Receita de telecom não acompanha aumento da demanda, diz estudo da UnB

Imagem: Freepik

A receita dos operadores de serviços de telecomunicações não está acompanhando o crescimento da demanda de uso da infraestrutura de rede. Essa foi a conclusão de um estudo realizado pela Universidade de Brasília (UnB) sobre desafios regulatórios do ecossistema digital.

O material faz parte de uma série de seis estudos encomendados pela Anatel à instituição, cujos trabalhos foram iniciados em 2022. Nesta segunda-feira, 1º, o relatório final sobre o trabalho focado no avanço das plataformas, aplicativos e serviços digitais sobre serviços convencionais foi divulgado pela agência reguladora.

De acordo com o estudo, o crescimento contínuo da demanda por infraestrutura tem como pano de fundo a ascensão dos serviços over-the-top (OTT), como plataformas de vídeo, áudio e outros conteúdos a partir da Internet. O estudo recorda que cada vez mais os usuários utilizam OTTs para realizar chamadas de voz e vídeo, por exemplo.

Notícias relacionadas

A consequência disso é a redução do uso dos serviços tradicionais de telefonia móvel, o que impacta diretamente na receita das operadoras, "mesmo com aumento significativo do tráfego de dados em decorrência da evolução e do uso dos serviços OTT", aponta o relatório.

Para exemplificar essa disparidade apontada entre a evolução da receita média por usuário entre big techs e operadoras de telecomunicações, o relatório usou como exemplo o Facebook (empresa da Meta). Esse caso foi abordado em outro estudo da Universidade de Anglia Ruskin (ARU Cambridge), que foi utilizado como uma das referências bibliográficas para a confecção do relatório. Veja a comparação das receitas médias abaixo: 

Imagem: Reprodução/CCom UnB

"É bom lembrar que boa parte dos usuários do Facebook acessa a plataforma digital por meio dos serviços de conectividade das prestadoras de serviços de telecomunicações. Ou seja, enquanto o valor da aplicação over-the-top cresceu no período analisado, o valor da conectividade foi reduzido, em um cenário em que as prestadoras de serviços de telecomunicações ainda foram penalizadas pela redução de receitas em seus serviços convencionais", diz o estudo da UnB.

Olhando para o futuro, o relatório também apostou em um acirramento da tendência. "Com relação às receitas anuais das prestadoras de serviços de telecomunicações de serviços móveis, entre 2022 e 2030 estima-se, em relatório elaborado pela GSMA, que essas receitas evoluam de US$ 1,07 tri para US$ 1,20 tri, ou seja, uma evolução de somente 12,15%".

Em paralelo, há uma evolução esperada de 16,7% tanto na quantidade de novos acessos quanto na de novos usuários móveis, de 21% no percentual desses acessos por meio de smartphone e de 25% na quantidade de usuários com acesso à Internet. "Ou seja, a receita não está acompanhando o crescimento da demanda de uso da infraestrutura", apontou o estudo da UnB/Anatel.

"Desse modo, existe um grande desafio para todo o ecossistema digital: como manter a contínua evolução das redes de comunicação das prestadoras de serviços de telecomunicações de forma a atender à evolução de aplicações OTT em um cenário em que as receitas destas não alimentam de forma clara as receitas das prestadoras de serviços de telecomunicações necessárias aos devidos investimentos em suas redes", questiona o relatório.

Potencial de receitas

Apesar da receita das prestadoras de telecomunicações não ter crescido no mesmo ritmo que a receita dos serviços over-the-top, o estudo fez algumas ponderações. A principal é de que o faturamento que as operadoras conseguiram até o momento com os clientes garantiu um processo evolutivo "crescente" das infraestruturas de rede

Além disso, o relatório da UnB afirma que as prestadoras de serviços de telecomunicações devem se adaptar ao ecossistema competitivo atual e buscar novas fontes de receitas e estratégias.

De acordo com o estudo, as projeções de volumes de tráfego de dados e assinantes são otimistas e contam com grande potencial de receita. "Cabe as prestadoras de serviços de telecomunicações saberem converter as projeções em receitas", diz o relatório.

"O Brasil em escala global apresenta um volume de usuários altamente representativo em relação a outras regiões do mundo, além do ter o potencial de ser um ator relevante no processo de inovação tecnológica, condições que o colocam como um dos possíveis líderes mundiais nesse tipo de processo", conclui o estudo.

Além de mencionar o potencial futuro de arrecadação com o 6G, o relatório aponta uma "correlação positiva entre receitas e novos acessos" quando se analisa o cenário das redes 5G. " Vem sendo verificado aumento de receitas e evolução de novos acessos, de novos usuários móveis, de penetração de smartphones e de quantidade de usuários com acesso à Internet, no que concerne ao cenário de implantação da rede 5G"

O estudo da UnB ainda utilizou dados da GSMA para para analisar o investimento das operadoras entre 2022 e 2030. De acordo com o material, a expectativa de investimento capex por parte das operadoras de telecomunicações é de US$ 1,5 trilhão nesse período. 92% desse valor é para a implantação do 5G, de acordo com o relatório da GSMA.

"No período avaliado, percentualmente o capex representa de 14% a 18% das receitas das prestadoras de serviços de telecomunicações. Como 92% do investimento será decorrente da implantação do 5G, à medida que a rede 5G for implantada há uma expectativa de redução gradual desse investimento", afirma o relatório da UnB.

Com o "boom" de recursos necessários para entrada e expansão do 5G no mercado, o estudo destaca que o investimento geral das prestadoras deve seguir uma tendência de queda. Já "nos mercados emergentes, o capex deverá continuar a crescer durante o período analisado", diz o relatório da UnB tendo como base a projeção da GSMA. Nesse sentido, o alerta dos autores é de que essas companhias do setor voltem o foco "para gerar retornos sobre seu investimento".

A parceria

A parceria com a UnB é coordenada pelo Centro de Altos Estudos em Comunicações Digitais e Inovações Tecnológicas (Ceadi), think tank da Anatel para pesquisa científica e diálogo acadêmico no setor de comunicações digitais e inovações tecnológicas.

O presidente do Ceadi e conselheiro diretor da Anatel, Alexandre Freire, destaca a importância do estudo: "Esse relatório é fundamental para compreendermos os impactos das plataformas digitais no setor de telecomunicações e como devemos nos preparar para enfrentar esses novos desafios regulatórios. A colaboração com a UnB nos permite ter uma visão aprofundada e embasada em evidências científicas, o que é essencial para a tomada de decisões regulatórias mais assertivas."

Para o professor Marcio Iorio Aranha, coordenador do estudo, "a pesquisa revela não apenas as tendências atuais, mas também os possíveis caminhos futuros para a regulação dos serviços digitais no Brasil. É essencial entender essas dinâmicas para promover um ambiente competitivo e justo para todos os players do mercado". Outros resultados da parceria entre Anatel e UnB podem ser acessados aqui.

Lei antitruste atual é ineficaz para plataformas, indica estudo da UnB

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!