Garantia de neutralidade do Marco Civil ainda não é realidade, dizem entidades de defesa do consumidor

Sancionada há mais de um ano, a Lei nº 12.965/2014, o Marco Civil da Internet (MCI), garante o direito à neutralidade de rede, isto é, o tratamento isonômico de pacotes. Há, contudo, previsão de exceções técnicas, que ainda precisam ser regulamentadas por decreto da presidenta Dilma Rousseff – o que deve acontecer ainda este ano, com anúncio formal previsto para o encontro IGF, em João Pessoa, em novembro. Por enquanto, na prática, o usuário ainda pode estar exposto à discriminação de pacotes, especialmente quando há dificuldade em se comprovar o ocorrido na falta de uma entidade aferidora, dizem as entidades de defesa do consumidor.

A advogada e membro do conselho consultivo da Proteste Flávia Lefèvre explica que a neutralidade é uma ferramenta jurídica para garantir a isonomia e evitar condutas anticoncorrenciais. Só que a fiscalização "depende de apuração técnica por um órgão que ainda não está definido". Por isso, há dificuldade em comprovar tecnicamente a degradação do tráfego.

Recorrer à Anatel não é exatamente a solução. De acordo com a Lei Geral de Telecomunicações (LGT), a agência (e nenhum outro órgão) não regula o serviço de valor adicionado, que são aqueles baseados no protocolo IP – ou seja, utilizam a Internet como meio de distribuição, mas não se confundem com um serviço de telecomunicações. Mas existe uma área cinzenta, que será regulamentada juntamente com outros dispositivos do Marco Civil, que é justamente a fiscalização e regulamentação da neutralidade de rede: entidades de defesa do consumidor querem jogar esse papel para a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) do Ministério da Justiça, enquanto as teles e mesmo alguns grandes provedores de serviços OTT, como a Netflix, preferem que essa tarefa fique sob a responsabilidade da Anatel.

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Até lá, o consumidor acaba ficando sem um norte. Mas é possível procurar entidades de defesa ao consumidor e o judiciário e há saída no código de defesa do consumidor, diz Lefèvre. "Quando é o caso que é uma prova principalmente técnica, quem tem que provar é a empresa. Apesar de difícil, o consumidor tem a seu favor a inversão da prova".

Proposta da sociedade civil

Isso não exime a necessidade de um mecanismo de fiscalização, até para provocar uma atitude proativa por parte das operadoras. "Tem que ter alguém para fiscalizar, não dá para atribuir um direito e deixar as pessoas olhando como se fosse 'TV de cachorro'", declara Flávia Lefèvre.

A advogada lembra que existe estrutura de proteção ao consumidor. O Ministério Público conta com uma câmara específica de proteção, há o Procon e também a Senacon, do Ministério da Justiça; além de organizações privadas que possuem legitimidade para defender os interesses dos usuários. Além disso, os órgãos técnicos, como a própria Anatel e o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), foram entidades indicadas para aconselhar a presidenta na elaboração da minuta do decreto de regulamentação do Marco Civil, que deve sair este ano.

O coletivo de defesa da democratização das comunicações Intervozes defende que se aproveite essa estrutura competente para lidar com a neutralidade de rede. A entidade enviou proposta ao Ministério da Justiça com uma junção de atores, entre Anatel, CGI.br, Senacon, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e Procons, que poderiam atuar de forma coordenada. "A nossa solução é possível, isoladamente já pode ser aplicada em casos específicos", declara a coordenadora executiva do Intervozes, Veridiana Alimonti. Ou seja: nada as impede de atuar com base na Lei em vigor, ainda que não seja a forma mais ótima.

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