Zero rating e neutralidade não se misturam, defende entidade de Internet

Evento sobre conscientização do consumidor, realizado pela Anatel e UIT em Brasília

Em evento realizado pela Anatel e UIT nesta terça, 18, em Brasília, para discutir mecanismos de conscientização dos consumidores, um dos temas abordados foi a relevância de mecanismos como "neutralidade de rede" e "zero rating" para as relações de consumo em telecomunicações. Zero rating é a prática das operadoras de telecomunicações de distribuição de conteúdos sem o consumo das franquias de dados, o que poderia, em tese, ser caracterizado como um tratamento privilegiado e não isonômico em relação a outros conteúdos, ferindo, portanto, as regras de neutralidade.

Para Sérgio Alves, gerente de políticas públicas da Associação Latino-Americana de Internet (ALAI), são duas questões diferentes. O princípio da neutralidade antecede o Marco Civil, pois é inerente ao funcionamento da Internet e à forma como dados e serviços se desenvolveram. "Para nós a aderência a este princípio é importante porque isso promove inovação, viabiliza competição e tem viabilizado o acesso e informações e surgimento de negócios", disse ele, cuja entidade representa empresas do setor de Internet que atuam na América Latina.

Ele respondia a um questionamento de Artur Coimbra, conselheiro da Anatel e coordenador do debate, sobre eventuais vantagens que poderiam ser dadas ao consumidor em modelos não-neutros de oferta de serviços, como por exemplo a possibilidade de qualidade de serviço assegurada ou a gratuidade. 

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Mas para a ALAI a questão da neutralidade não se confunde com o o zero rating. Segundo Sérgio Alves, "ao longo dos anos, com evolução de serviços e modelos de negócio, existem gradações de neutralidade, com o zero rating, sponsored data e conexão paga, que não entram em conflito com o conceito de neutralidade de rede", diz. Para ele, o ponto que garante a neutralidade é que esses modelos não impedem nem fecham o mercado ao surgimento de negócios. Ele considera que também haverá um debate sobre a evolução da "interpretação sobre mecanismos razoáveis de gestão de tráfego" e que essas variações nos modelos "têm sido testado de tempos em tempos com as soluções de mercado, e (até aqui) tem se confirmado a aderência ao Marco Civil e que promovem o que a neutralidade indica e impedindo a verticalização de infraestrutura". 

Segundo Alves, a  ALAI não apoia intervenções regulatórias que transfiram custos ao consumidor. "Entendemos que o zero rating, além de plenamente legal, tem tido um saldo positivo para o consumidor acessar a internet. É tão benéfico que existem demandas públicas que querem participar desse modelo para a população brasileira".

Segundo ele, há um critério para assegurar a neutralidade: modelos voluntários e não-exclusivos. Para ele, o Brasil tem desafio de conectividade significativa e o zero rating tem prestado utilidade, "porque a nossa realidade é diferente de outros mercados".  Ainda na visão da associação, "podemos revisitar alguns conceitos, mas tem que ser benéfico para todos".

Modelos sustentáveis

Já a Secretaria Nacional de Direitos do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública tem uma visão mais cautelosa. Para Vitor Hugo Ferreira, diretor do departamento de proteção e defesa do consumidor, ainda é difícil dar uma resposta objetiva se o zero rating é nocivo ou não. "Nossa gestão foi demandada em relação a este tema para estudo e acompanhamento. Temos isso no nosso radar, temos apontamentos que encaminham para prejuízo aos consumidores, mas também há benefícios. É um tema bastante delicado da nossa ordem, e por isso precisa de uma governança colaborativa. Precisamos de instituições que possam criar um instrumento e diálogo com o consumidor", diz ele. 

Para Márcio Carvalho, diretor de marketing da Claro, a tendência é que os modelos de distribuição de aplicativos de maneira gratuita ao consumidor sejam revistos à medida que muda o perfil de tráfego e as relações comerciais. "Hoje um consumidor de 5G consome quatro vezes mais tráfego do que um consumidor de 4G, e os aplicativos que antes tinham um determinado impacto para a rede hoje tem outro impacto, por isso estamos revendo as políticas de zero rating", diz.

Ele indica que por trás dos acordos de zero rating existe um acordo com as empresas de Internet, "que precisa fazer sentido para os dois lados", sem especificar se existe ou não pagamento nos acordos que preveem a inclusão de aplicativos que não consomem dados da franquia. "Começamos o movimento definindo franquias específicas nos novos planos controle, mas a tendência é tirar a gratuidade quando não fizer sentido". 

Ao ser questionado se as operadoras teriam a disposição de conceder zero rating para aplicações de governo, por exemplo, Márcio Carvalho lembrou que qualquer tráfego tem um custo de operação e investimento na rede. "No Rio Grande do Sul, por exemplo, concedemos crédito grátis para a população afetada. Ali era uma questão de vida ou morte assegurar a conectividade e era uma situação de emergência que mobilizou a todos, como foi na pandemia. Mas uma prática de zero rating para serviços públicos precisa estar pensada dentro de políticas públicas, como os recursos do Fust", diz.

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