Novo PGMC deverá estender assimetrias da banda larga fixa ao SMP

A revisão do Plano Geral de Metas de Competição – PGMC pela Anatel, que está sob análise de seu competente conselheiro Vicente Aquino, assumido defensor da competitividade dos prestadores de pequeno porte – PPPs nos serviços de telecomunicações, deve entrar em consulta pública ainda em 2023 por deliberação do Conselho Diretor da Agência. O PGMC é o instrumento por excelência adotado pelo órgão regulador para promover o fortalecimento da competitividade dos PPPs no serviço de banda larga fixa. Em grande parte, graças a sua existência, desde 2012, e atualização, em 2018, o Brasil hoje conta com o maior número de provedores de internet do mundo, com muito mais oferta, muito mais qualidade e preços incomparavelmente mais em conta para o consumidor. A participação dos aproximados 20 mil PPPs[i] no mercado já atende quase 25 milhões dos mais de 46 milhões de assinantes de banda larga fixa no Brasil. Em síntese, o Brasil pode se orgulhar de ter o mais competitivo e desconcentrado mercado de banda larga fixa do planeta. Para se ter uma noção disso, o Brasil supera os EUA em quase 15 vezes o número de provedores por milhão de assinantes como pode ser visto no gráfico abaixo.  E o PGMC tem tudo a ver com isso.

Fonte: Dados da Anatel e da Federal Communications Commission (FCC) compilados pela AD Advisors, disponíveis em https://dados.gov.br/dados/conjuntos-dados/prestadoras-banda-larga-fixa, https://informacoes.anatel.gov.br/paineis/acessos, https://broadbandmap.fcc.gov/data-download/nationwide-data?version=dec2022 e https://www.fcc.gov/internet-access-services-reports

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Tive a honra de ser o relator, antes e após a consulta pública, da primeira revisão do PGMC, aquela que trouxe à luz o conceito de PPP, como sendo todo prestador com até 5% de participação no mercado em qualquer serviço de telecomunicações, produzindo uma efetiva assimetria regulatória. Antes, o provedor que atingia 50 mil assinantes era automaticamente submetido à regulação própria dos grandes e forçado a suportar custos elevados para cumprimento de obrigações de qualidade e atendimento, o que limitava a expansão de suas operações. Depois da alteração no conceito, praticamente acabou a subnotificação de dados à Anatel, usada como forma de esquivar-se dos pesados encargos aplicados aos grandes provedores e, devido a isso, hoje temos PPPs com até 1,5 milhão de assinantes que permanecem em pleno crescimento. 

Sou extremamente grato aos colegas que comigo integravam o colegiado à época: Juarez Quadros na presidência, Otávio Rodrigues, Emmanoel Campelo e Leonardo Euler de Morais, porque, mesmo diante de pequenas divergências, atenderam ao meu apelo e votaram por unanimidade pela aprovação do relatório que apresentei. Também sou muito grato ao atual presidente da Anatel, conselheiro Carlos Baigorri, técnico da mais elevada competência, que na época nos deu total suporte como superintendente de competição e depois como superintendente executivo, mobilizando toda equipe técnica para atender às inúmeras diligências que demandamos.

A propósito, o presidente Carlos Baigorri é um profundo conhecedor da matéria desde sua concepção enquanto instrumento pró-competitividade, e por isso confere tanto valor às assimetrias e ao conceito de PPP trazidos pelo PGMC.

A história do PGMC, que é um processo ainda em construção, pode ser contada até aqui em três capítulos. No primeiro, que trata do surgimento do PGMC lá em 2012, o foco eram as redes fixas de tecnologia legada, composta por unbundling, transporte local e de longa distância; infraestrutura e roaming; feriado regulatório, exigência de transparência com a implantação do GIESB, ofertas de referência com base no retail minus e a obrigação de troca de tráfego em pontos de troca de tráfego – PTTs indicados pela Anatel, que reduziu muito o custo para as prestadoras. Essas medidas cumpriram papel relevantíssimo para a competitividade uma década atrás.

No segundo capítulo, vivido entre 2016 e a aprovação da Resolução nº 694/2018, o foco já eram os links de internet com rede de acesso e transporte de dados em alta velocidade, além das interconexões fixas e móveis. Também entrou em pauta a modulação da regulação, com a divisão dos municípios em categorias para a dosagem das medidas assimétricas e as ofertas de referência evoluíram para os modelos de custos LRIC + bottom up para EILD e interconexão, e FAC HCA top down para transportes de dados em alta velocidade, roaming e outros mercados.

Também compõe o segundo capítulo dessa bem-sucedida história a mais ousada entre as decisões assimétricas da Anatel, que foi a definição de PPP como sendo todo prestador com até 5% de participação em qualquer serviço no mercado de telecomunicações e, junto com essa definição, a retirada de custos regulatórios de qualidade e atendimento ao consumidor.

