A publicação do Regulamento de Dosimetria e Sanções Administrativas, nesta segunda-feira 27, pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), atende a uma longa espera dos setores do mercado e profissionais que atuam na área de privacidade e proteção de dados. Teletime ouviu alguns desses especialistas, e de maneira geral, a medida foi bem-vinda e já sinaliza possíveis mudanças no mercado.
Para Vivian Azevedo, responsável pela área de Proteção de dados do Bhering Cabral Advogados, a norma de dosimetria, como é chamado o regulamento, inaugura um novo ciclo da Proteção de Dados no Brasil, uma vez que a ANPD poderá exercer seu poder sancionatório.
"A expectativa é que haja uma maior procura pela adequação à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) por parte das empresas que ainda não iniciaram seus projetos já que, agora, as sanções virão. Deixar uma organização vulnerável a essas possíveis perdas pode causar impactos negativos, sob diversos aspectos, incluindo risco de perda financeira e reputacional", avalia a advogada.
Para Patricia Peck, CEO e sócia-fundadora do Peck Advogados, a publicação do regulamento de dosimetria representa para o mercado que a partir desta data a autoridade ANPD já pode aplicar as multas. "A Lei está vigente desde 2020 e é por isso que o regulamento prevê que se aplica também aos casos administrativos em curso. Acredito que está medida finaliza um ciclo importante iniciado com a Resolução 01 do Processo Sancionador que é de outubro de 2021e que precisava do Regulamento de Dosimetria para permitir equacionar o grau de gravidade da violação com a penalidade a ser aplicada ao infrator. Agora vamos começar a ter os primeiros multados o que vai provocar uma corrida para a conformidade. Como resultado acredito que os titulares vão perceber uma maior preocupação com a proteção dos dados pessoais", explicou a advogada ao Teletime.
Ela também enxerga que em um primeiro momento as empresas ficarão preocupadas com a capacidade agora da ANPD fiscalizar e punir, fazendo surgir dois perfis de empresas: as que agora vão atrás de ficar em conformidade e as que vão reforçar a manutenção do programa.
Em linhas gerais, Patricia Peck avalia que o documento final de dosimetria ficou bom, apesar de alguns itens ainda terem ficado com uma redação genérica, como exemplo a questão do tratamento em larga escala, sendo ainda pontos de melhoria para o futuro. "Vamos amadurecer estes tópicos a partir das decisões dos casos e da formação da jurisprudência da ANPD. O importante foi sair a dosimetria para virar esta página e permitir avançar para os próximos passos da agenda fiscalizatória", disse a advogada, que também é Conselheira Titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e Professora da ESPM.
O advogado Paulo Lilla, sócio da prática de Tecnologia, Proteção de Dados e Propriedade Intelectual do Lefosse, entende que, agora, com a publicação das normas de dosimetria, não há mais qualquer entrave para a ANPD efetivamente impor sanções administrativas em caso de violação à LGPD. Apesar de ainda estar fazendo uma análise mais minuciosa do regramento, ele entende que o texto está adequado dentro do que era esperado após o processo de consulta pública iniciado no ano passado, quando a sociedade civil teve a oportunidade de contribuir para o aprimoramento do texto.
"Vale lembrar que, com a publicação do regulamento de dosimetria, a atuação fiscalizadora e repressiva da ANPD passa a ser fortalecida, de modo que podemos esperar em breve as primeiras penalidades serem impostas pela ANPD. Destaco, contudo, que a atuação repressiva da ANPD, consubstanciada na possibilidade de aplicação de sanções, constitui apenas um dos instrumentos regulatórios à disposição do órgão para impor o cumprimento da LGPD, no contexto de sua abordagem regulatória responsiva, que também pressupõe uma atuação focada no monitoramento, orientação e prevenção", explicou o advogado a este noticiário.
Ele também concorda que, com a publicação da norma, é possível que se tenha uma maior proteção de dados dos brasileiros. "A iminência da ação punitiva possivelmente fará com que eventuais empresas que ainda não adequaram suas atividades empresárias à LGPD busquem, finalmente, fazê-lo", afirma. Contudo, o advogado destaca que as sanções administrativas não excluem a possibilidade de infratores virem a sofrer ações indenizatórias para a reparação de danos patrimoniais, morais, individuais ou coletivos, causados a titulares dados em decorrência de violações à LGPD, o que já é possível desde a entrada em vigor da LGPD.
Da mesmo forma, continua o advogado, as sanções administrativas que porventura venham a ser aplicadas pela ANPD também não excluem a possibilidade de aplicação de sanções administrativas previstas em outras leis, como o Código de Defesa do Consumidor, por outras autoridades, como os órgãos de proteção ao consumidor e o Ministério Público.
"O comportamento das empresas também deve mudar. Acredito que haverá uma nova onda de "projetos de adequação" à LGPD, ou seja, empresas que ainda não se adequaram deverão tomar providências nesse sentido a partir de agora, ou pelo menos após a imposição da primeira sanção pela ANPD, o que deverá ocorrer nos próximos meses", também destaca Paulo Lilla.