A Lei 12.485/2011, que estabelece o marco legal da TV por assinatura, tende a tornar mais complexa a posição do Brasil na geopolítica internacional das fusões e aquisições envolvendo o mercado de mídia e de telecomunicações. A razão para isso é a limitação que a lei estabelece para o controle cruzado entre empresas de telecomunicações e empresas de conteúdo atuantes no Brasil. Uma primeira consequência poderá ser vista caso se concretize o acordo para que a AT&T adquira, nos EUA, o controle do grupo Time Warner, numa fusão estimada em US$ 85 bilhões. A Time Warner é controladora da programadora Turner e de canais como a HBO, a CNN, o TNT, o Esporte Interativo, Cartoon Networks entre muitos outros presentes há mais de 20 anos na TV paga brasileira. A AT&T é controladora da Sky, a segunda maior operadora de TV paga do país com cerca de 5,3 milhões de assinantes. Se a fusão de fato ocorrer, a AT&T muito provavelmente terá que vender a Sky e deixar de atuar no mercado corporativo no país, e ficará definitivamente fora de uma eventual disputa pela Oi ou pela TIM. Ou então, a Time Warner retira suas programadoras de TV paga do Brasil.
A separação de mercados estabelecida na lei brasileira surgiu em decorrência de um acordo. As teles, logo no início da tramitação da Lei do SeAC, ainda em meados de 2007, queriam a liberação do mercado de TV a cabo ao capital estrangeiro. Os radiodifusores, sobretudo a Globo, queriam a proteção contra uma possível competição das teles no mercado de conteúdos, especialmente na disputa por direitos esportivos. O legislador aceitou criar a segregação para diminuir a resistência à tramitação do projeto de lei. A vedação ficou consubstanciada nos artigos 5 e 6 da Lei do SeAC. Pela lei, nenhuma empresa de radiodifusão ou que seja produtora e programadora com sede no Brasil pode deter mais de 50% do capital social e votante de empresas de telecomunicações. E na outra via, empresas de telecomunicações não podem deter mais do que 30% do capital social e votante de empresas de radiodifusão, produtoras ou programadoras com sede no Brasil. E um detalhe: para ser programador de TV paga, é preciso necessariamente ter sede no país.
Além disso, empresas de telecomunicações não podem, pela Lei do SeAC, adquirir direitos de imagem de eventos de interesse nacional nem contratar talentos, a não ser para fins publicitários. É verdade que esses dispositivos da lei são parcialmente cumpridos. Ainda há grupos radiodifusores que controlam operações de TV paga e SCM, por exemplo, mas são casos que não chamam a atenção (ainda que igualmente à margem da lei). Bem diferente de uma AT&T se tornar controladora indireta de uma HBO ou da CNN.
Nos EUA, a tendência de consolidação entre empresas de conteúdo e empresas de distribuição é crescente, sobretudo para enfrentar as empresas de Internet. A Comcast, maior operadora de cabo dos EUA, é controladora da NBC Universal e de vários canais de TV por assinatura. A Liberty Media é acionista da Discovery Communications e da Liberty Global, uma das maiores operadoras de cabo da Europa. A Verizon adquiriu recentemente a AOL, cuja presença maior é no mercado de Internet mas não deixa de ser uma produtora de conteúdo, com canais como o Vice. E a própria AT&T, quando pagou quase US$ 50 bilhões pela DirecTV, estava de olho inclusive nos direitos exclusivos de conteúdo esportivo da operadora de DTH. Há quem aposte que, em pouco tempo, movimentos de consolidação semelhante começarão a acontecer com empresas europeias.
Por lá, o grupo de mídia francês Vivendi tem presença no mercado de telecom. No Brasil, já foi acionista controladora da GVT, depois vendida para a Telefônica, e hoje é a principal acionista da Telecom Italia, controladora da TIM. Como a Vivendi não tem atuação no mercado de programação brasileiro, não há conflito. Na semana passada a Vivendi lançou, em parceria com a Vivo, um serviço de conteúdo on-demand chamado Studio+, inicialmente para celulares. O serviço só não entra na sombra da Lei do SeAC por ser sob demanda e porque a Vivendi não tem mais relação com a Telefônica.
