Radiodifusores das Américas preparam posicionamento regional na disputa com empresas de Internet

Paulo Tonet Camargo, presidente da Abert e VP de relações institucionais do Grupo Globo - Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Não é segredo que as empresas de radiodifusão estão fortemente engajadas em conseguir das big techs o pagamento de uma remuneração que consideram justa pelo uso dos conteúdos jornalísticos profissionais nas plataformas de busca e nas redes sociais. Esta batalha, que acontece em vários países do mundo, no Brasil se manifesta sobretudo no PL 2.630/2021, que trata do tema da desinformação. Mas deve se tornar uma batalha regional. A Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), agora sob a gestão de Paulo Tonet, vice-presidente de assuntos institucionais e regulatórios da Globo, que assumiu o comando da entidade em outubro, pretende pautar o tema nos principais encontros setoriais e assumir uma posição pública em defesa da remuneração do conteúdo e de um ambiente mais assimétrico com as empresas de Internet.

A AIR é uma entidade tradicional. Ela surgiu logo após a Segunda Guerra, em 1945, como representante das rádios e emissoras de TVs das Américas com foco na defesa da liberdade de expressão, como um fórum de padronização e também como um ambiente de debate de temas político-regulatórios das rádis e TV da região. Surgiu como uma associação intermaricana, tornou-se global mas hoje voltou a ter um foco nas três américas, ainda que mantenha o internacional no nome.

Liberdade e combate a assimetrias

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"A prioridade da nossa gestão será, de um lado, a defesa que a AIR sempre teve de defesa incondicional da liberdade de expressão, de informação, de criação e da imprensa livre. Essa sempre foi a nossa bandeira e continuará sendo, principalmente em um momento em que vemos tantos movimentos anti-democráticos na América Latina", diz Tonet.

"Mas do outro lado não podemos deixar para trás umas das questões mais importantes que existem hoje para as empresas de comunicação, que é assegurar que o conteúdo produzido seja remunerado pelas novas plataformas de Internet". Para o vice-presidnete da Globo e presidente da AIR, Paulo Tonet, "a atuação desses players, que se valem do mercado publicitário, com a ausência de controle editorial, cria uma assimetria regulatória que inviabiliza a competição saudável com as empresas de mídia".

Segundo Tonet, os grupos técnicos da associação estão trabalhando em um documento, que deve ser finalizado até o final do ano. "Finalizada esta etapa, pretendo convocar uma reunião extraordinária, que será realizada durante a NAB Show (principal evento de radiodifusores dos EUA) em que pretendemos aprovar uma sugestão de base para a legislação de plataformas digitais nas Américas. Será um documento de referência que vai se basear em princípios, como responsabilidade e transparência na questão da publicidade. Não podemos deixar que as plataformas de Internet trafeguem publicidade paga sobre atos anti-democráticos, como aconteceu no 8 de janeiro, por exemplo".

Outro problema a ser endereçado: segundo Tonet, as empresas de Internet não se submetem ao modelo de auto-regulação que os grupos de comunicação utilizam no Brasil. "Aqui no Brasil, uma decisão do Conar (conselho de auto-regulação publicitária) é acatada imediatamente por qualquer um de nós, mas não pelas big techs. Não pode ser assim, é preciso que haja princípios claros", diz ele.

Remuneração de conteúdo

"E o terceiro pilar do documento é a remuneração do conteúdo utilizado, o que está avançado em outros países mas, aqui, eles (as empresas de Internet) fingem que não é com eles. Eu acho que as empresas de Internet deveriam se antecipar a uma regulação pelo Congresso, porque ela virá e será muito mais difícil negociar depois disto".

Para o presidente da AIR, é possível fazer uma proposta: "basta ver o que as empresas de Internet toparam pagar na Austrária, fazer uma regra de três para projetar o mercado brasileiro e está definido". Segundo Tonet, a AIR deverá se dedicar muito a esse tema. Mas ele reconhece que o tema da remuneração de conteúdo e assimetrias enfrenta um pouco mais de complexidade para ser debatido nos EUA, dado o fato de que as empresas de Internet serem, predominantemente, norte-americanas. Contudo, Tonet destaca que a votação do documento durante a NAB, em Las Vegas, o que terá justamente o condão de envolver o mercado de radiodifusão dos EUA no debate.

Outro tema que está no radar dos radiodifusores na região das Américas é a TV 3.0. "Estamos muito atentos a essa questão tecnológica para a sobrevivência da radiodifusão. Participamos de todos os organismos internacionais, como UIT, Citel, OEA… E entendemos que a evolução tecnológica está intimamente ligada ao que o Brasil decidir. Hoje estamos tratando de engenharia, modelos de negócio e desenvolvimento tecnológico, onde estamos relacionados a novos setores, e essa discussão que a AIR já tem deve ser aproveitada por muitos países nos seus processos internos. Destaco que o Brasil é líder nessa questão e tem muito a contribuir com a experiência global de evolução do broadcast", diz Tonet.". 

Tonet se mostra preocupado, por outro lado, com o momento político no mundo, e as consequências para o pilar da liberdade de expressão. "Eu assumo em um momento em que temos problemas sérios: muitos países estão enfrentando ameaças reais à liberdade de imprensa. Na Nicarágua, por exemplo, um radiodifusores associados foi literalmente bombardeado e seu sócio teve o registro de nascimento cancelado. Temos que fazer um trabalho forte de condenar e denunciar esses abusos. Estamos alinhados com as entidades internacionais de jornalistas, com a Unesco, com a OEA e estamos atuando internacionalmente nessa frente. Na Guatemala temos problemas, na Venezuela… É preciso defender enfaticamente a liberdade de expressão, mas com responsabilidade. Ou seja, não pode ser uma terra sem lei, como querem as empresas de Internet, aparentemente", diz o executivo. 

 

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