O sinal positivo dado pela Anatel de que pretende reduzir paulatinamente a tarifa de interconexão da rede móvel tem provocado reações ainda reticentes das empresas. A agência promoveu nesta quarta-feira, 3, uma audiência pública para debater a proposta de fixar uma taxa de queda da tarifa cobrada entre as ligações fixas e móveis, o Valor de Comunicação (VC), para os próximos dois anos com impacto direto no Valor de Uso Móvel (VU-M), cobrado para o acesso às redes móveis. E operadoras tanto fixas quanto móveis, separadas historicamente pelas divergências quanto à VU-M, concordaram que a Anatel precisa aprimorar a proposta, mas divergem da forma de fazê-lo.
A proposta da agência é pré-fixar uma taxa de queda de 10% sobre o VC. Esse percentual funcionará como Fator X nos reajustes destas tarifas, ou seja, como amortizador da inflação do período apurado. A VU-M, principal componente da tarifa entre fixos e móveis, continuará sendo livremente pactuada entre as empresas. Mas caso não haja consenso entre elas, a agência propõe uma regra para a arbitragem: a transferência de até 85% da queda fixada (10%) do VC para o valor da interconexão.
Segundo o gerente-geral de Competição da Anatel, José Gonçalves Neto, o foco da agência é preparar o setor para uma "convergência das tarifas móvel e fixa", daí a necessidade de reduzir progressivamente a VU-M. A proposta original da área técnica era ainda mais agressiva com relação ao percentual de queda, propondo um fator X de 20% no VC. Vale lembrar que a queda será parcialmente absorvida pela inflação acumulada no período. A projeção da agência é que, se o Índice do Serviço de Telecomunicações (IST) mantiver-se na casa dos 5%, a queda real na tarifa será de 5,5%.
As fixas, em princípio as maiores beneficiárias de uma redução da VU-M, não receberam tão bem quanto se esperava a proposta feita pela agência. Primeiro porque esperavam quedas maiores do valor de interconexão. Depois, por conta da regra de transferência de somente 85% da queda do VC para a VU-M. Para a Oi, principal defensora da queda na interconexão móvel, esse mecanismo faz com que as fixas acabem perdendo parte de seu lucro na tarifa.
"Se eu não repasso isso integralmente, o que vai acontecer é que vai se reduzir o VC na margem (de lucro)", afirmou com preocupação José Carlos Pico, representante da concessionária na audiência.
A defesa da transferência integral da redução do VC para a VU-M é corroborada pela LCA Consultores. Para a consultoria, o setor de telefonia móvel é capaz de suportar quedas até maiores do que a proposta pela Anatel pois há a perspectiva de aumento de tráfego na rede com uma redução do preço final das chamadas. A LCA também frisou que a redução da arrecadação da VU-M não tem impacto nocivo nos telefones pré-pagos, já que os recursos dessa tarifa são majoritariamente investidos em subsídios a planos pós-pagos.
Uma das grandes preocupações da GVT é que a medida, da maneira com que está sendo proposta, acabe aumentando a tensão entre fixas e móveis. Para o vice-presidente de Assuntos Institucionais da empresa, Carlos Alberto Nunes, há o risco de que o número de pedidos de arbitragem aumente. Há cinco anos a GVT trava uma briga com a Vivo por conta do reajuste da VU-M tanto na Justiça quanto na Anatel. Até hoje, o assunto não foi resolvido em nenhuma das duas instâncias.
Móveis descontentes
Como já era de se esperar, as móveis também não estão nada felizes com a decisão da agência. Dois pontos preocupam particularmente as operadoras. O primeiro é a ausência de mecanismos de compensação das perdas financeiras que esse segmento terá com a queda da VU-M. A segunda é a falta de parâmetros inequívocos de que essa redução não terá efeito nocivo no setor. Esses parâmetros viriam de um modelo de custos, caso ele já estivesse implantado.
A representante da Vivo na audiência, Kátia Pedroso, chegou a questionar o quê a Anatel fará se o modelo de custos, quando for implantado em 2012, mostrar que o caminho escolhido pela agência não era eficaz. Os representantes da agência não chegaram a responder objetivamente este questionamento. Disseram apenas que a reforma é exatamente um processo de "transição" até que o modelo de custos seja implementado. E lembrou que a mudança é apenas no VC, "e não na VU-M". "Não estamos mexendo no modelo de remuneração de rede", afirmou o gerente de Regulamentação de Serviços Móveis, Nilo Pasquali.
A TIM alertou para o tamanho da perda gerada por uma redução na VU-M. Segundo o representante da operadora, Carlos Franco, o segmento móvel fatura hoje R$ 17,7 bilhões apenas com a interconexão. Assim, uma queda linear de 10% representaria perdas de R$ 1,7 bilhão para este ramo das telecomunicações. "33% das receitas das móveis vêm da VU-M", ressaltou. Para Franco, a agência precisa trabalhar em outras reformas para reduzir os custos das móveis se quiser promover uma queda no valor de interconexão sem prejudicar o setor.
A proposta defendida pela empresa é que a agência trabalhe o assunto conjuntamente com a reforma dos valores da Exploração Industrial de Linha Dedicada (EILD) e com o novo Plano Geral de Metas de Competição. "As próprias análises da Anatel já mostram a necessidade desses assuntos serem tratados de forma conjugada", afirmou representante da TIM, citando os votos dos conselheiros Antônio Bedran, Emília Ribeiro e Jarbas Valente.
A mudança no Regulamento dos Valores de Comunicação ficará em consulta pública até o dia 12 de novembro. Até lá, os interessados podem enviar contribuições ao texto pelo sistema interativo de consultas públicas disponível no site da agência na Internet.