A America Móvil, logo após a aprovação da Lei 12.485/2011, precisou se desfazer de algumas participações que tinha em empresas de conteúdo atuantes Brasil.
É possível que as teles brasileiras demorem a sentir uma efetiva necessidade de produzir conteúdos no Brasil ou se consolidarem com empresas de mídia, mas mesmo se isso acontecer, a porta estará fechada pela lei. O problema será conciliar essa limitação da lei às eventuais alianças internacionais que possam acontecer.
Acabou de ser concretizada. "Parabéns" aos idealizadores do tal SeAC, que simplesmente ferrou com a tv paga no nosso país.
Essa lei deveria ser revista, as empresas deveriam poder atuar sem restrições no país, assim aumenta a concorrência e a briga pelo melhor conteúdo e qualidade da rede e estrutura.
Em tempos de reflexão sobre concorrência pelo mercado e especialmente a Anatel, não ficaria surpreso com o posicionamento por essa lei. É óbvio que a vantagem de adquirir uma Time Warner é infinitamente maior que o fato de ter de deixar uma SKY Brasil do lado. No entanto acredito que nos bastidores já devem começar movimentações para que o regulamento mude.
Quando a lei do SeAC foi criada, a realidade era uma. Hoje, a realidade é outra. Todas as leis são feitas para refletir o que a maioria quer numa determinada época. Não adianta criticar a lei, basta que a maioria queira mudá-la.
A lei do SeAC veio exatamente para proteger o conteúdo nacional da sanha dos grandes players multinacionais de mídia e telecomunicações. Claro que também atendeu a um pedido das radiodifusoras das teles (neste caso, ao abrir ao capital estrangeiro o serviço de cabo), mas impede a propriedade cruzada entre teles e produtoras/programadoras. Ora, sabemos que as teles são gigantes internacionais e não medem esforços para garantir seus interesses de lucro mundo afora. Elas atuam fortemente para desregulamentar o setor de comunicações e enfraquecer a regulação sobre o setor em vários países. Isso não é novidade, como um dos internautas disse num outro comentário. Estudos dos anos de 1980 já alertavam sobre a tendência à concentração da propriedade de mídia em poucos (e gigantes) conglomerados de comunicações e entretenimento. É o caso da AT&T e Time Warner, assim como foi no início deste milênio quando houve a fusão entre Time Warner e a AOL. Os legisladores agiram corretamente ao criar mecanismos que impedem a propriedade cruzada entre empresas distribuidoras e de conteúdo. O mesmo acerto pode ser visto com a criação das cotas de canais e de conteúdo nacionais no serviço de TV paga, exatamente para evitar que a programação desse serviço seja dominada por programações estrangeiras enlatadas. Isso é fundamental para assegurar a liberdade de expressão, a diversidade e a pluralidade no setor audiovisual, menina dos olhos desses grandes players. Logo, tais medidas são extremamente necessárias se quisermos ter um conteúdo nacional forte e de que qualidade frente aos gigantes globais das comunicações.
Caro Samuel
Estas imposições da lei tiveram como objetivo a proteção do mercado de brasileiro de radio-difusores. Seus receios era de que, o então poderio econômico das Telcos no Brasil, verticalizasse o mercado adquirindo produtores de conteúdo.Criaram uma reserva de mercado.
A Sky, como empresa do SeAC, é provedora de serviços de telecomunicações de interesse coletivo no Brasil e para tal precisa manter sua sede no Brasil. HBO , CNN , TNT e Warner como produtoras de conteúdo não precisam obrigatoriamente estarem presentes no Brasil. Escritórios de representação podem cumprir tais tarefas.
A lei brasileira de concorrência tem remédios "ex post" para coibir qualquer ação anticompetitiva nesta área.
Os radio-difusores precisarão correr atrás de outras formas de blindagem como as tarifas protecionistas contra conteúdos estrangeiros.Isto é fácil. Basta contratar gente como Intervozes para cantarem loas ao conteúdo nacional (rsrs).
AT&T tem interesse de grau zero no mercado tradicional de voz e dados no Brasil.É muito mais rentável para eles consolidarem operações de OTT´s nos EEUU e fazerem grandes receitas usando os custos suportados por Telcos ao redor do mundo.