Informe da SPB põe em xeque fé pública dos fiscais da Anatel

Bem antes do informe sobre multas elevadas, a Superintendência de Serviços Públicos (SPB) produziu outro documento com forte impacto sobre os Procedimentos de Apuração por Descumprimento de Obrigações (Pados). O material obtido por este noticiário foi oficializado no dia 9 de fevereiro de 2009 pela Gerência-Geral de Competição da SPB e põe em xeque a fé pública dos fiscais da própria Anatel: caso o agente público não tenha provas materiais da infração, a palavra da empresa fiscalizada prevalece.
O caso em questão envolve um Pado de 2006 contra a Brasil Telecom, onde a empresa teria sido punida inicialmente com a sanção de "advertência". O motivo da pena foi a falta de divulgação de informações sobre o Código de Seleção da Prestadora (CSP) de outras empresas nos postos de atendimento. Ocorre que a empresa argumentou que seu direito de defesa foi cerceado pelo fato de a infração ser descrita apenas em um relatório de um dos fiscais da Anatel, sem qualquer prova concreta da falha ou descrição de como foi feito o procedimento.
Um dos pontos levantados pelos advogados da BrT era a falta de gravação do diálogo entre o fiscal e o atendente do posto de atendimento. Com base nessas argumentações, a gerência de competição da superintendência se serviços públicos da Anatel deu provimento ao recurso da empresa, sugerindo a "descaracterização da suposta infração". Acontece que a análise feita para o caso guarda detalhes polêmicos como a admissão de que a agência jamais organizou uma metodologia para o trabalho dos fiscais na análise de postos de atendimento. "A Metodologia e Procedimentos de Preparação da Avaliação e Verificação em Campo não traz como deve ser feita a fiscalização em Postos de Atendimentos, apenas em TUP, PST e TAP", declara a gerência no informe.

Notícias relacionadas
Com base no informe, o então superintendente de Serviços Públicos, Gilberto Alves, assinou despacho no dia 30 de março de 2009, determinando o arquivamento do Pado. De acordo com o despacho, o processo não contou com análise jurídica com base em alteração feita no regimento interno da Anatel em 2007 que dispensou o encaminhamento de Pados à procuradoria. Alves se exonerou da Anatel no início deste mês após as polêmicas envolvendo outro informe, sobre as multas altas.
 Fé pública
 Considerando que a agência não dispõe de uma metodologia clara sobre como o fiscal deve se comportar na verificação de postos de atendimento, não é demais deduzir que, para estes casos, a Anatel deveria utilizar o princípio da "fé pública" de seus agentes. É a fé pública, prevista na Constituição Federal e na Lei da Administração Pública, que dá aos fiscais o pressuposto da verdade em seus atos. Dessa forma, mesmo admitindo-se o direito à defesa – outro princípio constitucional – a verdade, em princípio, está ao lado do agente público e não do potencial infrator. A lógica usada pela Anatel, no entanto, põe em dúvida a fé pública de seus próprios fiscais.
No mesmo informe, a gerência pondera que, apesar de não haver metodologia definida, os fiscais apresentaram gravações telefônicas no levantamento de outras infrações investigadas no mesmo Pado. "Por outro lado, para a fiscalização realizada nos Postos de Atendimento, não houve material comprobatório dessa espécie, ou outro que não seja o testemunho do fiscal, suficiente para ser considerado como material para a concessionária contestar, exercendo seu direito de defesa", complementa o informe.
Com isso, a área técnica sugere nas entrelinhas que esperava que os fiscais produzissem gravações em todas as investigações, mesmo que isso não esteja definido em nenhuma metodologia em vigor para os agentes da Anatel. Conclui ainda que, se a empresa não tem como se defender, não há como definir que houve infração. "Assim, não há como caracterizar uma infração se o direito de defesa da Concessionária se mostrou cerceado", diz o documento da Anatel.
 Repercussão
 O caso que gerou o informe em questão é insignificante diante de outros, levando em conta que se trata de uma advertência sobre a suposta falta de divulgação de informações pela BrT. Mas o problema maior é que o documento já chamou a atenção das empresas, que pretendem "contrabandear" o informe para outros processos bem mais importantes. A primeira iniciativa partiu da Oi. A empresa tem usado a análise da SPB para contestar os resultados obtidos pela fiscalização em, ao menos, um grande processo administrativo: o dos Postos de Atendimento, estimado em quase R$ 500 milhões.
Assinado em 2004 pelas concessionárias do STFC, o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TCAC) prevê a implantação e manutenção dos postos de atendimento pessoal, que haviam sido desativados pelas empresas após a privatização. Desde que o estabelecimento do acordo, várias falhas foram constatadas pela fiscalização. E, agora, a existência desses problemas está sendo contestada pela Oi com a ajuda da análise da SPB.
Segundo fontes, a empresa questiona diversas conclusões obtidas por fiscais, como declarações de falta de instalação de postos. A própria Oi teria ressaltado que a Anatel, considerando que as declarações dos fiscais possuem fé pública, rejeitou a maioria do material apresentado pela empresa para contestar a fiscalização. Mas depois destaca que a mesma SPB decidiu arquivar o Pado contra a BrT por considerar que apenas o testemunho do agente não é suficiente para caracterizar a infração.
Métodos de fiscalização
O material encaminhado pela Oi à Anatel levanta pontos importantes com relação à fragilidade da fiscalização da Anatel. De acordo com fontes da concessionária, há casos em que o fiscal registrou a abertura do posto em data anterior à efetiva implantação da central de atendimento. Em outra ocasião, o fiscal teria declarado que o ponto não foi encontrado, mas, coincidentemente, a empresa possuía foto do posto tirada na mesma data em que ocorreu a fiscalização;
A falta de instalação de postos de atendimento pode gerar pesadas multas a qualquer concessionária. E, por se tratar de compromisso firmado em TCAC, os valores podem extrapolar os R$ 50 milhões fixados como limite pela Lei Geral de Telecomunicações (LGT) de punição para as concessionárias. De acordo com cálculos que a Oi teria apresentado à Anatel, apenas na área da BrT, a pena por descumprimento deste item estaria na cada dos R$ 400 milhões. Em sua área original de prestação, as falhas registradas pela fiscalização têm potencial para gerar uma multa de R$ 40 milhões.
A Anatel foi procurada para explicar o informe e suas consequências, mas preferiu não se manifestar até o fechamento desta edição.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
CAPTCHA user score failed. Please contact us!