Possíveis desdobramentos da extinção da Norma 4 no mercado de banda larga

Fabio Vianna Coelho VianaTel
Foto: Divulgação

A Anatel demonstra, há anos, evidente contrariedade quanto à atribuição do provimento de acesso à Internet como sendo um serviço de valor adicionado (SVA). Isso a levou a tomar uma série de medidas para coibir a prática entre provedores de Internet. A mais efetiva deverá produzir efeitos práticos a partir de 2027, para quando está programada a extinção da Norma 4/95.

Anterior à Lei Geral de Telecomunicações (LGT) – que criou a agência –, o regulamento do Ministério das Comunicações remonta ao período em que o acesso à Internet, além de ser discado, demandava um "prestador de serviços de telecomunicações" e um "provedor de serviço de conexão à Internet".

Em suas definições, a norma estabelece, entre outros, que o Serviço de Conexão à Internet (SCI) é um SVA, classe que não sofre incidência de ICMS e não implica no recolhimento de contribuições para Fust e Funttel.

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Embora seja clara, a regra não é a única que versa sobre o tema. Em seu artigo 3º, a Resolução nº 614/2013, da Anatel, define SCM como o serviço "que possibilita a oferta de capacidade de transmissão, emissão e recepção de informações multimídia, permitindo inclusive o provimento de conexão à Internet, utilizando quaisquer meios, a assinantes dentro de uma área de prestação de serviço".

Desta forma, a agência, assim como a maior parte das secretarias da Fazenda, considera o provimento de acesso à Internet um SCM, sendo, portanto, irregular sua classificação como SVA. Não é sempre, porém, que esse entendimento prevalece.

Conforme manifestações de entidades que representam ISPs e escritórios de advocacia, o fim da Norma 4 terá forte impacto sobre empresas de médio e pequeno portes, que passarão a ter os ganhos obtidos com o fornecimento de banda larga tributados não mais pelo ISS (incidente sobre alguns SVAs), mas pelo ICMS, que tem alíquota muito superior. O Comitê Gestor da Internet (CGI.br) destacou a importância do regulamento para a democratização do acesso à Internet no país.

Fica evidente que muitas prestadoras classificam contabilmente sua principal oferta como um serviço de valor adicionado. Outras, porém, diante de questionamentos e autuações do regulador e das fazendas estaduais, não conseguem fazê-lo. Isso caracteriza insegurança jurídica.

Se, em muitos casos, a Anatel nada pode fazer – particularmente quanto aos que lançam o fornecimento de conexões como SCI amparados por decisões judiciais –, em outros, sua atuação é bastante efetiva. Conforme anunciou na época, desde o final de 2023, sua fiscalização tributária é direcionada a provedores que obtêm mais de 40% de seus ganhos com SVAs e, em 2024, sua coleta semestral passou a exigir as receitas totais das prestadoras, incluindo as obtidas com essa classe de serviços, sobre a qual a agência não tem poderes.

Se tais iniciativas não podem resultar em flagrantes a todos os ISPs que praticam o que a Anatel considera ser uma infração, servem para identificar os que atribuem artificialmente receitas obtidas com banda larga ao fornecimento de streaming de vídeo e outros SVAs clássicos.

Ainda que a Norma 4 venha a ser extinta na data prevista, até lá, haverá a vigência de dois regulamentos que conflitam entre si, o que pode gerar problemas a ISPs até 2032. Isso porque questionamentos de agência e fiscos estaduais podem retroagir a até cinco anos. Dessa forma, adequações devem ser realizadas desde já.

Para provedores que adotam o entendimento trazido pela Norma 4, a principal tarefa consiste na reformulação de todos os contratos de fornecimento de serviços, desde os atuais aos que venham a ser firmados posteriormente. Neles, cada oferta deve ser detalhada em um documento específico, onde deve constar o dispositivo que a regulamenta e que define qual é sua categoria e os tributos e contribuições sobre ela incidentes. Se essa ação não elimina a possibilidade de consultas e autuações, ao menos servirá para eventuais justificativas e defesas que se façam necessárias no futuro.

O ideal, porém, é que o aumento das receitas obtidas com SCM não apresente saltos quando, a partir do fim da Norma 4, esta for a única classificação atribuível ao provimento de acesso. Para tanto, ISPs terão de investir em parcerias com fornecedores de SVAs, para que essa classe de serviços mantenha sua representatividade contábil.

Independentemente da extinção da Norma 4, o fim de duas definições conflitantes em termos fiscais já era previsto, a partir da Reforma Tributária, que cria um único imposto que incidirá, com a mesma alíquota, sobre SCM e SVAs. A substituição de ICMS e ISS, entre outros tributos, pelo IVA será gradativa, tendo início no próximo ano.

Como outros temas fundamentais para prestadores de SCM (ou seriam de SCI/SVA?), não há certeza sobre a extinção da Norma 4 e, caso esta ocorra, se será em 2027. A NFCom, por exemplo, teve sua obrigatoriedade programada para julho de 2024, depois, para abril último e, até aqui, deverá entrar em vigor em novembro próximo.

Alguns escritórios de advocacia questionaram a competência da Anatel para revogar o regulamento. Dentre outros, argumentam que a agência não tem poderes para fazê-lo com uma norma do Ministério das Comunicações e nem arbitrar sobre SVAs (SCI, no caso). Fato é que só algumas empresas puderam usufruir dos benefícios fiscais proporcionados pela Norma 4 e, se uma única regra não se aplica a todas, algo errado acontece.

* Sobre o autor – Fabio Vianna Coelho é sócio da VianaTel, consultoria especializada na regularização de ISPs, e do RadiusNet, software de gestão para provedores de Internet. As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente as visões de TELETIME. 

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