça parte de um projeto estruturado de educação, que envolva programas de ensino, preparação do corpo docente e adaptações de infraestrutura em escolas, por exemplo. O certo é que a capacitação para uma participação efetiva na nova economia se configura hoje como uma das ferramentas mais poderosas no combate à desigualdade social. Esse tema será discutido em profundidade durante o Painel Telebrasil Innovation, no dia 14 de junho, em São Paulo.
Fica cada vez mais claro que a conectividade precisa ser protagonista e estar no centro de uma concepção de Estado – e não apenas de governo. O Brasil carece de políticas públicas e econômicas que favoreçam a inclusão e a prosperidade digital, sobretudo devido à renda média baixa de sua população. Se medidas nesse sentido não forem tomadas com celeridade, o abismo entre as discussões sobre tecnologias de ponta e a realidade da maioria das pessoas se tornará cada vez maior. Em um exemplo hipotético exagerado, se a Inteligência Artificial acabar de fato com o mundo, há o risco de muitos brasileiros nem saberem as razões.
*Sobre o autor: Marcos Ferrari é presidente-executivo da Conexis Brasil Digital. As opiniões expressas nesse artigo não necessariamente representam a opinião de TELETIME.