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Carga tributária menor amplia arrecadação e reduz a desigualdade social

Otávio Dantas, sócio e diretor da BCG

Conectividade é essencial. E durante a pandemia isso ficou mais claro do que nunca. Essa percepção é confirmada por uma pesquisa conduzida pelo Boston Consulting Group (BCG) com consumidores brasileiros em 2020: durante o isolamento social, identificamos um crescimento de 41% no uso de serviços de telecomunicação. Além disso, 20% dos consumidores esperam aumentar gastos com telecom após a pandemia.

Apesar do crescimento e da ampliação das bases de usuários, é importante considerar que ainda existe um grande abismo social separando os digitalmente incluídos e os excluídos. Dados de 2020 do Comitê Gestor da Internet (CGI.br) revelam que 47 milhões de brasileiros ainda não estão na rede. Desses, quase 26 milhões de pessoas estão nas áreas urbanas e pertencem às classes D e E. Já em áreas rurais, o número chega a 12 milhões de indivíduos. Levando em conta o período de pandemia e as medidas de isolamento, a situação gera efeitos perversos, como crianças e adolescentes digitalmente excluídos que não conseguiram participar de aulas online, por exemplo.

Diante desta deprimente realidade e do meu envolvimento cada vez maior com a causa da inclusão digital, me lembrei de uma apresentação que fiz no Painel Telebrasil de 2018, mas cujas reflexões não poderiam ser mais atuais. Vamos aos fatos!

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A solução para ampliar o alcance dos serviços de telecom não é simples, mas uma coisa é certa: passa pela redução dos impostos aplicados às empresas do setor. Por exemplo, como pode ser observado na figura 1, o governo brasileiro tem uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo, com 44% de tributos na receita líquida de serviços móveis, versus 11% na Índia, 9% na China e 5% no Japão. Se a média brasileira já assusta, um olhar por estado assusta ainda mais – em Rondônia, por exemplo, a carga tributária passa dos 70%.

Figura 1: tributos sobre serviços móveis, por país

Isso faz do Estado o “maior acionista” das empresas de telecom, uma vez que 37% do valor gerado pelo setor vai para ele em forma de tributos e impostos, como podemos observar na Figura 2. Essa participação, aliás, vem aumentando ano a ano. Uma parte da arrecadação é constituída por fundos com propósito de investimento especificamente em infraestrutura de telecomunicação, na parte da universalização do acesso e outros aspectos. No entanto, menos de 1% do valor arrecadado tem sido reinvestido no próprio setor.

Figura 2: distribuição assimétrica do valor gerado na indústria de telecom, por stakeholder

A elevada carga tributária está na raiz de um ciclo vicioso nessa área no Brasil. Conforme ilustrada na figura 3, ela compromete a receita líquida da indústria e diminui a rentabilidade das telcos – em queda ano após ano desde 2012. Como consequência, cai também o nível de investimentos em conectividade, uma alavanca das telcos para preservar, ao menos em parte, a rentabilidade. Como o investimento em conectividade é um grande impulsionador do PIB, essa queda gera consequências na esfera governamental: compromete o crescimento do PIB nacional e, por consequência, compromete a arrecadação de impostos o pelo governo. Reagindo a isso, o governo tende a elevar a carga tributária – o catalizador deste ciclo vicioso.

Figura 3: círculo vicioso, no qual a elevação da carga tributária reduz a arrecadação de impostos

Por isso, reforçamos aqui a necessidade de redução da carga tributária na indústria de telecom. É contraintuitivo, mas verificamos ser possível, através dessa ação, não apenas aumentar a arrecadação, mas também dar início a um ciclo virtuoso, positivo também para as telcos e para a sociedade.

Conforme ilustrado na figura 4, primeiramente é essencial que a carga tributária do setor seja reduzida para elevar a rentabilidade. Desta forma, os investimentos em infraestrutura de banda larga crescem, elevando tanto o PIB quanto a arrecadação tributária e proporcionando a possibilidade de redução de impostos e tributos, além da continuidade de um ciclo mais vantajoso para empresas, governo e consumidores.

Figura 4: círculo virtuoso, no qual a redução da carga tributária eleva a arrecadação de impostos

Em uma simulação feita por nós, chegamos à conclusão de que o país arrecadaria até R$ 3,50 para cada R$ 1 revertido em infraestrutura de banda larga. Na nossa avaliação, consideramos o recolhimento do FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), o principal imposto que incide sobre o setor, ao lado do FISTEL, paga por todas as empresas prestadoras de serviços de telecom.  A finalidade do FUST é subsidiar os serviços de telecomunicações para regiões desassistidas, locais onde a exploração comercial desses serviços não é viável ou que não possam ser recuperados com a exploração eficiente do serviço. 

Como uma forma de endereçar o problema, o governo brasileiro vem discutindo uma reforma tributária. A PEC 45/2019 prevê a unificação, com alíquota única, de cinco impostos que incidem sobre o consumo: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Essa simplificação desburocratizaria os processos para as empresas, permitiria um ambiente de negócios mais positivo e alavancaria mais confiança para os investidores. O movimento permitiria o crescimento do setor e, sobretudo, avanços para aumentar a inclusão digital e diminuir as lacunas sociais.

Esse já seria um grande passo, mas poderíamos ir além – vários governos já perceberam a relevância da conectividade. Há algumas semanas, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou um plano audacioso US$ 2,3 trilhões de investimento em infraestrutura visando a recuperação da economia americana. Desse montante, US$ 100 bilhões serão destinados à expansão do acesso à internet banda larga naquele país. Segundo Biden, conectividade é a “nova eletricidade”, e nós não poderíamos concordar mais com isso, sobretudo no momento que estamos atravessando, e que desenhará o futuro.

*- Sobre o Autor: Otávio Dantas é diretor e sócio e membro das práticas de Operações e Tecnologia, Mídia & Telecomunicações no The Boston Consulting Group. Ele também lidera a prática de Technology Advantage do BCG no Brasil. As opiniões expressas nesse artigo não necessariamente refletem o ponto de vista de TELETIME.

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