Na ressaca do NetMundial, neutralidade ainda é centro de debate

Considerado como um evento "pré-IGF" (Fórum de Governança da Internet, que acontecerá em setembro, na Turquia), o quarto Fórum de Internet do Brasil, promovido pelo Comitê Gestor da Internet (CGI.br) nesta sexta-feira, 25, em São Paulo, mostrou uma dicotomia: destacou a aprovação do Marco Civil , mas remoeu os resultados do NetMundial, evento multissetorial encerrado na quinta-feira. A sensação era de ressaca moral após uma exaustiva maratona de debates e contribuições, que resultaram em um texto final com gosto amargo pela quase ausência total do tema neutralidade de rede.

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"Embora tenham havido questões por parte da sociedade civil, sem dúvida (o NetMundial) é um processo que precisa ser levado adiante", declarou a pesquisadora do Instituto Brasileiro de Defesa ao Consumidor (Idec) e membro do CGI.br, Veridiana Alimonti. O presidente do Conselho Executivo de Alto Nível do evento desta semana, Virgílio Almeida, também ressaltou a conquista de um resultado pelo processo multissetorial, ainda que sem consenso.

Mas o tema da neutralidade continuou dominando o Fórum de Internet do Brasil. Com elogios à abordagem do tema no Marco Civil, como foi o caso do membro do CGI.br, José Luiz Ribeiro Filho, que destacou que "a neutralidade assegura a todos a possibilidade de inovar, trazer para a rede novos aplicativos, ideias e conceitos, que de outra forma estariam bloqueados pelos intermediários que operam a estrutura da rede"; ou com a frustração com o NetMundial, como foi o sentimento da pesquisadora acadêmica da WZB/HIIG em Berlin, Jeaninne Hoffman.

A frustração é com a decisão das deliberações do Comitê Multissetorial de Alto Nível na noite da quinta-feira, que acabou deixando a neutralidade de lado e ignorando o apelo de uma significativa parte das contribuições dos últimos dois dias. "Aquela última hora do encontro descreditou um processo que foi tão maravilhoso; e isso foi horroroso", diz. "Eu estava envolvida na negociação e, no momento, eu defendo o processo. Mas todos os meus amigos da sociedade  civil não se levantaram quando toda a plateia aplaudia de pé (durante a cerimônia final do evento), e foi muito difícil ver isso", declarou.

Europa conservadora

Grande parte da oposição à inclusão da definição do termo nos princípios no documento final do NetMundial veio do governo dos Estados Unidos, do setor privado (com representantes de operadoras) e com a União Europeia. "A Comissão Europeia deu meia volta, pois costumava defender a neutralidade, e agora não mais", disse, Jeaninne Joffman. "A Neelie (Kroes, vice-presidente da Comissão) prometeu que a regulação da Agenda Digital teria o termo, mas, nos últimos anos, mudou. Não sei por que, talvez por causa de lobby, mas não espero mais por isso."

O argumento da Comissão Europeia é que o tema deveria ser discutido regionalmente, e não sem uma definição mais consensual e com mais discussão. Economicamente, a razão é que há forte pressão de operadoras, que precisam investir em infraestrutura para atender a uma demanda exponencial e não querem se tornar meros "tubos". Além disso, há o problema das incumbents, que compartilham infraestrutura de rede com provedores menores. A pesquisadora diz que no caso alemão, o órgão regulador é composto por pessoas anteriormente ligadas às grandes operadoras, e que isso desbalancearia suas decisões. "Por isso que a Alemanha precisa de chances para a boa regulação da neutralidade de rede", diz.

Por outro lado, na Holanda, que conta com regulação de neutralidade, "tem efeitos interessantes", que permitem diferentes modelos. "Lá você paga dados e isso inclui voz, porque as operadoras não podem mais bloquear (as chamadas por IP). Isso é uma vantagem para usuários, mas não sabemos ainda o que isso significa em longo prazo para o preço dos serviços."

 

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