Tecnologia ajuda, mas não basta para reduzir desigualdade racial no ensino

Tecnologia e Desigualdades Raciais no Brasil
Evento de lançamento da pesquisa Tecnologia e Desigualdades Raciais no Brasil. Foto: Mara Matos

As desigualdades no aprendizado comparando-se o desempenho de diferentes grupos raciais estão diminuindo com o passar dos anos, mas ainda lentamente.  É o que mostrou o estudo Tecnologia e Desigualdades Raciais no Brasil, realizado pelo Núcleo de Estudos Raciais do Insper com apoio da Fundação Telefônica Vivo. O estudo tomou como referência a aprendizagem de matemática.

Segundo o estudo, as desigualdades se mostram mais associadas a diferenças regionais e por tipo de escolaridade. Mesmo que a exposição à tecnologia esteja relacionada a melhor desempenho acadêmico (no caso medido, da matemática), ela não seria a grande responsável pelas diferenças quando observadas as variações entre diferentes raças.

A pesquisa lançada em evento nesta terça-feira, 18, parte da necessidade de competências digitais aliadas ao processo de aprendizagem desde a educação básica. Nesse contexto, o estudo se dedica a compreender a relação entre tecnologia e desigualdades, especialmente na dimensão racial, para pautar políticas públicas.

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Infraestrutura e exposição à tecnologia nas escolas

A partir de dois índices, um de acesso à infraestrutura e outro de exposição à tecnologia, foram quantificadas as diferenças e em que medidas elas podem explicar discrepâncias raciais no aprendizado.

Os resultados mostram que alunos brancos têm maior acesso à tecnologia nas escolas. Estas disparidades são ainda mais significativas se comparadas as redes públicas e privadas, e ainda variam conforme as cinco grandes regiões do país.

A desigualdade no acesso a tecnologia pode chegar a 24 pontos percentuais, se comparado um aluno branco da rede privada da região Sul com um estudante preto da rede pública do Nordeste. De modo geral, dentro da mesma rede e região, concluiu-se que as diferenças raciais são menores. Destaca-se que na rede pública do Nordeste, a mais racialmente desigual, a diferença entre alunos brancos e pretos é de 5 pontos. 

Considerando o índice de exposição à tecnologia, e tomando alunos do 9º ano do Ensino Fundamental das escolas públicas como amostra, a diferença entre brancos e pretos é de 6 pontos. No Nordeste, a diferença é de 3 pontos. Mas, a disparidade entre escolas públicas e privadas na região chega a 25 pontos, considerando alunos brancos.

Mas o estudo também mostra que o desempenho dos estudantes é afetado pela exposição à tecnologia, sendo que a relação entre a exposição e o aprendizado é positiva. Um aumento de 10 pontos na exposição à tecnologia no 5º ano do Ensino Fundamental resulta em uma nota 18,5 pontos maior em matemática. 

No entanto, alunos negros nesta mesma série escolar obtêm, em média, 14,5 pontos a menos em matemática, quando comparados com alunos brancos com o mesmo nível de exposição à tecnologia. 

Ou seja, a exposição à tecnologia não seria por si só um fator determinante para explicar as diferenças de desempenho de diferentes grupos raciais. A redução parece estar mais associada a fatores socioeconômicos e geográficos.

Acesso ao Ensino Superior 

Os resultados do estudo mostraram um aumento no número de matriculados no Ensino Superior para todos os grupos raciais, mas com um aumento mais acentuado entre negros. A pesquisa evidencia que 90% do avanço foi impulsionado pelo aumento da participação dos negros em instiuições privadas.

"Embora seja positivo ver uma maior representatividade racial nesse setor, é crucial considerar a qualidade geral do Ensino Superior privado, que muitas vezes é inferior ao das instituições públicas. Isso levanta preocupações sobre se o aumento na participação de negros tem sido acompanhado pela garantia de uma educação de qualidade", defende o estudo. 

Além disso, resultados também mostraram que a modalidade EaD (Educação à Distância) pode desempenhar um papel importante na redução das desigualdades de participação entre os grupos raciais. Mas, destaca-se que a qualidade da educação e seus retornos no mercado de trabalho deve ser avaliada, para que não reforce as desigualdades já existentes.

As desigualdades raciais permanecem marcantes em praticamente todas as áreas de conhecimento, seja na de Saúde e Serviços; Humanidades e Ciências Sociais; Ciências Naturais e Tecnologia; ou em cursos de Área Básica de Ingresso, aponta o estudo. 

Houve um aumento na representação de negros, mas observa-se uma concentração em cursos relacionados à Saúde e Serviços ou Humanidades e Tecnologia, com menor presença nos de Ciências Naturais e Tecnologias.

Os negros também têm menor participação nos cursos de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática, em português). São apenas 42%, contra 47% nos cursos não-STEM. Esses cursos estão relacionados à melhor remuneração.

Políticas Públicas

Ao fim da apresentação do estudo também foram apresentadas recomendações para políticas públicas, como:

  • fortalecer políticas em nível federal e direcionar recursos financeiros de forma a reduzir disparidades entre regiões mais pobres e mais ricas do Brasil;
  • acompanhamento do acesso e uso da tecnologia na educação básica e seu impacto no desempenho;
  • investimento consistente na infraestrutura das escolas e uma estratégia permanente de estímulo e fortalecimento das transformação digital;
  • garantir a sustentabilidade da expansão do ensino privado e EaD e assegurar que a qualidade dos cursos seja tão boa quanto a dos presenciais;
  • exigir um percentual mínimo de alunos negros em cada curso do Ensino Superior.

Durante o evento de lançamento, a Secretária da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, Kátia Schweickardt, afirmou que o trabalho tem sido de aproximar o MEC de todos os estados e municípios para desenhar com eles as políticas públicas olhando para toda educação básica de modo sistêmico.

"Esse eixo da conectividade tem a ver com acesso a recursos tecnológicos, tem a ver com a conectividade de qualidade para fins pedagógicos em todas as escolas brasileiras, mas tem a ver também com educação digital cidadania digital, letramento digital para professor e estudantes", defendeu. 

Schweickardt afirmou que o MEC tem prezado por políticas que não reforcem a desigualdade. "Ao contrário, todas elas estão transversalizadas por um compromisso do nosso governo com a promoção da equidade, seja olhando para as condições de aprendizagem em termos de níveis socioeconômicos, seja em termos regionais. No Brasil, isso diz muito sobre as questões relacionadas à tecnologia", ressaltou.

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