A pandemia do coronavírus (covid-19) ainda traz incertezas sobre o futuro, mas o mercado de telecomunicações já entende que a percepção da sociedade, de empresas e dos governos mudou. Os serviços de conexão à Internet agora são essenciais e movem toda a indústria e capacidade produtiva, ainda que na América Latina, a desigualdade digital coloque desafios para fechar esse gargalo. Agora, é necessário que as políticas públicas passem a ser transversais entre diferentes setores para além das operadoras.
"Os países com melhores políticas de conectividade ficaram mais resilientes com a quarentena", analisa o diretor de políticas públicas da GSMA Latam, Lucas Gallitto, durante evento online do site DPL News nesta quinta, 14. Por isso, justifica, é necessário políticas de Estado para endereçar a conectividade. "Temos que ter um marco regulatório de políticas públicas com flexibilidade suficiente para ser aplicado a todos os níveis do governo, não só o Executivo nacional", sugere. A intenção é um "alinhamento" dessas políticas, para que o foco do governo seja no aumento da conectividade, e não da arrecadação.
Como exemplo de políticas que precisam ser mudadas, Gallitto destaca os leilões de espectro, argumentando ser necessário uma política mais racional de precificação. E diz que é preciso que o setor de telecomunicações atue junto aos governos neste momento em que as telecomunicações são centrais. "Temos que ir no Executivo e Legislativo, temos que evangelizar o Congresso expondo as coisas pelas quais a indústria passa, precisamos sensibilizá-los."
O diretor da GSMA destaca que a associação de operadoras móveis está trabalhando em um plano de ação em conjunto com o Banco Mundial, Fórum Econômico Mundial (WEF) e a União Internacional de Telecomunicações (UIT) e países para sustentar a conectividade. A ação foi apresentada no final de abril e tem como objetivo servir de guia de melhores práticas para autoridades durante a situação de emergência.
Desafios
"Sim, os investimentos têm de vir de todos os setores da economia, não apenas de empresas de telecomunicações", coloca o diretor executivo da CRC da Colômbia, Carlos Lugo. Ele sugere a implantação de projetos no modelo sandbox, com autorregulação no setor, mas também diálogo com outras frentes, como as over-the-top (OTTs).
O secretário executivo adjunto da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), Mario Cimoli, lembra que essa abordagem deve incluir a preocupação com a desigualdade digital, que ainda é forte na região. Para ele, neste momento é mais necessário do que nunca abordar o assunto. "É uma aliança público-privada, mas também é parte do pacto social."
Pós-pandemia
Por sua vez, o coordenador de agenda digital do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), Mauricio Agudelo, avalia que as pequenas empresas são mais de 90% do total na América Latina, e muitas trazem problema da informalidade. Por isso, prevê um desafio com o setor empresarial para permitir o provisionamento e distribuir serviços de telecomunicações. "As tecnologias emergentes e as infraestrutura que garantem a automatização e robotização que habilitam a indústria 4.0, em maioria, é um tema incipiente na região. As brechas são significativas aqui".
Agudelo tem uma visão já para o cenário pós-covid. "Vamos começar a ver uma abundância de políticas pró-digitais. Quando se aposta em acelerar a infraestrutura, em nível nacional e regional, haverá um desafio importante em como essas políticas públicas vão reduzir a desigualdade digital", diz.
Secretária geral da Associação Interamericana de Empresas de Telecomunicações (Asiet), Maryleana Méndez diz que é necessário uma mudança de paradigma na região, com governo e sociedade reconhecendo a essencialidade dos serviços. "Já transcende para um assunto de Estado mais amplo, impulsionando educação, produção e a economia", afirma. "É uma das alavancas fundamentais para a economia pós-pandemia. Há necessidade que os países latino-americanos tenham uma agenda digital transversal realista. Não é só um requisito (…), é algo indispensável", conclui.