A fornecedora de equipamentos de rede e fabricante de telefones móveis Huawei tem um desafio e tanto pela frente: desassociar a sua marca da percepção de que produtos chineses são ruins, de baixa qualidade. A empresa pretende trilhar o caminho já percorrido por marcas japonesas e sul-coreanas, que começaram com mercadorias similares, mas se tornaram reconhecidas pela inovação e qualidade de seus produtos. "Somos uma companhia com background tecnológico, com grande time de pesquisa e desenvolvimento e um mercado interno muito grande (o da China) para nos dar escala e temos usado isso tudo para trazer inovações cada vez maiores", comenta o chief marketing officer (CMO) da divisão de devices e consumer da Huawei, Shao Yang, em entrevista a jornalistas na seda da empresa em Shenzhen, no Sul da China.
E o cenário de reconhecimento da marca fora da China já começa a mudar, em especial em países da Europa. Na Alemanha, por exemplo, pesquisas encomendadas pela empresa mostravam um índice de apenas 3% de brand awareness da Huawei em 2011, ano em que a fabricante substituiu sua estratégia de venda de smartphones white label em parceria com operadoras para apostar em sua própria marca. No ano passado, esse índice subiu para 53%.
No mercado brasileiro, contudo, ainda há um longo caminho a percorrer. "No Brasil as pessoas ainda não têm muita clareza da nossa marca e isso é uma falha nossa. É um país grande e com muita diversidade cultural, cada região é diferente, além de uma relação muito emocional com as marcas. Para nós é muito difícil entender o que é o Brasil real, mas temos que realmente fazer uma imersão para entender a cultura", reconhece Yang.
A nova estratégia da Huawei para o País passa, de acordo com o CMO, pela contratação de talentos locais que consigam fazer a comunicação da fabricante chinesa enxergando o mercado brasileiro em todas as suas particularidades; foco na fabricação local de smartphones para aproveitar os incentivos fiscais e chegar ao mercado com preços mais competitivos; patrocínio de esportes, em especial, times de futebol; e venda online para o consumidor final. Vale lembrar, todo o marketing de dispositivos móveis da Huawei no mercado brasileiro é feito em parceria com as operadoras, que são o canal de distribuição da fabricante no Brasil.
"A primeira coisa que precisamos resolver é a fabricação local, senão não temos condições de competir. Só depois é que devemos estabelecer um canal online, como a Amazon tem, sozinhos ou com parceiros do varejo. Mas isso não seria para esse ano", revela Yang. O parceiro de varejo seria algum comércio online já bem estabelecido, como uma Americanas.com ou Ponto Frio.
A Huawei já investe em marketing esportivo em outros países, patrocinando, por exemplo, os times de futebol Atlético de Madrid, Arsenal, PSG, AC Milan, Borussia Dortmund, Schalke 04, Ajax e Galatasaray, além do time de rugby australiano Raiders.
Vice-liderança
Mostrando uma visão realista da competição no mercado de smartphones, Shao Yang reconhece que não está certo se a Huawei consegue ser a primeira colocada no mercado, mas garante: "podemos ser os segundos se continuarmos fazendo as coisas certas". Para o executivo, a maior competição de uma fabricante é consigo própria. "Se não cometerem um erro muito grande, há pouca oportunidade para outras. Mas vimos muitos erros no passado, empresas que perderam a direção. Samsung e Apple devem continuar na direção de hardware e fashion, mas a verdade é que desde o primeiro iPhone pouco mudou no conceito de smartphone. Temos telas maiores, mais processador, mas falta inovação. E é assim que pretendemos chegar no topo, trazendo inovações, fazendo os melhores smartphones com o melhor custo benefício", explica.
A Huawei, segundo Yang, está repensando o conceito desses celulares. "Todos têm desenhado smartphones com base no da Apple e não acho que esse será o futuro em cinco anos. Podemos quebrar o smartphone, separar. Vemos o aparelho como um centro de conexão para outras coisas, como óculos e relógios. Do ponto de vista de hardware, modem e CPU podem ser muito pequenos, a tela pode ser uma projeção ou usar óculos conectados e o input pode ser substituído por um teclado a laser ou comandos de voz. Será como um smartphone 'invisível'. Veremos mudanças, e elas costumam acontecer de repente", diz.
Mais da metade das vendas de smartphones da Huawei já acontece fora da China, e a fabricante é a terceira em número de smartphones vendidos globalmente, com share de 6,8%; atrás da Samsung, líder com 25,2%, e da Apple, em segundo lugar, com 11,9% de participação, segundo dados de julho da Strategy Analytics.
"No futuro as empresas mais valiosas serão aquelas que têm o melhor controle do cliente – não as que se apropriam completamente do cliente (em referência à Apple), mas as que o conhecem melhor e usam essas informações melhor", avalia o CMO. "Não somos como a Apple, não nos apropriamos dos clientes, nós os conhecemos".