E agora é iniciada a escrita do terceiro capítulo dessa história. O PGMC subiu ao conselho diretor da Anatel para sua segunda revisão, e o conselheiro Vicente Aquino foi sorteado para analisar o informe que veio da área técnica e apresentar seu voto em forma de relatório. Há grande expectativa entre os pequenos no sentido de que todas as assimetrias estabelecidas até aqui sejam protegidas, para consolidar cada vez mais a competição na banda larga fixa, exceto eventuais questões superadas. A torcida também é grande para que o esforço da Anatel que resultou no sucesso da banda larga fixa até aqui seja empreendido para assegurar maior competitividade no serviço móvel, hoje concentrado nas gigantes Tim, Vivo e Claro. A receita proposta é simples: manter o que está dando certo e produzindo bons resultados e adotar medidas pró-competitividade voltadas para o serviço móvel, calibrando remédios do PGMC para as falhas do mercado móvel.

No entendimento da área técnica, o que já existe e merece ser mantido são a Exploração Industrial de Linhas Dedicadas – EILD para fins de interconexão e com transparência de preços; o transporte e interconexão de dados em alta capacidade, com atualização da velocidade e também com transparência de preços; a interconexão fixa e móvel para manter o controle de preços; o roaming para manter o controle de preços e assegurar a efetividade do remédio da venda da Oi Móvel; e a infraestrutura passiva, particularmente a infraestrutura de postes, para manter o controle de preços não discriminatórios e a transparência.

No que diz respeito à grande novidade que merece constar do novo PGMC, está a oferta de atacado de exploração industrial de radiofrequência para criar o mercado secundário de espectro de dimensão geográfica nacional obrigatório para as gigantes Claro, Tim e Vivo. A bem do interesse público e em respeito ao princípio do uso eficiente do espectro, toda faixa que estiver sendo subutilizada em qualquer localidade deve ser disponibilizada a preço justo para os interessados em mercado secundário. O PGMC também terá como novidade a oferta para operação virtual de serviço móvel pessoal – SMP através das MVNOs obrigatória para Tim, Vivo e Claro em dimensão geográfica nacional. Isso deve ir além do caráter transitório dos remédios estabelecidos para a venda da Oi Móvel, de modo a permitir que as operadoras virtuais forneçam a seus clientes serviços de voz, dados e SMS, inclusive para dispositivos M2M/IoT sem qualquer restrição. O PGMC também deve contemplar a realidade das redes neutras, uma novidade importante na oferta de infraestrutura no atacado para impulsionar ainda mais a competitividade.

Em síntese, com todo amor que sinto por esta linda criança que é o PGMC, em vias de já entrar em sua adolescência, manifesto de público meu total interesse em que, nesse terceiro capítulo que está tempestivamente sendo escrito pelo conselho diretor da Anatel, seu espírito pró-competitividade seja plenamente preservado. A começar pela defesa expressa da manutenção do conceito de PPP, como está na resolução em vigor, para que não fiquemos expostos a futuras interpretações alargadas que venham a ameaçá-lo. 

Por tudo o que tenho aprendido na relação com prestadores de pequeno porte de todas as regiões do Brasil, posso afirmar que eles estão prontos para dar uma resposta positiva tanto na expansão da banda larga fixa quanto na oferta de serviço móvel. A aquisição de todos os blocos regionais na faixa de 3.5 GHz no leilão do 5G e todos os compromissos assumidos não deixam dúvidas quanto a isso.

E a melhor forma da Anatel contribuir com o sucesso das políticas públicas para levar conectividade significativa ao maior número de brasileiros em todas as regiões do país é aprofundar as assimetrias regulatórias para que o mesmo sucesso conquistado na banda larga fixa seja estendido ao serviço móvel. Quando houver competição saudável no serviço móvel como existe hoje na banda larga fixa, o consumidor brasileiro terá mais opções de escolha e poderá exigir muito mais qualidade. E o grande instrumento para isso é sem dúvida o PGMC, que tem por princípio o fortalecimento da competição e cuja atualização tem tudo para aprofundar os avanços até aqui conquistados. 

*Sobre o Autor – Aníbal Diniz, 60, Advogado (OAB-DF), é consultor da Associação NEO pela AD Advisors desde junho de 2020. Graduado em História pela UFAC, atuou no jornalismo (1984 – 1992), foi assessor de comunicação da Prefeitura de Rio Branco (1993-1996), secretário de comunicação do Governo do Acre (1999-2010), senador da República PT-AC (Dez. 2010 – Jan. 2015) e conselheiro da Anatel (out. 2015 – nov. 2019). As opiniões expressas nesse artigo não necessariamente representam o ponto de vista de TELETIME.

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[i] números obtidos e analisados a partir de banco de dados da Anatel disponível em https://dados.gov.br/dados/conjuntos-dados/prestadoras-banda-larga-fixa , acessado em 13/10/2023

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