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Parecer do Tribunal de Contas sobre os TACs evitou refazer as contas e questionou políticas públicas

Entre os diferentes aspectos do parecer técnico do TCU em relação a TAC da Telefônia que responsabilizou seis conselheiros da Anatel por dano ao erário, um que chama especialmente a atenção é que o tribunal (de contas) optou por não fazer as contas em relação aos valores do acordo com a operadora, o que seria essencial para caracterizar o dano ou eventuais prejuízos para a sociedade com o TAC.

O Termo de Ajustamento de Conduta entre uma empresa  a Anatel é, essencialmente, um acordo de acerto referente àquilo que a Anatel entende como devido por conta de multas e penalidades, o que recebe um desconto previsto na regulamentação. Este valor  transforma-se em um montante que a empresa precisa aplicar em projetos, necessariamente com Valor Presente Líquido (VPL) negativo, ou seja, que de outra forma não seriam atrativos economicamente. O saldo que a Anatel havia calculado deve ser, portanto, no máximo igual ao VPL negativo dos projetos. E a partir daí a operadora define os investimentos necessários para cada projeto, em conjunto com a agência. No caso da Telefônica eram cerca de R$ 2,8 bilhões em multas estimadas, que geraram um cálculo de VPL negativo de R$ 1,6 bi e compromissos de investimentos de R$ 4,87 bilhões.

Cálculo central

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Pois o TCU optou por não calcular se esta conta estava correta, o que poderia efetivamente apontar alguma falha. Diz o parecer: “nesse momento processual, uma análise mais detida acerca do cálculo do novo estudo de VPL representaria um esforço adicional dispensável”, diz o relatório. Para os técnicos do TCU, ” a ausência desse cálculo de VPL não se constitui em impeditivo para a conclusão da presente análise”. Além disso, dizem que “não serão propostas deliberações específicas para o cálculo do VPL da Telefônica na presente instrução”. O problema é que é justamente o cálculo do VPL que poderia apontar, de maneira inequívoca, ter ou não havido dano ao erário.

O parecer manifesta oposição ao uso do Termo de Ajustamento de Conduta na forma como está definido na regulamentação da Anatel, chegando a indicar que teria sido mais vantajoso ao erário que a Anatel buscasse a coleta das multas. O relatório do TCU afirma que, porque as receitas da Anatel com multas devem ser aplicadas no Fistel e no FUST, “os valores transacionados nos TACs da Anatel correspondem a receitas da União que seriam destinadas à políticas como um todo , mas que serão destinadas para investimentos transacionados com as próprias prestadoras, não raro após anos de cometimento de infrações”. Lembrado que o próprio TCU tem feito críticas à pouca efetividade dos fundos de telecom, que na prática não são investidos no setor fora uma pequena parcela destinada ao custeio da Anatel. Além disso, o Fust só pode ser aplicado hoje em projetos de telefonia fixa, e nem para isso foi usado. Já os projetos previstos nos TACs são, essencialmente, voltados a projetos de infraestrutura de banda larga. No caso da Telefônica, redes de fibra em 113 cidades.

O TCU diz que é necessário o acompanhamento dos TACs de maneira rigorosa, inclusive para assegurar que os projetos não possam trazer benefícios para a operadora superiores aos benefícios para os usuários. Pois é justamente isso de que se trata o cálculo do VPL.

Ressalte-se, contudo, que o TCU efetivamente questionou a Anatel sobre os parâmetros da ferramenta utilizada para cálculo do VPL dos compromissos adicionais previstos no TAC. A planilha, contratada pela agência junto a uma consultoria, de fato mostrou ter problemas, uma vez que muitos dos seus parâmetros não eram acessíveis aos técnicos da agência, e isso só ficou evidente nas diligências do TCU. Isso forçou a Anatel a refazer as contas usando outras ferramentas, como a base de cálculo do Modelo de Custos. Ainda assim, as contas não foram refeitas pelo TCU, como dá a entender o relatório.

Políticas públicas

Outro ponto que chama a atenção do parecer do TCU é a resistência do tribunal em relação a projetos de infraestrutura de fibra, como se eles fossem favorecer o interesse da operadora. Diz o TCU: “um projeto de investimento em FTTH pela prestadora deixa de levar em consideração o grau de interesse público da escolha desse projeto específico em detrimento de outros projetos que poderiam ser realizados com esse volume de recursos”. Para o TCU “conseguir levar a fibra até a casa do cliente é um ideal que as operadoras e a sociedade buscam e têm como projeção de futuro. Entretanto, entende-se que priorizá- lo como política pública no Brasil não faz sentido se levarmos em consideração a atual situação deficitária de infraestrutura do país quanto ao acesso à internet”. A afirmação do Tribunal de Contas dá a entender que a oferta de uma tecnologia que é o estado da arte no aacesso de última milha é um disperdício de recursos, e que talvez fosse mais interessante ofercer um acesso por tecnologias mais baratas. Mais que isso, diz que a Telefônica teria vantagens por usar o FTTH: “o projeto com FTTH beneficia a operadora, porque possui um grande apelo comercial e um público-alvo com poder aquisitivo maior, representando maior rentabilidade do projeto”, diz o relatório.

Acontece que o Decreto 8.776/2016 definiu justamente o acesso em fibra como uma das prioridades, ao estabelecer como política “aumentar a abrangência das redes de acesso baseadas em fibra óptica nas áreas urbanas”. Vale lembrar que nas negociações com a Telefônica, os primeiros projetos previam a oferta de banda larga por meio de tecnologia FTTC, em que o acesso final é por cobre, mas esses projetos foram alterados justamente quando saiu o decreto 8.776, nos últimos dias do governo Dilma Rousseff, justamente para adaptar o TAC à nova política pública.  O TCU chega ao ponto de dizer que as políticas do Decreto 8.776/2016 são inadequadas. “As ações nele definidas possuem um caráter muito abrangente”, diz o relatório, referindo-se ao decreto. Lembrando que não é prerrogativa do TCU julgar nem avaliar o mérito das políticas, e sim o cumprimento pela administração Federal das políticas definidas em leis e decretos. Ainda assim o tribunal critica o Executivo ao dizer  que “não há um planejamento estratégico de longo prazo do governo que defina uma política pública clara e detalhada para o setor de telecomunicações” e que ” sem a definição de metas claras e detalhadas (…) não resta transparente como deverá ser a atuação do Poder Público e o papel de cada um dos seus atores.” Segundo o TCU, “isso resulta em uma decisão inadequada de política pública por parte da Anatel, algo que deveria ser definido pelo governo federal e não por meio de ato administrativo”.

Interferência

A essência da defesa da Anatel ao parecer técnico, além da demonstração dos cálculos e da lógica das negociações, será na extrapolação das prerrogativas do Tribunal de Contas sobre responsabilidades do regulador, especialmente do seu colegiado. Um dos aspectos que mais incomoda a Anatel é quando o TCU diz que, ao não seguir a lógica do IDH par definir os projetos, não cumpriu com o papel de reduzir as desigualdades regionais. O conselho diretor da Anatel tem justamente buscado trabalhar em uma nova lógica de implantação das políticas em que o IDH seja considerado em conjunto com outras variáveis, como potencial econômicos dos municípios, existência de oferta competitiva e outros fatores. O IPEA tem ajudado a Anatel nessa modelagem, que envolve centenas de variáveis. Essa discussão é central pois é a base de todo o modelo regulatório da agência. A interferência do TCU nesse processo é definidora da linha de ação daqui para frente.

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