A Oi deve apresentar nos próximos dias à Justiça do Rio de Janeiro, onde corre o seu processo de Recuperação Judicial, o pedido de instauração de procedimentos de mediação para resolver um dos problemas mais críticos da recuperação: a dívida com a Anatel e com a AGU. São cerca de R$ 13 bilhões, que hoje estão em um limbo jurídico e numa situação de impasse que pode alongar a solução por anos. Essa medida (o pedido de mediação) está prevista no Plano de Recuperação (cláusula 4.3.2.7), e segundo fontes familiarizadas com o processo é a única alternativa de se resolver essa parte da dívida.
Como se recorda, a Oi incluiu a dívida de multas com a Anatel no pedido de recuperação judicial. A Advocacia Geral da União (AGU) recorreu, pois entende que esse tipo de crédito (multas em tramitação administrativa ou já em execução fiscal) não poderia ser considerado no pedido. Ainda não houve uma decisão sobre o mérito do recurso da AGU por parte da vara em que corre o processo de recuperação, mas já houve a manifestação no sentido de que as execuções judiciais fossem suspensas. A União recorreu e perdeu de novo na segunda instância. Mas as execuções fiscais não cessaram, pois são de responsabilidade da Justiça Federal, que não tem reconhecido a decisão da Justiça Estadual do Rio nesses casos. O caso deve chegar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), por recurso da própria AGU (contra a ordem de suspensão das execuções) ou da Oi (para suspender efetivamente as execuções pela Justiça Federal). Em paralelo, ainda corre na AGU um pedido feito pela Oi, ainda antes da recuperação judicial, para celebração de um acordo em relação às multas que já foram executadas. Mas essa é uma parte do problema.
A outra parte do problema, bem maior em termos de volume financeiro, são as multas ainda em esfera administrativa, cujos TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) estavam sendo celebrados com a Anatel. Nesse caso, as negociações estão paradas por conta de uma determinação do Tribunal de Contas da União, da qual a Anatel recorreu. Enquanto o TCU não der o sinal verde, ninguém assina TAC nenhum com a Oi.
O pedido de mediação não é garantia de solução nenhuma. Mesmo que a Justiça do Rio de Janeiro determine e intermedie essa pactuação, a União não é obrigada a celebrar nenhum acordo no âmbito do processo de recuperação. Mas o pedido pode ser um catalisador para que as conversas entre os diferentes personagens comecem. AGU, TCU, Anatel, Oi e Justiça precisam sentar na mesma mesa. A questão é quem no governo terá a coragem de usar a caneta e fazer um acordo sobre valores bilionários.
Condicionantes
Por mais que as multas aplicadas na Oi ao longo desses anos sejam contestáveis (até a Anatel reconhece que errou na metodologia e provocou uma bola de neve que não corresponde aos danos causados pelas falhas da Oi), o risco de contestação por parte dos órgãos de controle é grande. Nesse momento o poder de fazer um acordo andar está com a AGU e com o TCU, mas há também alguns entraves que poderão aparecer em decorrência do próprio Plano de Recuperação da Oi.
Lá estão estabelecidas condições a serem seguidas: "(i) ao arquivamento dos processos; e (ii) exigência apenas dos compromissos expressamente assumidos pelas recuperandas (Oi) durante o período abrangido pela mediação, não inferior a 4 (quatro) anos, desobrigando-as do cumprimento dos indicadores de qualidade e regras regulamentares nesse período; b) com relação a instrumentos já negociados e assinados entre as partes antes do Pedido em Termo de Ajustamento de Conduta, não poderão ser majoradas as obrigações impostas às recuperandas; c) com relação a sanções administrativas ou condenações que não foram objeto de instrumento negocial já assinado pelas partes, serão considerados os conceitos constantes dos subitens (a) e (b) do item (ii) da Cláusula 4.3.2.8". Estes conceitos são "i) Ações das recuperandas (Oi) voltadas a melhoria do serviço, em especial com alguma relação à suposta conduta descumprida; (ii) Conversão da multa em obrigações de fazer, podendo ser: a. Investimentos em infraestrutura das recuperandas; e/ou b. Benefícios aos consumidores dos serviços prestados; e/ou c. Levantamento de valores já depositados judicialmente para os processos relativos a essas multas administrativas". Todas estas condições são muito próximas, senão idênticas, àquelas previstas no TAC com a Anatel, mas naquele momento a negociação se dava com uma empresa que dizia ter condições de manter os compromissos pelo tempo necessário. Agora, em recuperação judicial, o futuro da Oi depende antes de mais nada do sucesso do plano de recuperação para que, depois, possa ser avaliada a sua real condição operacional para o futuro.
Limite
Caso não haja acordo, e caso a Oi consiga ver a sua tese de que a as multas são parte da dívida a ser incluída na recuperação, uma situação no mínimo inusitada pode se desenhar: a Anatel ser obrigada a votar numa assembleia de credores de uma empresa regulada. Como os créditos da agência são de Classe 3 (quirografários, ou seja, sem garantias reais), a dívida coma Anatel (e com a AGU, nos casos já executados) é uma parte significativa, e o voto poderia até ser decisivo nessa classe. Se votar contra a Recuperação Judicial, a Anatel pode empurrar a Oi para a falência (e se ver obrigada a brigar pelo espólio da empresa na Justiça). Se votar a favor, pode ser responsabilizada pelo TCU por ter aberto mão de recursos. Ninguém no governo (nem na Oi) sequer cogita a hipótese de a situação chegar a esse limite, mas na teoria isso pode acontecer. O caminho da mediação e de um acordo seria o mais simples, e o governo já celebrou acordos bilionários e casos de multas administrativas. Mas alguém no governo terá que tomar uma decisão no caso específico da Oi.
Culpado por isso? ANATEL.