Até o final de junho a área técnica da Anatel encaminha ao conselho diretor as propostas do Manual de Operação (MOP) e do Documento de Valor de Referência (DVR), dois documentos que fazem parte do novo Regulamento Geral de Qualidade (RQUAL) e que balizarão uma das principais novidades da regulação de qualidade de serviços, que é o selo de qualidade da Anatel. E, ao que tudo indica, as novas regras deverão trazer desafios significativos para as operadoras de banda larga fixa com muitos clientes em tecnologias mais limitadas, como o ADSL, acesso fixo por 4G ou satélites.
Isso porque um dos elementos que vão compor o cálculo da nota para a qual será atribuído o selo de qualidade é a velocidade real medida do serviço. A área técnica da Anatel trabalha com um patamar mínimo de 10 Mbps para operadoras com selo A, que é o melhor grau de qualidade concedido a uma operadora.
A velocidade é apenas um de seis indicadores que serão considerados. Também entram no cálculo o resultado as notas obtidas na pesquisa de satisfação e também os indicadores de reclamação junto à agência. "Estamos agora na finalização do debate sobre este patamar mínimo, se será de fato 10 Mbps, e também definindo os pesos dos diferentes itens que vão compor o cálculo", diz Gustavo Santana Borges, superintendente de controle de obrigações da Anatel e coordenador do grupo de trabalho responsável pela elaboração do Manual Operacional do RQUAL.
A medição da velocidade, explica Borges, será feito por meio de crowdsourcing, com o uso de diferentes fontes: aplicativos da Anatel, o aplicativo Brasil Banda Larga e os aplicativos das próprias operadoras. O patamar de 10 Mbps, que ainda pode mudar, foi estabelecido a partir da premissa de que é o mínimo necessário para o consumo de vídeo. O número em si não está fechado na agência, já que ainda passará pelo Conselho Diretor. Há estudos e avaliações sobre o patamar justo para medir, tendo argumentos para que seja menor ou maior.
Dificuldades
As operadoras, contudo, não estão conformadas com a solução dada pela Anatel, por algumas razões. A primeira delas é que em redes legadas, como ADSL e acesso fixo por 4G, as velocidades de 10 Mbps não são a realidade para boa parte da base. Com isso, essas operadoras teriam muito mais dificuldades de atingir o selo A. Nesse caso, a proposta das teles, que não deve prevalecer, é que a velocidade medida como adequada seja sempre relativa ao plano contratado, e não um patamar igual para todo o mercado. O outro problema colocado pelas operadoras é sobre a metodologia de medição: o uso de crowdsourcing faz com que a medição inclua a rede WiFi dos usuários, o que pode afetar o desempenho geral da rede e a percepção dos usuários.
"A solução de medir por multicoletores (sondas de teste) foi rechaçada pelas próprias empresas, porque os custos seriam elevados e poderia excluir muitas empresas", diz Gustavo Borges. Para ele, a solução de medição por crowdsourcing é a mais adequada, e o fato de haver uma conexão de WiFi no meio do caminho não é problema porque a maior parte das redes WiFi é criada a partir dos modems das operadoras. "Hoje o WiFi faz praticamente parte do serviço de banda larga fixa de qualquer empresa, e esta variável vai afetar todos os operadores de maneira equivalente". Segundo Borges, a agência também terá instrumentos para avaliar se a medição foi afetada por outros fatores, como distância excessiva entre a fonte do sinal de WiFi e o dispositivo conectado. O custo da medição será das próprias operadoras.
Vale lembrar que apenas as operadoras com Poder de Mercado Significativo receberão obrigatoriamente o selo de qualidade. As prestadoras de pequeno porte (PPPs) poderão aderir se quiserem, mas a ideia da Anatel é que elas se sintam atraídas pela ideia de ter um selo de recomendação da agência, já que a maior parte tem redes de fibra e bons índices de satisfação do consumidor nas pesquisas feitas pela agência.
A Anatel também argumenta que o novo RQUAL permitirá aos usuários a solicitação de uma medição de qualidade individual, cujo resultado pode ser determinante para que ele possa pedir o rompimento do contrato mesmo que fidelizado, em caso de desempenho insatisfatório. Mas a metodologia de medição individual ainda está sendo formatada.
Uma vez aprovado pelo conselho, o que deve levar pelo menos mais 3 meses, a coleta de dados das operadoras para a elaboração do selo de qualidade começa no início de 2022 e os primeiros resultados serão divulgados a partir de 2023. Um dos motivos que levaram a Anatel a apostar nesse modelo de acompanhamento dos indicadores de qualidade foi o acórdão do TCU, que determinou métodos que de fato reflitam a experiência dos usuários.