Um recurso administrativo a pedido da prefeitura de Brumado (BA) levantou um debate na reunião do conselho diretor da Anatel nesta quinta-feira, 18. O município havia sido multado pela Superintendência de Fiscalização da agência em 2018 por uso não autorizado de radiofrequência – no caso, utilizando repetidores para levar o sinal de celular até uma mina. A matéria, trazida pelo conselheiro interino Carlos Baigorri, suscitou nele uma "irresignação" por dois motivos: a aplicação de multa por um uso supostamente não danoso e pela comunicação ao Ministério Público Federal de uma ação que já havia sido informada anteriormente. Mas não houve esse consenso dentre os demais membros, e a decisão final foi a de negar o recurso.
No voto, Baigorri diz que a situação é de "perde-perde", com um "equilíbrio perverso" por conta de "completa ineficiência" do poder público, uma vez que a operadora deixaria de ter um fluxo de receita, o cidadão não teria o sinal de celular ampliado, a agência teria o custo administrativo de tratar do processo de aplicação de multa de cerca de R$ 2 mil (o voto propôs reduzir para cerca de R$ 400). "Nos dez anos que tenho na Anatel, nunca lidei com essa problemática", disse o conselheiro ao apresentar o processo.
Para Carlos Baigorri, o uso dos equipamentos adquiridos pela prefeitura de Brumado era de fato clandestino, mas que já houve entendimento do MPF de caso semelhante que não havia conduta criminosa. Além disso, a comunicação institucional da agência com o MPF seria falha, de modo que a notificação poderia ser evitada. "Não há de se falar em prevaricação ao Ministério Público porque já foi comunicado", afirma. A morosidade do trâmite desses processos administrativos também seria um problema. "Olhando dados históricos de instauração de Pados, eram quase 11,5 mil processos", diz.
O conselheiro disse entender que o caso precisa ser avaliado também pelo prisma da operadora, que não tinha controle da rede em Brumado. "É preciso dar segurança ao ente privado, mas tem a demanda legítima da comunidade." Para ele, o voto do ex-conselheiro Igor de Freitas em caso semelhante, em 2017, indicava mecanismos para tratar do tema.
Fora da alçada
O conselheiro Emmanoel Campelo, relator do processo, discordou e se posicionou: não cabe à Anatel julgar a intenção da prefeitura, tampouco o caráter da irregularidade ser crime ou não – o que caberia ao Ministério Público. "Havendo indícios de crime, a Anatel deve indicar", defende. "Cabe ao MPF considerar se houve crime ou dolo; foge de nossa alçada".
Especialmente porque o item em apreciação não se confundia com o próximo da pauta, de relatoria do conselheiro Moisés Moreira, e que tratava de reforçador de sinal. Baigorri apresentou o voto para os dois na mesma ocasião, alegando haver similaridades.
"Vale resgatar que reforçadores são de baixa potência para uso indoor, sendo translação de frequências. Os repetidores podem operar em potências superiores", explica Campelo. Ele destacou também que a infração foi cometida por um ente federativo – a prefeitura de Brumado – que justamente teria o dever de zelar pelo cumprimento da legislação. E que a operadora em questão comunicou ter ocorrido interferências, ainda que a fiscalização da agência não tenha encontrado.
Votos
Com a mistura dos itens na pauta, os conselheiros acabaram votando também ao mesmo tempo. Moisés Moreira afirmou ser "realmente doloroso denunciar um município pequeno", mas ressaltou que as normas regulamentares devem ser seguidas. Assim, manteve o voto de não reconhecer o valor mínimo previsto no Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas (RASA) por ser equipamento de uso externo para a mineradora.
Já Vicente Aquino acompanhou parcialmente com o voto de Baigorri, ao aceitar a redução da multa. Mas no tocante à notificação ao Ministério Público Federal, seguiu o voto de Campelo. "No momento, ainda não construímos uma posição solidificada no ponto, então prefiro ficar com o que ainda está sólido."
O presidente do conselho e da Anatel, Leonardo Euler, seguiu o voto de Aquino. Ele lembra que, ainda como conselheiro, viu arbitramento de multas com metodologias não compatíveis às prestadoras de pequeno porte (conceito aprovado somente em 2018), mas que precisou se resignar com o regramento da época. "No caso concreto, a reflexão jurídica na forma de relacionamento com o MPF e como enquadrar a questão vale. Porém, como diz o conselheiro Moisés, com dor no coração e pensando no que o próprio Estado nos coloca e impõe, acompanho Emmanoel e Moisés nos respectivos itens", declarou. Assim, foi negado provimento ao recurso.