Para Anatel, participação cruzada da Telefônica na Vivo e na TIM não afeta concorrência

Quando a Telefônica anunciou que, enfim, assumiria plenamente o controle societário da Vivo, maior operadora de telefonia móvel do país, a pergunta que invariavelmente passou a surgir em todas as conversas sobre a operação era: "e como fica a TIM?" O motivo é que antes do troca-troca no controle da Vivo, uma das grandes operações societárias envolvendo empresas de telecomunicações no Brasil foi a entrada do Grupo Telefônica no bloco de controle da Telecom Itália, responsável pela TIM. O investimento dos espanhóis gerou uma participação indireta na operadora móvel de pouco mais de 10%. Mas ainda assim, a possibilidade de influência da Telefônica em duas grandes companhias móveis no mercado brasileiro preocupa muita gente.
À primeira vista, a Anatel não faz coro com as preocupações do mercado. Ao aprovar nessa quinta-feira, 23, a transferência das ações detidas pela Portugal Telecom na Vivo para a Telefônica, fazendo com que os espanhóis sejam donos exclusivos da operadora, a agência não fez qualquer menção na nota oficial que tornou pública a decisão à participação do grupo na empresa concorrente. A análise do conselheiro-relator, Jarbas Valente, divulgada apenas nesta sexta-feira, 24, revela que a Anatel avaliou a situação, mas concluiu que não há nada a temer, pelo menos por enquanto.
Hoje, a TIM é a terceira maior empresa de telefonia móvel no Brasil, tendo perdido a segunda posição para a Claro há alguns anos. Na época da entrada da Telefónica de Espanha (controladora da Telefônica) no grupo Telco, que compõe o bloco de controle da Telecom Itália, houve uma grande preocupação com relação à possibilidade de o novo acionista reduzir os níveis de competição entre Vivo e TIM no Brasil, afetando negativamente à concorrência em benefício próprio.

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Primeira aprovação
Para avalizar a operação, a Anatel impôs uma série de restrições à Telefônica, focando especialmente a proteção das informações estratégicas da TIM. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) chancelou as restrições e aprovou o negócio entendendo que a diferença de investimentos feitos pela Telefônica na Vivo (onde detinha 50% do controle) e na TIM (onde a participação é de 10,9%) deixaria claro que o alvo de negócio dos espanhóis é a Vivo, tornando improvável a realização de acordos que reduzissem a concorrência entre as duas empresas.
Seguindo este raciocínio, o fato de a Telefônica agora assumir plenamente o controle da Vivo, com a saída da Portugal Telecom, acentuaria esse interesse mais forte na Vivo em detrimento da TIM. Foi com base nessa tese que Valente e a área técnica da Anatel entenderam que, à primeira vista, não há risco concorrencial na participação acionária simultânea dos espanhóis nas empresas adversárias. Pesou também a aposta de que os demais acionistas da TIM não terão interesse em coadunar com qualquer prática que a Telefônica possa tentar adotar para reduzir a concorrência no Brasil.
"Se antes da presente operação os demais acionistas do Grupo TIM não permitiam que a TEF (Telefônica) participasse de decisões sobre as estratégias de atuação no mercado brasileiro, esse comportamento de vedar a participação da TEF em determinados assuntos tende a se tornar mais incisivo após a operação, pois o próprio Grupo TIM tentaria evitar que a TEF, com participação na TIM e em sua concorrente direta Vivo, pudesse ter acesso a informações privilegiadas de atuação no Brasil", afirma Valente em sua análise. Acontece que este raciocínio segue linha sutilmente oposta a um dos pontos levantados no passado no rol de argumentos em defesa de que a Telefônica não teria capacidade de influir negativamente no controle das duas empresas.
Saída da PT
O ponto-chave das análises anteriores era, ironicamente, a presença da Portugal Telecom (PT) no controle da Vivo. Na época, este fato foi citado várias vezes nas análises do Cade como uma espécie de blindagem contra uma possível influência anticoncorrencial da Telefônica na Vivo e na TIM. A lógica é que uma eventual estratégia anticompetitiva iniciada pela Telefônica não encontraria guarida na PT pelo simples fato de que os portugueses nada ganhariam com uma política de não concorrência com a TIM. Assim, a PT funcionaria como um "neutralizador" da Telefônica por dividir com ela o comando da Vivo.
Esse aspecto é rememorado pelo próprio conselheiro Jarbas Valente, mas tratado como um "fator acessório" apenas. "De fato, a presença da PT na Vivo era, no entender dessa agência reguladora e do Cade, um fator acessório que teria relevância apenas na hipótese em que a TEF possuísse influência relevante sobre a Telecom Itália, hipótese esta descartada pelo Cade, devido à atuação da Anatel", interpreta o conselheiro. Ainda assim, a própria procuradoria da Anatel, ao analisar a nova operação Vivo/Telefônica, chamou atenção para a necessidade de uma análise mais acurada dos efeitos da saída da PT do controle da operadora do ponto de vista das influências concorrenciais.
Instrução
Não foi apenas a procuradoria que alertou para a importância de uma avaliação mais detalhada do imbróglio acionário. A conselheira Emília Ribeiro, que também divulgou publicamente seu voto hoje, seguiu a mesma linha, sugerindo que a Anatel verifique com atenção a participação simultânea da Telefônica nas duas operadoras. Entre os itens de seu voto está "recomendar às superintendências de Serviços Públicos e de Serviços Privados que acompanhem o ambiente concorrencial entre as empresas do Grupo Vivo e do Grupo Telecom Itália, no Brasil, assim como examinem detidamente essa questão no âmbito da instrução do Ato de Concentração nº 53500.020123/2010 referente a presente operação".
Apesar de a decisão final não prever a recomendação expressa pela conselheira, o relator Jarbas Valente sinaliza em sua análise que o assunto deve mesmo passar por uma análise mais profunda durante a produção da instrução que norteará o julgamento futuro do Cade. A decisão de ontem fixou alguns condicionantes, mas o relator frisou em seu voto que novas restrições podem ser impostas caso se verifiquem riscos concorrenciais ainda não constatados nessa primeira fase de anuência prévia.

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